"The Discomfort of Evening", traduzido para inglês por Michele Hutchison, foi hoje anunciado como vencedor do Booker Internacional, pela organização do prémio literário britânico, o que fez de Marieke Lucas Rijneveld, nascida há 29 anos em Nieuwendijk, nos Países Baixos, a mais jovem autora distinguida com o prémio.
A edição portuguesa de "The Discomfort of Evening", segundo a Dom Quixote, do grupo Leya, será traduzido por Patrícia Couto e ainda não tem definido o título que, numa versão livre, poderá ser "O Desconforto da Noite", mas que em Espanha foi publicado como "A Inquietação da Noite".
Ao receber o prémio, hoje, em Londres, Rijneveld, que prefere o tom impessoal ao uso definido de masculinos e femininos, disse ter mantido, durante a conceção da obra, sobre a sua mesa de trabalho, a frase "Sê implacável", como orientação para a escrita.
“Agora, quando o mundo se encontra virado de cabeça para baixo e mostra o seu lado mais negro, continuo a lembrar-me dessas palavras: escreve, lê, ganha, perde, ama, mas sê implacável no que fizeres”, afirmou Marieke Lucas Rijneveld, na sessão em que foi anunciado o vencedor.
O prémio Booker Internacional distingue todos os anos uma obra uma obra de ficção, traduzida para inglês, que tenha sido publicada no Reino Unido e na Irlanda, através do seu autor e do seu tradutor. No valor de 50 mil libras (cerca de 55 mil euros), o prémio é dividido por ambos.
"The Discomfort of Evening" foi escolhido entre seis finalistas, anunciados no passado dia 02 de abril, reunindo títulos traduzidos de cinco línguas - espanhol, alemão, neerlandês, farsi e japonês - de autores de seis países: o alemão Daniel Kehlmann, a iraniana Shokoofeh Azar, a argentina Gabriela Cabezón Câmara, a mexicana Fernanda Melchor e a japonesa Yoko Ogawa.
De acordo com o júri, presidido pelo escritor e crítico literário Ted Hodgkinson, numa lista "excecional" destes seis finalistas, a escolha foi "uma tarefa imensa", mas a opção pelo romance "visceral e virtuosístico" de Rijneveld foi "unânime", garantiu.
Oriunda de uma família de agricultores do norte dos Países Baixos, a escritora considerou-se honrada com a conquista do prémio, e tão orgulhosa, como "uma vaca com sete úberes”.
“A agricultura mantém-me com os pés no chão", afirmou ao jornal The Guardian, no início deste ano, depois da publicação do livro no Reino Unido. "As vacas são as minhas melhores amigas”.
Numa entrevista à agência Efe, em junho, quando o romance surgiu em Espanha, com o título "La Inquietud de la Noche", Rijneveld garantiu que gosta de "limpar os estábulos", onde trabalha a tempo parcial.
"The Discomfort of Evening" tem por ponto de partida a morte de um irmão mais velho da escritora, na infância, e demorou cerca de seis anos a ser concluído. "A morte está em todas as páginas da história", disse a escritora à Efe.
Jas, uma miúda entre a infância e a adolescência, é a protagonista da obra. Perde o irmão Matthies num acidente, num lago, o que conduz à devastação da sua família e ao progressivo afastamento dos seus elementos: os pais, cristãos devotos, e outros dois irmãos, Obbe e Hanna, também na infância.
Dos factos familiares, Marieke disse lembrar-se mal. Tinha 3 anos quando o irmão de 12 morreu. Mantém a impressão de que "a família corria o risco de se afastar em vez de se unir mais", como contou à Efe. "Então estava na idade em que se cria um vínculo afetivo, o que influenciou o meu desenvolvimento".
Para a escritora, na elaboração da obra teve sempre presente a necessidade de "enfrentar a luz e a obscuridade".
Pode escrever-se "algo duro e contrapor-lhe situações divertidas ou tragicómicas, para que se possa assumir", não tanto perante o leitor, como perante si mesma, afirmou à agência espanhola de notícias.
Embora tenha admitido a proximidade de Jas a si mesma e à história do livro, o mesmo não acontece com os seus pais. "São religiosos, mas não tanto como no livro. Exagerei muito", garantiu.
Quanto à inclusão de Lucas na sua "assinatura" literária, Marieke Rijneveld explicou tratar-se do nome de um amigo imaginário que teve na infância, uma altura em que se sentiu mais como rapaz do que como rapariga, dilema sobre a identidade que mantém.
"Por agora, a resposta é algo intermédio, daí o nome Marieke Lucas. Ainda não sei onde terminará a minha demanda", garantiu à Efe.
A escritora neerlandesa sucede à autora de Omã Jokha Alharthi, distinguida com o Booker International pelo romance "Corpos Celestiais", publicado em Portugal pela Relógio d'Água.
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