“Aquilo que eu sinto, aquilo que me dói, aquilo que me custa, é que na sociedade portuguesa, com esta situação [a posição sobre a guerra na Ucrânia], o PCP continua a ser queimado em lume brando. É isso que eu não quero, porque não é isso que está na origem das posições do partido”, advogou o antigo membro do Comité Central do PCP, que deixou este órgão em 2020, em entrevista ao Público e à Rádio Renascença, divulgada hoje.
E acrescentou: “Quando alguma coisa não corre bem, nós também temos de dizer [que] não correu bem, não era aquilo que pensávamos, corrigir. Acho que o partido devia fazer isso.”
A Lusa pediu um comentário ao dirigente comunista João Oliveira sobre as declarações de Arménio Carlos, durante uma conferência de imprensa na sede do partido, em Lisboa.
O membro da Comissão Política do Comité Central comunista disse que não queria pronunciar-se sobre a entrevista.
Na entrevista, Arménio Carlos considerou que nas “últimas intervenções” o novo secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, “já deu mais algumas nuances”.
Em entrevista à Lusa, divulgada na quarta-feira, Paulo Raimundo comparou a Rússia a um “cão atiçado” pelos Estados Unidos, NATO e União Europeia, e recorreu até a uma história da sua infância para o ilustrar.
“Tenho um amigo de infância e a determinada altura ele tinha um cachorrinho. Então a brincadeira que se montou – que era uma coisa completamente absurda – era três crianças que à vez atiçavam o cão. […] Esse meu amigo, que era o dono do cão, quando foi a vez dele de fazer esse movimento de atiçar o cão, o cão deu-lhe 20 e tal dentadas. Ao dono! E a pergunta é: a culpa é do cão? O cão é culpado desse ato?”, sustentou Paulo Raimundo.
Sobre o novo secretário-geral comunista, em entrevista ao Observador há duas semanas, Arménio Carlos confessou que foi uma “surpresa” e que havia “perspetivas que apontavam para outros militantes”.
Hoje, na entrevista ao Público e à Renascença, o antigo dirigente comunista insistiu que “a surpresa foi geral”, mas que Paulo Raimundo deixou, na primeira intervenção que fez no encerramento da Conferência Nacional do PCP, “uma mensagem clara e objetiva” e apelou a uma “mobilização significativa do partido para os desafios que se avizinham”.
Mas na opinião de Arménio Carlos, houve uma coisa que ficou de fora dos dois dias de discussão: os resultados eleitorais do PCP, que sofreram uma queda acentuada (perdeu metade das autarquias em 2021 e o grupo parlamentar ficou reduzido a seis deputados).
“Na minha opinião devia tê-lo feito [na conferência]. Creio que o facto de não o ter feito de uma forma aprofundada teve como pressuposto a ideia de que essa reflexão, de alguma forma, foi sendo construída ao longo dos últimos meses”, ponderou Arménio Carlos.
O ex-secretário-geral da CGTP não descarta que os resultados eleitorais do PCP sejam provocados por “fatores externos” – o partido aponta uma campanha anticomunista e outra do PS para alcançar a maioria absoluta recorrendo à ideia de que a extrema-direita chegaria ao Governo se o PSD vencesse -, mas também há “questões internas que acabaram por conduzir a este resultado”.
“Não podemos ficar satisfeitos com aquilo que se tem passado em termos de resultados eleitorais. Temos de fazer uma avaliação”, advertiu.
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