“O capítulo nuclear [do acordo] podemos considerar fechado – em teoria naturalmente. Diz-se na diplomacia que nada está acordado até tudo estar acordado”, disse em entrevista à Lusa o diretor da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), Rafael Mariano Grossi.
“É uma situação que não esperávamos, uma consequência claramente das sanções estabelecidas pelos Estados Unidos às empresas russas, a Federação Russa em geral. Mas temos um panorama positivo sobre aspetos nucleares”, adiantou o responsável da Agência da ONU.
As autoridades iranianas estão envolvidas há vários meses em conversações com as principais potências mundiais em Viena, com o objetivo de restaurar o Plano de Ação Global Conjunto (JCPOA), como é conhecido o acordo nuclear de 2015).
Este pacto, entre o Irão e os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China) e a Alemanha, permitia o levantamento de sanções internacionais contra Teerão em troca de rigorosos limites ao seu programa nuclear, com vista a impedir o país de se dotar da bomba atómica.
Num contexto de forte subida do preço do petróleo, após a invasão da Ucrânia pela Rússia a 24 de fevereiro, a finalização do acordo teria como consequência de curto prazo a possibilidade de o Irão vender petróleo no mercado, aumentando significativamente a oferta.
Os Estados Unidos, que participam nas negociações de forma indireta, abandonaram unilateralmente o acordo durante a administração de Donald Trump, em 2018. Um ano depois da decisão de Washington, Teerão começou a desrespeitar os limites impostos ao seu programa nuclear e tem enriquecido urânio a níveis cada vez mais próximos do necessário para criar uma arma nuclear.
Depois de estarem praticamente fechados os termos para a retoma do acordo, disse Grossi, as exigências russas de última hora foram “uma surpresa um pouco inesperada”, mas estão a ser “consideradas alternativas”, e a possibilidade de soluções “deverá ser confirmada nos próximos dias”.
“Esta é uma conversa bilateral entre americanos e russos (…), sei que há vontade de avançar. Seria mau não chegar a um acordo trabalhado durante tantos meses por uma questão colateral”, adiantou o responsável da AIEA.
Há 10 dias, surgiram declarações otimistas sobre a iminência de um acordo para salvar o pacto de 2015 entre o Irão e as grandes potências sobre o programa nuclear iraniano.
Mas a 5 de março, a Rússia, atingida por sanções ocidentais após a invasão da Ucrânia, pediu aos norte-americanos garantias de que essas medidas de retaliação não afetariam a sua cooperação económica com o Irão.
O chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken, declarou que as exigências russas “estavam fora de questão”, o que fez travar as negociações em Viena destinadas a salvar o acordo de 2015.
Para Grossi, seria “muito difícil” um falhanço do acordo, dado que a dimensão do programa nuclear iraniano “exige uma presença muito forte dos inspetores da Agência”.
“Sem essa presença que o JCPOA facilitaria, seria muito difícil para mim confirmar a natureza puramente pacífica do programa nuclear” iraniano, disse à Lusa.
O ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano, Hossein Amir-Abdollahian, é esperado hoje em Moscovo para continuar as negociações sobre o acordo nuclear, segundo o Governo iraniano.
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