Questionado durante uma entrevista à TVI sobre a diminuição de meios disponíveis para o combate aos incêndios, desde logo meios aéreos, o primeiro-ministro respondeu: "Houve uma subestimação dos riscos da primeira quinzena de outubro e que, aliás, se mantêm até este momento".

"E houve seguramente carência de meios. Mas, ouvindo as populações, ouvindo os responsáveis pelos bombeiros, ouvindo os autarcas em cada um destes concelhos, também todos temos noção da excecionalidade do que aconteceu no dia 15 de outubro e, em particular, na noite de 15 para 16 de outubro", acrescentou.

António Costa falava em entrevista à TVI, a partir do Quartel dos Bombeiros Voluntários de Pampilhosa da Serra, no distrito de Coimbra, conduzida pelo jornalista Pedro Pinto.

O primeiro-ministro mencionou que houve avisos por parte do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) e da Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANPC).

"Mas, obviamente, isso é claro, houve uma subestimação do impacto do furação Ofélia sobre o conjunto do território do continente", reiterou.

Segundo António Costa, os riscos em relação aos Açores foram ouvidos por todos, enquanto relativamente ao território continental "houve claramente uma subestimação, isso é indiscutível".

Contudo, o chefe do Governo salientou os fenómenos "de força dos ventos absolutamente devastadores" e referiu que "os meios aéreos que havia, a generalidade deles, não puderam operar, tal era a força dos ventos".

"Como muitos presidentes de câmara têm dito, todos os meios que existissem teriam sido manifestamente insuficientes", acrescentou.

Interrogado se, apesar das condições meteorológicas, numa primeira fase os meios aéreos não teriam feito a diferença no combate aos fogos, António Costa concordou que sim.

"Provavelmente, teriam. Nalguns casos, poderiam ter tido esse efeito", afirmou.

No final da entrevista, questionado se pode assegurar que não haverá uma nova tragédia, o primeiro-ministro disse ser preciso garantir que se vai fazer tudo para que nada se repita.

"É preciso garantir que vamos fazer tudo para que nada se repita. E, a melhor forma de o cumprir, é assegurar o compromisso de que nada fique como antes. Agora, ninguém pode, responsavelmente, desvalorizar o risco que existe e é importante que os cidadãos tenham consciência do risco que existe", salientou.

De acordo com o primeiro-ministro, Portugal tem problemas estruturais de despovoamento, desordenamento da floresta, agravados com as alterações climáticas, e também preciso de mudar o sistema de prevenção e combate aos incêndios.

"Nós temos de conseguir fazer aquilo que leva tempo a produzir efeitos, tomando também as medidas imediatas que reforcem desde já a segurança. O que nós estamos neste momento a desenhar, com a unidade de missão que criámos, é áreas prioritárias onde para o ano nós já temos de ter o novo sistema a funcionar de forma a aumentar a resistência e a diminuir o risco de novas tragédias como esta", acrescentou.

Na entrevista à TVI, o primeiro-ministro disse ainda que nunca pensou demitir-se por causa dos incêndios e considerou que "as pessoas estão obviamente revoltadas relativamente a tudo o que aconteceu, o que é legítimo, o que é normal".

"Mas, sobretudo, tenho sentido em todas as populações muita determinação em fazer face a esta situação e resolvê-la para melhor", afirmou.

Seria "enorme perda para o país" se relação Governo/PR fosse prejudicada

O primeiro-ministro sublinhou que o Governo está totalmente empenhado em manter uma boa cooperação institucional com o Presidente da República e considerou que seria "uma enorme perda para o país" se essa relação fosse prejudicada.

Durante a entrevista à TVI, António Costa foi questionado repetidamente sobre a comunicação ao país do Presidente da República na sequência dos incêndios deste mês, mas escusou-se a responder se sentiu deslealdade, traição ou choque face a esse discurso.

"Um dos bons contributos que o primeiro-ministro deve dar para um bom relacionamento institucional do Presidente da República é não comentar a atividade do Presidente da República", declarou, perante uma dessas perguntas.

António Costa alegou, em seguida, que "aos cidadãos o que interessa é que o primeiro-ministro tenha com o Presidente da República uma relação franca, leal, de cooperação institucional, que tem sido muito saudável para o país, e que seria uma enorme perda para o país que fosse prejudicada".

"O país já tem um excesso de problemas para acrescentar os problemas institucionais ao que já existe. Já chega o que há", reforçou, mais à frente.

Interrogado sobre um eventual clima de crispação entre o executivo e o chefe de Estado, António Costa rejeitou qualquer contributo seu nesse sentido: "Da minha parte, não há crispação nenhuma".

O primeiro-ministro, que falava a partir do Quartel dos Bombeiros Voluntários de Pampilhosa da Serra, no distrito de Coimbra, afirmou que mantém a mesma linha de cooperação institucional que adotou desde que o Governo tomou posse, na altura, com Cavaco Silva como Presidente.

"Com o anterior Presidente da República, as coisas até começaram de uma forma muito difícil - como é sabido, o professor Cavaco resistiu bastante a empossar este Governo. Mas, a partir do momento em que o Governo entrou em funções, tivemos uma relação institucional de excelência. O Presidente Cavaco Silva até presidiu ao último Conselho de Ministros que teve lugar durante a sua presidência e mantivemos uma relação impecável", relatou.

António Costa defendeu que aquilo que lhe cumpre fazer, e que diz ter feito até agora, "é ter uma relação institucional de grande lealdade, grande cooperação com o Presidente da República", como com os demais órgãos de soberania.

No seu entender, isso "tem sido muito positivo para o país", que "tem apreciado muito a relação de excelente cooperação institucional que tem existido".

Questionado se o seu relacionamento com Marcelo Rebelo de Sousa é o mesmo do que no início do mandato, o primeiro-ministro considerou que até é "seguramente melhor, porque ao fim de dois anos de trabalho em conjunto, obviamente, as pessoas vão estreitando as relações".

Em nome do Governo, António Costa acrescentou: "Da nossa parte, estamos totalmente empenhados de manter esse nível de cooperação e não me passa pela cabeça que, da parte do atual Presidente da República, não exista essa ideia".

O primeiro-ministro fugiu à pergunta sobre se se sentiu traído com a comunicação do chefe de Estado ao país, declarando que "não faz análise política" e que as suas conversas com o Presidente "não são para ser tornadas públicas, nem agora, nem em futuro livro de memórias".

Interrogado se houve deslealdade de uma das partes, António Costa argumentou que o melhor contributo que tem a dar "é não entrar nesse tipo de comentário, nesse tipo de avaliação".

"Com o atual Presidente da República, como com o futuro, com quem for, eu terei sempre essa relação de lealdade", reiterou.

António Costa não revelou se deu a conhecer a Marcelo Rebelo de Sousa o teor do discurso que ele próprio fez ao país após os incêndios que deflagraram em 15 de outubro no centro e norte do país e provocaram a morte a 45 pessoas.

"Como digo, as conversas entre o Presidente da República e o primeiro-ministro, para poderem ser francas e terem a abertura que devem ter, são conversas que devem ficar entre nós", reafirmou, referindo: Não me recordo de agora ter havido uma única fuga".

O primeiro-ministro recusou, igualmente, esclarecer se teria mantido em funções a anterior ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, se o chefe de Estado não tivesse feito aquele discurso ao país.

António Costa falava em entrevista à TVI, a partir do Quartel dos Bombeiros Voluntários de Pampilhosa da Serra, no distrito de Coimbra, conduzida pelo jornalista Pedro Pinto.