"Não será graças ao PSD que os trabalhadores verão aumentado o salário mínimo nacional, nem será graças ao PSD que as empresas verão diminuídos os seus custos fiscais. Se o país dependesse do PSD os salários continuariam a não subir e a carga fiscal continuava a não diminuir. (…) mas o que verdadeiramente o PSD conseguiu demonstrar é a sua irrelevância e que o PSD, pura e simplesmente, não conta para nada relativamente ao país", sustentou o primeiro-ministro, acusando o partido liderado pelo PSD de tentar “minar" a concertação social. 

António Costa falava na Assembleia da República, após o deputado independente da bancada do PS Paulo Trigo Pereira ter aberto o debate quinzenal, numa intervenção cuja parte final se destinou a criticar o PSD por ter chumbado ao lado do PCP, Bloco de Esquerda e PEV a descida da Taxa Social Única (TSU) dos empregadores em 1,2 pontos percentuais.

"Pretendia o PSD minar a concertação social e fragilizar a maioria parlamentar, mas em menos de 24 horas foi possível encontrar uma solução alternativa, que tem o apoio dos parceiros na concertação social e também dos parceiros da maioria parlamentar. Nem a concertação social foi minada, nem a maioria saiu fragilizada", salientou o primeiro-ministro, congratulando-se pela rápida resposta do Executivo ao chumbo da TSU.

O Parlamento revogou esta semana a descida da TSU em 1,25 pontos percentuais em 2017, com os votos de PSD, BE, PCP e PEV e abstenções de CDS-PP e PAN. Aquela medida tinha sido acordada pelo Governo socialista em concertação social, como contrapartida do aumento gradual do Salário Mínimo Nacional para 557 euros e 600 em 2019. Entretanto, o executivo anunciou ir agora reduzir o Pagamento Especial por Conta (PEC) em 100 euros a partir de março, mais 12,5% do remanescente da coleta paga por cada empresa.

O "diabo" regressou ao debate

Com o PSD a ser acusado de ter dado uma "cambalhota" no que à TSU diz respeito, Passos Coelho decidiu centrar a sua intervenção de hoje no défice de 2016 que, defende, seria de 3,4% se descontadas as medidas extraordinárias e os cortes no investimento público planeados pelo Governo.

Num debate muito tenso entre o primeiro-ministro e o líder da oposição, Passos Coelho voltou a acusar o Governo de viver num mundo de “fantasias e faz de conta”, nomeadamente no que diz respeito ao valor do défice de 2016, que António Costa já disse que não será superior a 2,3%.

“Se tivermos em conta que o Governo cortou qualquer coisa como 956 milhões de euros ao investimento que tinha planeado, (…) se contarmos com os 500 milhões de euros de encaixe extraordinário do PERES [programa extraordinário de regularização de dívidas], se contarmos com a reavaliação de ativos extraordinária de 125 milhões de euros, se contarmos com as cativações definitivas de 445 milhões de euros, somos levados, por uma conta simples, a considerar que o défice estaria em 3,4% do Produto Interno Bruto”, detalhou Passos Coelho.

Ao longo do debate entre os dois, o presidente do PSD foi insistindo com o primeiro-ministro para que respondesse à pergunta sobre o valor do défice de 2016 corrigido de medidas extraordinárias, levando o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, a intervir, dizendo que “há conclusões políticas a tirar quer da resposta quer da não resposta”.

“Tenho a certeza que o senhor primeiro-ministro não precisa da sua ajuda para mostrar a sua ignorância, não responde porque não sabe”, acusou Passos Coelho, dizendo que o resultado de 2016 se deve a cortes em áreas como a saúde ou educação.

Na resposta, Costa acusou o líder do PSD de “azedume relativamente ao sucesso do país” e quando pressionado por Passos Coelho disse: “Senhor deputado, terá a resposta quando o diabo cá chegar”, provocando protestos na bancada do PSD. Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República, ainda tentou acalmar os ânimos, dizendo que os deputados são livres de perguntar e quem responde tem o direito de responder ou não.

António Costa acabou por salientar que o Governo conseguirá ter o défice mais baixo dos últimos 42 anos “repondo salários, pensões, baixando a carga fiscal”.

... e Sócrates também

Assunção Cristas, líder do CDS, decidiu colocar o foco sobre a dívida e acusou Costa de ser incapaz de fazer “uma revisão e uma análise do que foi a governação Sócrates que nos levou à bancarrota".

"Olhe para os juros da dívida, olhe para os seus parceiros - dia sim, dia não, a falar da reestruturação da dívida -, diga-me se acha que isso é irrelevante do ponto de vista da perceção de risco do país e diga-me, se puder, quanto é que é a dívida pública de Portugal neste momento", questionou Assunção Cristas.

O primeiro-ministro respondeu que "as estatísticas são conhecidas", considerando que "não é aceitável" que a líder centrista diga que o Governo, que reduziu num ponto percentual a dívida líquida, "não dá importância ao tema da dívida”.

"Depois desta sua resposta, saio deste debate ainda mais preocupada. Vejo um primeiro-ministro que nem sequer tem a coragem de dizer nesta casa um número que ainda não é conhecido do público em geral, se fosse conhecido tinha-o aqui para lhe mostrar, o número da dívida do final do ano de 2016", insistiu Assunção Cristas. "Isso significa que o tema da dívida não é relevante e isso mostra muita falta de memória, de capacidade crítica, falta aquilo que o senhor nunca foi capaz de fazer, uma revisão e uma análise do que foi a governação Sócrates que nos levou à bancarrota", acusou.

A presidente do CDS-PP confrontou também o primeiro-ministro com os pagamentos em atraso, sobretudo na saúde, área em que, afirmou, "a degradação dos serviços é por demais evidente".

"Ouvi-o, de forma incrédula, dizer que os pagamentos em atraso diminuíram. Sabe onde? Em tudo o que não tinha a ver consigo: diminuíram na administração local e regional, na administração central aumentaram em 100 milhões de euros", afirmou, sublinhando que na saúde aumentaram 93 milhões de euros.

Em resposta, António Costa aludiu à frustração de se passar "um ano a dizer que vai tudo correr mal" e depois ser-se confrontando com a baixa do desemprego, crescimento robusto, aumento de investimento privado e de exportações, e deixou um conselho à líder do CDS.

25 dias de férias... não. PSD, CDS-PP e PS alinhados no chumbo

As bancadas de PS, PSD e CDS-PP rejeitaram hoje na Assembleia da República os seis projetos de lei de BE, PCP e PAN para repor os 25 dias de férias e majoração das mesmas na função pública.

As iniciativas de PCP e BE iam no sentido de reverter o regime de férias na função pública e no Código Geral do Trabalho, ambos alterados durante a vigência do memorando de entendimento para o Programa de Assistência Económico-Financeiro com a "troika" (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional), que reduziu os dias de férias a 22 úteis.

Na administração pública estão ainda em causa as majorações em função da idade, que vigoraram até 2014: 26 dias de férias entre os 39 e os 49 anos, 27 dias até o trabalhador completar 59 anos e 28 dias a partir dos 59 anos de idade, bem como mais um dia útil de férias por cada 10 anos de serviço efetivamente prestado.

Os projetos de lei do PAN defendiam o reconhecimento do direito a 25 dias úteis de férias, tanto no setor público como no privado.

Estradas e escolas, os compromissos do Executivo

No que às promessas diz respeito, Costa informou o país neste debate quinzenal que há condições para se iniciarem obras em 200 escolas no país, incluindo a Alexandre Herculano, no Porto, onde os alunos foram impedidos de assistir às aulas porque chovia dentro das salas. O tema foi trazido a debate pela líder bloquista Catarina Martins.

Costa respondeu e aproveitou para dar mais uma “alfinetada” em Passos Coelho. "Estamos em condições de arrancar com essas obras que vão abranger 200 escolas em todos o país e uma delas é a Alexandre Herculano", afirmou António Costa, recordando que esta era uma das 39 escolas cujas obras estavam adjudicadas em 2011 "e que foi anulada quando o doutor Pedro Passos Coelho chegou ao Governo”.

O primeiro-ministro anunciou ainda que o Governo vai apresentar na próxima semana o relatório sobre precariedade laboral no Estado e as respetivas medidas para corrigir este “flagelo”. "A precariedade é uma prioridade para nós, trata-se de uma questão de dignidade da pessoa humana e uma condição para um modelo de crescimento assente nas qualificações e nas capacidades criativa e de produção das pessoas. O Estado tem de ser exemplar", afirmou o chefe do executivo socialista em resposta ao líder comunista, Jerónimo de Sousa, no debate parlamentar quinzenal. Costa assegurou que o documento será apresentado na próxima semana, assim como as "medidas de combate a este flagelo", acrescentando estar em curso a "integração imediata de 3.000 docentes em precariedade" nas escolas, além de mais 2.000 em setembro.

Ainda no campo dos compromissos, é de referir o fim da "diabolização" do investimento em estradas. Costa informou o país que no início de fevereiro, lançará um programa de melhoramento das ligações entre as zonas empresariais e as grandes autoestradas.

"Haverá em 2017 um aumento do investimento público na ordem dos 20% e uma aceleração dos investimentos com fundos comunitários. Vamos fazer chegar às empresas mais do dobro do que no ano passado, ou seja, mil milhões de euros", disse, antes de sustentar que os investimentos autárquicos e de desenvolvimento rural vão também conhecer "significativos" aumentos no próximo ano. Neste ponto, o primeiro-ministro disse que no próximo dia 7, com recurso a fundos nacionais, o Governo irá resolver um grave problema "resultante da diabolização do investimento em estradas, quando se deixou de poder recorrer a fundos comunitários para se poder servir as ligações entre zonas empresariais às grandes autoestradas do país". "Uma medida que o Governo tomará para garantir que as empresas podem beneficiar das infraestruturas e assim melhorar as condições de competitividade", declarou, assumindo depois como objetivos a diminuição da burocracia para a diminuição dos custos de contexto.

Para António Costa, 2017 "é o ano em que o país tem de dinamizar as políticas de apoio ao investimento, quer do investimento público, quer do investimento privado”, sustentou.