Na manhã de 21 de dezembro de 1992, a tempestade que se abateu sobre a cidade viria a revelar-se fatal para 56 dos mais de 300 passageiros que seguiam no voo MP 495 da companhia holandesa Martinair. O acidente deu-se quando a aeronave (um McDonnell Douglas DC-10) estava quase a tocar a pista, provocando também 104 feridos.

Embora hoje ainda acredite que o que aconteceu resultou de “um azar" e de não ver outra razão para o sucedido, o então subdiretor do aeroporto não duvida de que, apesar do infortúnio, também houve alguns fatores de sorte, impedindo que o número de mortos fosse superior.

"Podia ter sido muito pior, o facto de o avião se ter partido foi uma vantagem", disse à Lusa Francisco Severino, considerando que o facto de já ser de dia e de o acidente ter acontecido à hora de mudança de turno dos bombeiros também ajudou a que a catástrofe não fosse maior.

Segundo o ex-subdiretor do aeroporto, três minutos antes tinha aterrado em Faro outro avião da Martinair.

Quando vinha já na descida final, porém, o voo MP 495 apanhou uma rajada de vento e uma das asas bateu no chão. O piloto perdeu o controlo do avião, que acabou por se partir em dois.

Ramiro Santos, que na altura trabalhava para a TSF e para a agência Lusa, foi o primeiro jornalista a chegar ao local e o único, durante cerca de uma hora, a fazer a cobertura do acidente, depois de ter conseguido entrar na pista à boleia do assessor do governador civil de Faro na altura, Joaquim Cabrita Neto, recentemente falecido.

"Vi pessoas queimadas e a fugirem da pista pelos seus próprios pés, enquanto os bombeiros tentavam retirar os corpos", contou à Lusa, dizendo que ia atualizando a contagem das vítimas à medida que iam sendo retiradas dos escombros e colocadas em sacos negros, estendidos na pista.

Apesar de naquele dia ter olhado para o acidente com um olhar frio e profissional, pouco depois aquelas imagens começaram a vir-lhe à memória, sobretudo uma, que não esquece até hoje: os corpos carbonizados de uma mãe e um filho abraçados.

"Aquilo marcou-me profundamente", relatou, elogiando a mobilização dos bombeiros e dos serviços de saúde, que fizeram com que a operação de socorro tivesse funcionado "muito bem", sobretudo numa catástrofe imprevisível e daquela dimensão.

Já Francisco Severino diz não ter dúvidas de que o inquérito "foi extremamente bem feito", sublinhando que não houve nada "que prove que houve culpa de A, B ou C" e lembrando que a decisão final em aterrar o avião é sempre do comandante.

Na altura, chegou a correr no Tribunal de Faro um processo-crime para apurar eventuais responsabilidades no acidente, mas acabou por ser arquivado, após ter sido reconhecida a ausência de culpa do comandante do voo da transportadora holandesa, hoje subsidiária da Air France-KLM.

Mais tarde, em 2008, correu um processo no Tribunal Administrativo de Lisboa que opunha a Martinair e respetivas seguradoras à Aeroportos de Portugal (ANA) e seguradoras, mas o julgamento foi suspenso, a pedido das partes, lembrou à Lusa o advogado da transportadora holandesa na altura.

Segundo Manuel de Magalhães e Silva, os procedimentos judiciais em Portugal terminaram quando "se suspendeu a instância e se determinou que os termos da transação ficavam confidenciais", um procedimento "inteiramente normal" quando estão envolvidos valores muito elevados.