Numa carta dirigida aos trabalhadores, a que a Lusa teve acesso, Paulo Neto Leite começa por dizer que a empresa atravessa “uma fase nunca vivida, nunca sequer imaginada”, admitindo que viveu “dos mais intensos e perturbadores momentos, nestes últimos dias”.
“Entendo bem o que é ter salários em atraso, e entendi nas expressões de todos a apreensão por não saber o que esperar do futuro. Imaginarmos de repente um futuro incerto, quando sempre tivemos a certeza de um futuro que decorria do nosso trabalho, da nossa dedicação, do nosso empenho e da nossa garra, foi muito duro para todos nós”, declarou o presidente executivo (CEO) da empresa de ‘handling’ (assistência nos aeroportos).
Agora “é altura de nos enchermos de esperança para voltarmos a ver o nome da nossa empresa nas notícias pelas melhores razões. Sabemos o quão difíceis foram estes dias, bem como os enormes transtornos causados a todo e qualquer um dos nossos trabalhadores e respetivas famílias. E é por isso, acreditem, que não poupei esforços nem descansei enquanto não estivesse garantido este pagamento”, lê-se na comunicação enviada hoje à noite aos cerca de 2.400 trabalhadores da Groundforce.
O acordo entre Groundforce com a TAP foi hoje fechado com três votos a favor, a abstenção do presidente do Conselho de Administração, Alfredo Casimiro, e um voto contra, disse à Lusa fonte ligada ao processo.
O Conselho de Administração da Groundforce deu hoje ‘luz verde’ ao acordo com a TAP, que prevê a compra dos equipamentos da empresa de ‘handling’ e desbloqueia assim o pagamento de salários e despesas no curto prazo.
Segundo adiantou à Lusa a mesma fonte, os dois administradores da Groundforce nomeados pela TAP, acionista minoritário (49,9%), aprovaram o acordo, a que se juntou o presidente executivo da empresa de ‘handling’, Paulo Neto Leite, que já tinha manifestado na véspera a sua intenção de validar o acordo proposto pela TAP.
Por seu lado, o presidente da Pasogal, acionista maioritário da Groundforce (50,1%), absteve-se e o outro administrador nomeado pela Pasogal, Gonçalo Carvalho, votou contra o acordo para desbloquear provisoriamente o impasse na empresa e permitir pagar os salários aos 2.400 trabalhadores, que desde fevereiro ainda só receberam 500 euros, bem como os impostos que têm de ser pagos nos próximos dias.
Contactada pela Lusa, fonte oficial da Pasogal disse que “a votação é do foro íntimo da empresa e não deve ser discutida em praça pública”.
O acordo prevê que a TAP compre os equipamentos da Groundforce por cerca de sete milhões de euros, uma solução de curto prazo, que permite resolver os problemas mais urgentes da empresa, enquanto se procura uma solução para as restantes verbas de que necessita, para fazer face aos prejuízos causados pela pandemia.
“A noção de que tínhamos famílias inteiras aqui a depender dos salários, aumentava a necessidade de termos uma rápida resolução do tema dos salários, mas acima de tudo, dava a energia para nos continuarmos a concentrar em garantir o futuro da empresa”, disse Paulo Neto Leite.
O presidente executivo da Groundforce informa os trabalhadores que na reunião do Conselho de Administração da empresa, “foi aprovada uma solução que permitiu dotar a NOSSA empresa dos fundos necessários para que se consiga pagar o remanescente dos salários do mês de fevereiro, os salários do mês de março, bem como as obrigações fiscais e legais para os próximos tempos”.
“Decorrente dessa decisão, foi mandado proceder ao pagamento do remanescente dos salários do mês de fevereiro. Infelizmente, a hora tardia não permitiu que todos fossem depositados nas contas no dia de hoje”, acrescentou.
Paulo Neto Leite refere que “tendo sido o mais importante regularizar os salários em falta, é certo que esta solução também permite que a gestão da empresa se foque agora na conclusão do processo que visa dotar a empresa dos fundos necessários para o futuro”.
“A crise que atravessamos não permite que baixemos os braços. Juntos, continuaremos a trabalhar para que esta fase seja ultrapassada no mais breve espaço de tempo. Ontem como hoje, reafirmo que continuarei a dar o meu melhor para conduzir esta empresa no caminho que nos trará de volta os bons resultados. Em conjunto com a equipa que ao meu lado gere a empresa e dá o seu máximo dia após dia, acreditamos que iremos conseguir chegar a bom porto”, disse na carta aos trabalhadores, em que, como é habitual, termina deixando o número de telemóvel para “os esclarecimentos necessários”.
Após o final da reunião do Conselho de Administração da Groundforce, a TAP informou que já procedeu “às transferências necessárias ao pagamento dos salários” na SpDH/Groundforce.
A empresa garantiu ainda que “processará no dia próprio os pagamentos devidos aos trabalhadores da SpDH e relativos aos salários de março de 2021″.
Alfredo Casimiro, ouvido na quinta-feira pela comissão parlamentar de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, disse que esta solução da venda de ativos à TAP era um “balão de oxigénio” de dois meses, mas, se não forem disponibilizados mais fundos, a empresa “vai definitivamente para a falência”.
Em cima da mesa continua a estar um aumento de capital de 6,97 milhões de euros, que Alfredo Casimiro (acionista maioritário da Groundforce com 50,1% das ações) disse ter “capacidade financeira” para aceitar, mas antes tem de perceber qual será o futuro da TAP na empresa de ‘handling’, uma vez que o contrato de prestação de serviços entre as duas empresas termina em 2022.
“Capital significa capitalista e eu sou um capitalista, assumo-me como um capitalista, e só farei esse investimento se tiver condições para recuperar esse investimento num certo e determinado número de anos”, sublinhou o administrador da Pasogal, acrescentando prever serem precisos 10 anos para recuperar o investimento no aumento de capital, que acredita que seja entre sete e 10 milhões de euros.
Desta forma, para ir ao aumento de capital, Alfredo Casimiro pretende obter por parte da TAP garantias de que o contrato de prestação de serviços será renovado por cinco anos e, posteriormente, por mais cinco.
Quanto ao empréstimo com aval do Estado de 30 milhões de euros das linhas covid, a solução que a Pasogal prefere, tem de ser encontrada uma solução para as garantias pedidas pelo Governo (as ações de Casimiro na Groundforce, que já estão empenhadas).
A Groundforce é detida em 50,1% pela Pasogal e em 49,9% pelo grupo TAP, que, em 2020, passou a ser detido em 72,5% pelo Estado português e que é acionista minoritário e principal cliente da empresa que presta assistência nos aeroportos de Lisboa, Porto, Faro, Funchal e Porto Santo.
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