“Eu há dias estive num município que, no futuro próximo, vai ter três novos hospitais, um público e dois privados. Mas os médicos, enfermeiros e os trabalhadores são os mesmos. Portanto, nós vamos puxar o cobertor para cima e vão ficar os pés à mostra. Os trabalhadores são os mesmos”, disse o cardeal, bispo de Setúbal, alertando para a falta de respostas na área da saúde, perante cerca de duas centenas e meia de pessoas que participaram na vigília.

“Nós temos um problema. Um problema que tem a ver com o custo da habitação, nós temos professores que são colocados, não sei onde, e o dinheiro não permite pagar a habitação e corresponder à sua função e à sua missão. Nós temos homens e mulheres da segurança, da polícia, que são colocados longe e também não conseguem corresponder aos custos da habitação”, acrescentou D. Américo Aguiar.

Convidado pelo presidente da Câmara Municipal de Setúbal, André Martins (CDU), a participar na vigília, o cardeal D. Américo Aguiar disse que acedeu de imediato ao convite.

Apesar do retrato negro que fez do país em diversas áreas, D. Américo Aguiar garantiu, no entanto, que a sua presença na vigília não era contra ninguém, mas para apelar a que todos assumam as suas responsabilidades em prol do bem comum.

“Eu não estou aqui, como acho que entendem, contra ninguém. Não podia ser. Estou aqui para que todos nos entendamos para o caminho certo, para as soluções dos problemas das pessoas. E, por isso, felicito os senhores presidentes de câmara por aquilo que eu ouvi quando cada um deles falou no assumir de responsabilidades, que vão para além daquilo que são as expectativas e que são as suas competências, para o bem das pessoas, para o bem de cada um de vocês, para o nosso bem”, disse.

“Estarei sempre convosco em todos os momentos e em todas as circunstâncias que for preciso”, disse D. Américo Aguiar, reconhecendo que a vigília de Setúbal em defesa do SNS também foi um momento importante para que os protagonistas, os responsáveis políticos, “ouçam os gritos” dos que mais sofrem.

Na vigília, em que usaram da palavra os três autarcas do Fórum Intermunicipal da saúde, André Martins (Setúbal), Álvaro Amaro (Palmela) e Francisco de Jesus (Sesimbra), e em que também marcaram presença muitos profissionais de saúde, uma representante da Ordem dos Médicos, as deputadas Joana Mortágua, do BE, e Paula Santos, da CDU, entre muitos outros participantes, não faltaram críticas à atual gestão do SNS.

A falta de médicos e outros profissionais de saúde, a crescente transferência de verbas do SNS para o setor privado, o encerramento de vários serviços de urgência de pediatria, ginecologia e obstetrícia, entre outros, muito para além do que tinha sido programado há poucos meses para diversos hospitais, incluindo o hospital de São Bernardo, do Centro Hospitalar de Setúbal, bem como a ausência de respostas nos centros de saúde, foram apenas algumas das muitas críticas que se ouviram na vigília junto ao Hospital de São Bernardo, em Setúbal.

O médico Vítor Augusto, ex-diretor do serviço de Urgência do Hospital de São Bernardo, alertou mesmo para o fim próximo do SNS.

“Estamos a assistir, infelizmente, à proximidade do cortejo fúnebre do Serviço Nacional de Saúde. Podem parecer palavras duras, violentas, mas é aquilo que eu sinto enquanto profissional de saúde que sempre vestiu a camisola durante 35 anos como médico”, disse.

“É preciso que alguém, hoje em dia, diga, como no conto, que o rei vai nu. E que esta denúncia seja também uma capacidade de denúncia da extinção de um pilar fundamental, estruturante, da sociedade, que é a saúde, e, no nosso caso, o Serviço Nacional de Saúde, uma joia da coroa das conquistas do 25 de abril”, frisou o ex-diretor da Urgência do Hospital de São Bernardo.