“Foi a 25 de novembro que a lei mudou. Quase 40 anos depois, enaltecendo essa reforma que para todos nós tanto representou, não posso deixar de reafirmar os valores da igualdade e de reconhecer que, embora muito se tenha conquistado, há ainda um longo caminho a percorrer, na lei e nas práticas quotidianas”, afirmou Francisca Van Dunem.
A ministra da Justiça falava na conferência “A Reforma do Código Civil e a Igualdade de Género 1977-2017″, promovida pela Associação Portuguesa de Mulheres Juristas (APMJ) para assinalar o 40.º aniversário da reforma do Código Civil de 1977, que colocou a mulher em pé de igualdade com o homem no que diz respeito ao direito da família.
No discurso, Francisca Van Dunem recorda as alterações introduzidas no Código Civil na reforma de 1977 e a realidade vivida antes desta mudança.
“Por vezes, a compreensão da dimensão de realizações operadas num dado momento histórico só se alcança através da escatologia dos momentos que a precederam” e “é assim em relação às alterações introduzidas no Código Civil na reforma de 1977”, sublinhou.
De facto, adiantou, “a profunda alteração dos contextos histórico e social tornam hoje de difícil apreensão a racionalidade da amputação de direitos civis em razão do género”.
“Mas a verdade é que em 1974 existia ainda um conjunto de interdições a que a rutura revolucionária operada em Abril pôs fim, obrigando à construção de um padrão normativo envolvendo a combinação igualitária de todas as representações da realidade social, independentemente do género”, recorda Francisca Van Dunem.
Nessa altura, a população portuguesa era já maioritariamente feminina (4,624.7 mulheres para 4,129.7 homens) e as mulheres empregadas correspondiam a 39,7% do total da população ativa, observou.
“O Código Civil de 1966 - a dois anos da revolta libertária de Maio de 1968 - traduzindo, embora, uma evolução relativamente ao Código de Seabra, espelhava um ambiente político e social dominado por elites irredutivelmente conservadoras”, contou.
Mantinha o instituto do poder marital, reconhecendo ao marido a qualidade de chefe de família e atribuindo-lhe poder para a representar e decidir em todos os atos da vida conjugal comum, administrar os bens do casal, sem ressalva de qualquer obrigação de prestação de contas ou de mero reporte, recordou, adiantando que as liberdades da mulher continuavam a ser limitadas e excecionais.
Com a Reforma de 1977, “opera-se uma alteração radical ao enquadramento jurídico do matrimónio, sendo eliminados da ordem jurídica todos os condicionamentos à capacidade civil da mulher”. “Desenraizou-se a desigualdade, intervindo-se estrategicamente onde esta começava, no seio da própria família”, salientou a ministra.
Com esta reforma, “a orientação da vida familiar passou a ser definida por ambos os cônjuges, tal como a gestão do património comum”.
“Foi o fim legal do poder marital, da prevalência do poder decisório do homem, do estatuto subordinado da mulher. Foi o fim de uma era e o início de um novo caminho orientado para os direitos humanos, sem prevalências, prerrogativas ou domínios fundados no género”, destacou Francisca Van Dunem.
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