Depois da saída, em 2009, do último “guardião” de Cabrum - Manuel Pontes, que já tinha mais de 70 anos -, a história da aldeia teve um novo rumo.

Vasco e a companheira Manuela foram dos primeiros casais a repovoar a aldeia, que hoje tem uma dúzia de habitantes, entre os quais quatro menores.

“Muita coisa mudou. Inicialmente, tínhamos um contrato de cedência de cinco anos da aldeia, conseguido para um grupo de seis pessoas. Essas pessoas foram todas embora, menos eu e a minha companheira”, contou à agência Lusa Vasco Saraiva.

O contrato acabou e “o que era de cedência passou a aluguer”, sendo paga aos proprietários uma renda trimestral sobre algumas zonas desta aldeia da freguesia de Calde, acrescentou.

Entretanto, há três anos, foi criada a Amakura – Associação Internacional de Desenvolvimento Rural e Ambiental, com o objetivo de ter “uma plataforma legal para trabalhar com o exterior”.

A associação tem como sócios não só os 12 habitantes da aldeia, mas também “agricultores biológicos e pessoas que se sensibilizam pelo projeto”. É sua intenção conseguir criar “uma cooperativa de alimentos e de serviços”, que possa ajudar projetos idênticos pelo país fora.

“Sentimos necessidade de constituir a associação para estarmos com uma base legal. Abrimos as portas a toda a gente na Internet, dizendo que estava uma aldeia cedida a três casais, e sentíamos que era muita responsabilidade, porque estávamos a fazer papel de políticos e não o somos”, explicou.

A Amakura permitiu “gerar alguma receita e comprar algum terreno e umas casinhas”, nas quais é feito “um pouco de ecoturismo” e onde ficam alojados os voluntários da aldeia, ou seja, pessoas que trabalham seis horas por dia em troca de comida e dormida.

“Começámos a comprar um pouco das terras, porque não tínhamos aqui raízes e as pessoas à volta não nos respeitavam muito, viam-nos como sem-abrigo”, afirmou.

Vasco costuma dizer que tem “onde cair morto”, ou seja, tem uma família que vive na Covilhã, com casa e com terras.

“Só que eu vi este sítio, com grande potencial, ao abandono”, justificou Vasco, que, depois da licenciatura em Design Gráfico, tirou várias formações relacionadas com o estilo de vida que defende, nomeadamente permacultura, bioconstrução e massagem ayurveda.

Segundo Vasco, estão a chegar à aldeia “pessoas que não estão dentro do projeto da associação e têm os seus projetos individuais”.

“Há um núcleo que continua no mesmo projeto, a viver em comunidade, e há outras pessoas que estão a fazer o seu próprio projeto”, contou.

Entre os ideais desse núcleo, está “fazer a horta comum, mas tentar ter também a horta familiar”, para que cada um tenha responsabilidade do local onde vive.

“Na permacultura, falamos na zona zero, que é a nossa casa e ao redor da nossa casa, e temos que estar responsáveis por ela. É difícil as pessoas assumirem a responsabilidade, por isso é que não conseguem aguentar-se aqui muito tempo”, lamentou.

No seu dia-a-dia, Vasco tem a preocupação de ir pondo sementes na terra com o filho de cinco anos, “porque ele é que vai colher os frutos no futuro”. Cultiva agrofloresta, com “o pinheiro nativo do pinhão, o marmelo, as avelãs e o mirtilo”, e, como “nem só de árvores vive a floresta”, também cria cogumelos.

Apesar da forte ligação à natureza, garante que os habitantes de Cabrum não vivem na idade da pedra: “Temos tecnologia, temos os nossos computadores, temos aquecimento, que é uma bailarina a fogo, com capacidade para 200 litros de água quente para loiça, banho e aquecimento da casa”.

Nesta aldeia, há também o conceito de reabilitar e reutilizar. A casa de Vasco e Manuela é um exemplo, com vidros, portas e telhado em segunda mão.

“Não é ecológico, mas também não comprei novo. São preocupações que fazem toda a diferença no planeta, que é o que temos em comum. Se não olhamos por ele, quem é que vai olhar?”, questionou.