A disponibilidade e a diversidade de oferta de drogas continuam elevadas e a aumentar na União Europeia, provocando “novos desafios” nas políticas de combate e nos cuidados de saúde e sociais, segundo um relatório europeu.
Esta é uma das conclusões do Relatório Europeu sobre Drogas 2023: Tendências e Evoluções, do Observatório Europeu das Drogas e da Toxicodependência (EMCDDA, na sigla em Inglês) hoje lançado em Bruxelas, o qual sublinha que uma “maior diversidade na oferta e no consumo de drogas criam novos desafios para a Europa”.
De acordo com o documento da agência sediada em Lisboa, que viu na terça-feira os seus poderes renovados para resposta aos novos desafios e apoio aos Estados-membros, denota-se que “a disponibilidade de drogas continua a ser elevada em todos os tipos de substâncias” e que “a escala e a complexidade da produção de drogas ilícitas na Europa continua a aumentar”.
O documento de 2023, que compila dados de 2021 e 2022 dos 27 Estados-membros, da Turquia e da Noruega, destaca igualmente que existe uma “maior diversidade na oferta e no consumo”, o que “está a criar novos desafios” para os decisores políticos em matéria de drogas e para os cuidados de saúde na Europa.
Segundo o relatório, os consumidores “estão agora expostos a uma gama mais vasta de substâncias psicoativas, frequentemente de potência e pureza mais elevadas”.
A análise abrange uma vasta gama de drogas ilícitas, dos opiáceos e estimulantes aos novos produtos de canábis e às drogas dissociativas (como, por exemplo, cetamina – utilizada como anestésico e analgésico na medicina, sobretudo veterinária) e uma atualização sobre as novas substâncias psicoativas (NSP), que continuam a representar um desafio para a saúde pública na Europa.
Em 2022, foram registadas pela primeira vez 41 novas drogas através do Sistema de Alerta Rápido da União Europeia, elevando o total de NSP monitorizadas pela agência para 930, adianta.
O relatório sublinha a necessidade de melhorar os dados forenses e toxicológicos para uma melhor compreensão das ameaças decorrentes das novas e potentes substâncias sintéticas, das misturas de drogas, das substâncias adulteradas, dos mercados de drogas em mudança e dos padrões de consumo, e, por isso, lançará em 2024 uma rede europeia de laboratórios forenses e toxicológicos.
O âmbito das políticas relativas à canábis na Europa está a alargar-se gradualmente, abrangendo agora não só o controlo da canábis ilícita, mas também a regulamentação desta e dos canabinoides para fins terapêuticos e outros (cosméticos, produtos comestíveis).
A canábis continua assim a ser a droga ilícita mais consumida no velho continente e a cocaína o estimulante de maior uso, enquanto os consumos de opiáceos, em decréscimo desde o século passado, parecem estar a aumentar, refere um relatório europeu.
Segundo o documento, estima-se que cerca de 8%, o que corresponde 22,6 milhões de europeus adultos (15-64 anos), consumiram canábis no último ano.
De acordo com os dados, em 2021, as quantidades de resina de canábis (816 toneladas) e de canábis herbácea (256 toneladas) apreendidas na UE atingiram o seu nível mais elevado numa década, “o que sugere uma elevada disponibilidade desta droga”.
Atualmente, República Checa, Alemanha, Luxemburgo, Malta, Países Baixos e a Suíça estão a introduzir novas abordagens para regulamentar a oferta de canábis para uso recreativo, adianta o relatório, que, face às alterações detetadas, destaca “a necessidade de investir na monitorização e na avaliação para compreender plenamente o seu impacto na saúde pública e na segurança”.
O documento refere como importantes as “apreensões recorde” de cocaína e a preocupação crescente com o consumo de estimulantes sintéticos, considerando que “o tráfico de grandes volumes através dos portos marítimos europeus em contentores comerciais" justifica a disponibilidade desta droga.
“Há receios de que esta situação possa contribuir para o aumento do consumo de cocaína, dos danos para a saúde e da criminalidade relacionada com a droga”, refere uma sinopse do documento.
Em 2021, foi apreendida a quantidade recorde de 303 toneladas de cocaína pelos Estados-membros da UE e em 2022 em Antuérpia (Bélgica), o segundo maior porto da Europa, foram apanhadas 110 toneladas, contra as 91 do ano anterior.
Os dados disponíveis sugerem que os grupos de criminalidade organizada visam também e, cada vez mais, portos de menor dimensão de outros países da UE, como Portugal, e de países que fazem fronteira com a UE, referindo que o fabrico ilícito de cocaína na União está a ganhar importância, tendo sido desmantelados 34 laboratórios de cocaína em 2021 (23 em 2020), alguns de grande dimensão.
A maior variedade de estimulantes sintéticos agora disponíveis no mercado ilícito está a aumentar os riscos para a saúde pública, afirma o estudo, explicando que, historicamente, a anfetamina tem sido o estimulante sintético mais consumido na Europa.
O relatório refere também que os estimulantes são agora injetados com maior frequência, por vezes combinados com a heroína ou outros opiáceos.
O documento ressalva que “a compreensão dos danos associados à alteração dos padrões de consumo das drogas injetáveis será fundamental para a definição de intervenções que reduzam os danos associados a este comportamento” e alerta também para “potenciais riscos para a saúde” de substâncias menos conhecidas como a cetamina, “que se tornou a droga recreativa de eleição mais tradicional em alguns contextos”.
É habitualmente inalada e, por vezes, é encontrada adicionada a outras misturas de droga, incluindo os pós e comprimidos de MDMA, escreve o Observatório, acrescentando que os consumidores de longa duração de cetamina podem ter problemas de saúde como, por exemplo, lesões na bexiga.
O aumento do consumo recreativo de óxido nitroso (“gás do riso”) em algumas regiões da Europa, entre as quais Portugal, está a suscitar preocupações em matéria de saúde.
Uma análise recente do EMCDDA chamou a atenção para os riscos associados a esta droga, "que parece ser agora mais acessível, mais barata e mais popular entre alguns jovens, entre os quais intoxicações, queimaduras e lesões pulmonares e, em alguns casos de consumo prolongado, danos no sistema nervoso".
O relatório do EMCDDA destaca que os problemas relacionados com os opiáceos na Europa “estão a evoluir”, pois a heroína (opiáceo mais problemático nos anos 80 e 90 do século passado) continua a ser a mais consumida na Europa, mas existe também uma preocupação crescente com o consumo de opiáceos sintéticos.
Atualmente, a disponibilidade de heroína continua a ser elevada, diz o EMCDDA, já que a quantidade apreendida pelos Estados-Membros da UE mais do que duplicou em 2021, para 9,5 toneladas, ao passo que a Turquia apreendeu um recorde de 22,2 toneladas.
Quase toda a heroína consumida na Europa provém do Afeganistão, onde os talibãs anunciaram a proibição do cultivo da papoila do ópio em abril de 2022. Embora seja demasiado cedo para dizer de que forma o mercado europeu de heroína será afetado pela proibição, há receios de que qualquer escassez na disponibilidade da droga possa ser associada a um aumento da oferta e da procura de opiáceos sintéticos.
“Muitos opiáceos sintéticos são extremamente potentes e representam um risco de intoxicação e de morte. São necessárias apenas pequenas quantidades para produzir milhares de doses, o que torna estas substâncias muito mais lucrativas para os grupos do crime organizado”.
Os novos opiáceos sintéticos não controlados continuam a aparecer no mercado europeu de droga, com um total de 74 identificados desde 2009.
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