“Na estratégia para combater o crime organizado de abril de 2021, a Comissão comprometeu-se a analisar e delinear possíveis abordagens e soluções sobre a retenção de dados, em conformidade com os acórdãos do Tribunal [de Justiça da UE], que respondam às necessidades da aplicação da lei e do sistema judicial de uma forma que seja operacionalmente útil, tecnicamente possível e juridicamente sólida, inclusive através do pleno respeito pelos direitos fundamentais. Em conformidade com este compromisso, a Comissão está atualmente a conduzir um processo de consulta com os Estados-membros, com vista a traçar o caminho a seguir”, disse fonte oficial da instituição em resposta escrita enviada à Lusa.
Quando questionada pela Lusa sobre a decisão do Tribunal Constitucional (TC) português, que declarou há um mês inconstitucionais as normas da chamada lei dos metadados, sobre utilização de dados de comunicações móveis e eletrónicas para fins de investigação criminal, a Comissão Europeia diz “não comentar a decisão dos tribunais nacionais”.
Porém, o executivo comunitário afirma “acompanhar de perto a evolução legislativa nos Estados-membros em matéria de conservação de dados”, classificando esta como “uma questão muito complexa e sensível”.
O acesso aos metadados, dados de tráfego das comunicações, é gerido ao nível nacional por cada país da UE.
Num acórdão divulgado em abril deste ano, o Tribunal de Justiça da UE (TJUE) defendeu, à semelhança do que tem vindo a reiterar sobre os metadados, que “o direito da União se opõe a uma conservação generalizada e indiferenciada dos dados de tráfego e dos dados de localização relativos às comunicações eletrónicas para efeitos de luta contra as infrações graves”, na sequência de um recurso apresentado pelo Supremo Tribunal da Irlanda referente a um caso de homicídio.
Ainda assim, a justiça europeia ressalvou que “a admissibilidade dos meios de prova obtidos através dessa conservação cabe, em conformidade com o princípio da autonomia processual dos Estados-membros, ao direito nacional, sob reserva do respeito, nomeadamente, dos princípios da equivalência e da efetividade”.
A fonte oficial da Comissão Europeia adianta, na resposta hoje enviada à Lusa, que “é prerrogativa dos tribunais nacionais tirar as conclusões da aplicação do direito comunitário tal como interpretado pelo TJUE, em relação à sua legislação nacional e aos factos do caso que cada um apresentou ao Tribunal de Justiça para uma questão prejudicial”.
Também contactado pela Lusa, o TJUE escusou-se a comentar a decisão do TC, recordando ter como papel “interpretar o direito da União nos casos que lhe são submetidos pelos tribunais nacionais, Estados-membros, instituições da UE e, sob certas condições, por particulares e empresas”.
Em 2014, o TJUE considerou inválida a diretiva europeia de 2006 relativa à conservação de dados, alegando não respeitar os direitos fundamentais da UE, mas esta decisão não afetou a transposição da diretiva europeia em Portugal, pelo que, em 2019, a Provedora de Justiça recomendou ao Governo alteração da lei dos metadados.
Já este ano, num acórdão proferido no dia 19 de abril, o TC declarou inconstitucionais normas da chamada lei dos metadados que determinam que os fornecedores de serviços telefónicos e de internet devem conservar os dados relativos às comunicações dos clientes - entre os quais origem, destino, data e hora, tipo de equipamento e localização - pelo período de um ano, para eventual utilização em investigação criminal.
Em meados de maio, o primeiro-ministro afastou uma revisão constitucional, mas defendeu uma mudança na jurisprudência europeia sobre esta matéria.
António Costa anunciou que o Governo vai apresentar uma proposta de lei para alterar a lei dos metadados.
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