“Sabemos que não temos culpa de absolutamente nada. Sabemos que fizemos a coisa certa desde o primeiro momento”, disse Bolsonaro, numa cerimónia de melhoria na infraestrutura de saneamento no município de Russas, localizado na região nordeste do Brasil.

Bolsonaro, que nega a gravidade da pandemia de covid-19, fez essas declarações no dia em que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga ações e omissões do Governo brasileira na gestão da crise sanitária, e funciona no Senado brasileiro, apresenta o seu relatório final, após seis meses de investigações.

“Como seria bom se aquela CPI fizesse algo produtivo para o nosso Brasil. Roubaram o tempo do nosso ministro da Saúde, de funcionários, de gente humilde e empresários, mas não produziram nada, só ódio e ressentimento”, afirmou Bolsonaro, cujo indiciamento por vários crimes, incluindo propagação de epidemia, é proposto no documento.

O Presidente, que nega a gravidade do novo coronavírus, voltou hoje a defender medicamentos ineficazes contra a covid-19, como a cloroquina, e a atacar a política "nefasta, injusta e criminosa" de "ficar em casa", referindo-se às mediadas de distanciamento social aplicadas por governadores e prefeitos no Brasil.

Da mesma forma, o dirigente brasileiro criticou a obrigatoriedade da vacina contra a covid-19, que ele próprio já anunciou que não vai tomar porque foi infetado pelo vírus em 2020, e dos certificados de vacinação que vários países estão a pedir e que dezenas de cidades brasileiras já adotaram.

"A liberdade é um bem sagrado maior do que nossa própria vida", sentenciou Bolsonaro.

“Ao final de seis meses de intenso trabalho, esta CPI da pandemia reuniu evidências que mostram que o Governo Federal (...) tem agido lentamente no combate à pandemia do coronavírus, colocando deliberadamente a população em risco de uma verdadeira infeção em massa”, frisa-se no documento.

Composta por senadores de várias vertentes políticas, a CPI da pandemia proferiu um veredito devastador para a imagem de Bolsonaro, que faz críticas recorrentes à investigação parlamentar e ao combate à pandemia, que já classificou como "gripezinha".

A investigação sobre o combate à pandemia no Brasil foi palco de audiências agitadas, com depoimentos comoventes e revelações assustadoras sobre experiências em "cobaias humanas" com remédios ineficazes.

Para um grupo maioritário de senadores que participaram nos trabalhos, os crimes citados no relatório são intencionais, tendo o Governo Bolsonaro decidido deliberadamente não tomar as medidas necessárias para conter a circulação do vírus.

Alvo de acusações extremamente graves, mas cujo alcance se desconhece, já que o relatório será encaminhado às autoridades judiciais responsáveis por dar seguimento ou não aos factos descobertos, Bolsonaro não deverá sofrer um processo de destituição porque tem amplo apoio do Parlamento.

Da mesma forma, há dúvidas sobre se o procurador-geral da República do Brasil, Augusto Aras, um aliado do Presidente brasileiro, pode vir a bloquear qualquer acusação.

Além de Bolsonaro, a CPI também pediu a acusação de quatro ministros e dois ex-ministros do Governo brasileiro.
Os três filhos mais velhos do Presidente também foram alvo do CPI por incitação ao crime através da disseminação de informações falsas.

A CPI da pandemia não tem competência para instaurar processos judiciais por si só, mas as suas revelações podem ter considerável impacto político. Após votação, o relatório será encaminhado ao Ministério Público, que tem jurisdição exclusiva para indiciar os acusados pela CPI da pandemia.

No caso de Jair Bolsonaro, os especialistas consideram improvável que ocorra uma acusação num futuro próximo, já que atos desta natureza só podem ser determinados pelo Procurador-Geral da República.