A comissão parlamentar de inquérito aprovou esta sexta-feira um pedido de audição ao ex-primeiro-ministro, proposto pelo Chega.

O requerimento para ouvir o antigo chefe de Governo foi aprovado com os votos favoráveis dos deputados do Chega, PSD, IL e CDS-PP, a abstenção de BE e PCP e os votos contra de PS, Livre e PAN.

De acordo com o regime jurídico dos inquéritos parlamentares, os ex-primeiros-ministros podem optar por “depor por escrito, se o preferirem”.

Se for essa a opção de António Costa, terá de remeter à “comissão, no prazo de 10 dias a contar da data da notificação dos factos sobre que deve recair o depoimento, declaração, sob compromisso de honra, relatando o que sabem sobre os factos indicados”, acrescenta o regime jurídico.

Na discussão deste ponto, o líder do Chega, justificou este pedido referindo que o “antigo primeiro-ministro recebeu no seu gabinete um email a pedir o acesso ao Serviço Nacional de Saúde” e “fez transmitir esse pedido a outras entidades dentro do seu Governo”.

"Ninguém acredita que o chefe de gabinete enviasse para o Ministério da Saúde se o primeiro-ministro não autorizasse", sustentou, e acrescentou que "a mãe das gémeas diz que teve autorização de todos os titulares políticos" e que António Costa era responsável enquanto chefe de Governo.

João Paulo Correia, do PS, acusou o Chega de fazer uma "chamada política" sem "relevância mínima para a comissão de inquérito" e que, "se tivesse o mínimo de relevância, teria feito parte dos planos iniciais do Chega, não o fez", acusando o Chega de ter "como único objetivo atingir politicamente" o ex-primeiro-ministro.

"Da documentação que nos foi disponibilizada, que fique claro que não há a mínima intervenção do dr. António Costa", afirmou o coordenador socialista, indicando que a "documentação recebida da Casa Civil foi dirigida ao seu gabinete e daí transitou para o Ministério da Saúde".

Pelo PSD, o deputado António Rodrigues indicou que iria apoiar esta proposta "por princípio", referindo que o partido também não obstaculou o pedido de depoimento do Presidente da República. No entanto, o social-democrata disse não ver "qualquer tipo de utilidade nesta chamada".

Joana Mortágua, do BE, fez questão de salientar que o que está em causa é um "email oficial da Presidência para o chefe de gabinete do primeiro-ministro, que despachou para a ministra da Saúde", afirmando que este é um "procedimento absolutamente normal que não faz prever nenhum envolvimento de António Costa neste caso".

A deputada única do PAN, Inês de Sousa Real, justificou o voto contra considerando que "há precipitação" e "não há indícios de que o ex-primeiro-ministro tenha tido acesso à informação".

Comissão volta a chamar Nuno Rebelo de Sousa para depor

A comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas tratadas no Hospital de Santa Maria voltou a requerer hoje a presença do filho do Presidente da República, alegando que que a sua recusa em comparecer “consubstancia um crime de desobediência”.

A comissão aprovou por unanimidade, a convocação de Nuno Rebelo de Sousa para ser ouvido nos dias 3 ou 12 de julho, presencialmente ou por videoconferência, antes da audição à mãe das crianças luso-brasileiras.

“Ao abrigo do artigo 19 do Regimento Jurídico dos Inquéritos Parlamentares, a recusa em comparecer para depor perante esta comissão de inquérito, fora dos casos previstos no artigo 17, com substância um crime de desobediência qualificada”, indicou a comissão na reunião de hoje.

O presidente da comissão parlamentar de inquérito, Rui Paulo Sousa, afirmou que, caso Nuno Rebelo de Sousa se recuse a comparecer na audição, essa ação será comunicada ao presidente da Assembleia da República, com “os elementos indispensáveis à instrução do processo”, bem como será feita uma participação à Procuradoria-Geral da República.

O coordenador do PSD, António Rodrigues, disse que o seu grupo parlamentar iria apresentar um requerimento a pedir um parecer ao auditor jurídico da Assembleia da República para definir “com clareza qual é o conceito de segredo de justiça à luz das comissões parlamentares de inquérito”.

Assim, segundo o deputado social-democrata, a comissão poderia confrontar quem estivesse em situação de arguido.

“Nesta semana, houve algumas informações contraditórias sobre esta matéria, nomeadamente, quer o pouco claro ‘mail’ que a comissão recebeu por parte do advogado de Nuno Rebelo de Sousa, que indiciava, de alguma forma, a recusa até de comparecer perante a comissão e, com clareza, dizendo que não iria fazer qualquer tipo de depoimento ou entrega de documentos, exceto ao Ministério Público”, sustentou.

Na quarta-feira, o advogado de defesa do filho do chefe de Estado comunicou à comissão de inquérito que recusava prestar esclarecimentos, admitindo contudo estar presente em audição “em momentos futuros”.

Na mesma carta, Nuno Rebelo de Sousa não recusa ser ouvido no inquérito parlamentar.

O líder do Chega, André Ventura, reconheceu ter dúvidas relativamente ao parecer à sua força junto da Assembleia República.

“Precisamos de respostas e não de perguntas. Há uma coisa que não merece discussão o segredo de justiça não pode ser oponível à comissão parlamentar de inquérito. A função da comissão parlamentar de inquérito tem função judicial”, disse, acrescentando que “em alguns casos” a comissão poderá ser realizada à porta fechada.

Por sua vez, o deputado do CDS-PP João Almeida adiantou que a reunião é publica salvo alguns motivos.

“Do ponto nosso ponto de vista, o segredo de justiça não é oponível. Isso está previsto no regulamento da comissão parlamentar de inquérito”, sublinhou.

Já o coordenador do PS, João Paulo Correia, observou que Nuno Rebelo de Sousa, na condição de arguido, “tem o direito ao silêncio”.

Quem mais vai ser chamado?

Na reunião de hoje foram também aprovadas, por unanimidade, as audições do ex-assessor do Presidente da República para a área da saúde Mário Pinto, do antigo Cônsul-Geral de Portugal em São Paulo, Paulo Jorge Nascimento, propostas pelo Chega, e da antiga secretária-geral do Ministério da Saúde, Sandra Cavaca, proposta pelo PS.

Os deputados aprovaram ainda um requerimento do BE para que a comissão solicite informações ao Hospital de Santa Maria.

A reunião da comissão de inquérito arrancou pelas 14:00, enquanto ainda decorria o plenário da Assembleia da República, e foi interrompida cerca de meia hora depois, para que os deputados participassem nas votações regimentais.

Em causa no processo, que tem como arguidos o ex-secretário de Estado da Saúde Lacerda Sales e Nuno Rebelo de Sousa, filho do Presidente da República, está o tratamento hospitalar das duas crianças luso-brasileiras que receberam o medicamento Zolgensma. Com um custo de dois milhões de euros por pessoa, este fármaco tem como objetivo controlar a propagação da atrofia muscular espinal, uma doença neurodegenerativa.

O caso está ainda a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República, mas a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde já concluiu que o acesso à consulta de neuropediatria destas crianças foi ilegal.

Também uma auditoria interna do Hospital Santa Maria concluiu que a marcação de uma primeira consulta hospitalar pela Secretaria de Estado da Saúde foi a única exceção ao cumprimento das regras neste caso.

(Notícia atualizada às 16h13)