A duas semanas das férias da Páscoa, mais de três mil escolas foram forçadas a encerrar e milhares de docentes começaram a dar aulas à distância. Do outro lado dos ecrãs, estão quase dois milhões de alunos, desde crianças a jovens do ensino superior e tem havido trabalho para todas as idades – até para os pais.

Em tempos de crise, os professores recorrem a todas as ferramentas disponíveis: desde o ‘e-mail’, a plataformas das escolas, ao portal Inovar, vídeos caseiros, Escola Virtual ou Google Classroom, Whatsapp ou Skype, segundo relatos de dezenas de encarregados de educação à Lusa.

A rotina de uma estudante do 9º ano do ensino artístico de dança, em Viseu, mudou de um dia para o outro. Se antes corria entre a Secundária Emídio Navarro e a escola de dança Lugar Presente, agora faz tudo em casa.

A professora de Português mandou fichas e avisou que as aulas seriam por Skype, tendo também criado um grupo no Whatsapp para irem combinando as aulas. A professora de Ciências também sugeriu o Whatsapp, enquanto a de Matemática combinou que iam usar o ‘email’. Quanto à dança, os “exercícios técnicos ou coreográficos”, por exemplo, são agora feitos em casa, contou à Lusa a mãe da adolescente.

Também as rotinas dos docentes mudaram. Num colégio de Lisboa, o professor de Matemática dá as aulas por videoconferência. Já tinha avisado que comprara uma aplicação, mas, mesmo assim, conseguiu surpreender a turma, quando, na segunda-feira, surgiu nos écrans dos computadores e telemóveis dos seus alunos do 10.ano.

Maria Lacerda explicou à Lusa que o professor tem várias câmaras instaladas em casa e os alunos podem escolher que imagem querem ver durante a aula: se um ângulo do professor a trabalhar, se a folha onde está a fazer o exercício. Além disso, o cenário vai mudando, uma espécie de ‘greenscreen’ que permite ao professor explicar equações numa praia das Maldivas e, logo a seguir, começar a tirar dúvidas diretamente do “Espaço”.

“É uma produção digna de um ‘youtuber’. Estamos a adorar. É muito mais giro e continua a ser possível participar na aula porque é interativo”, contou a aluna.

Naquele colégio, os alunos mantêm as aulas do que estava definido no início do ano letivo. Às 08:30 têm de estar ligados, de contrário têm falta. Mas tem havido alguns problemas de acesso à Internet porque há muita gente ligada ao mesmo tempo.

O mesmo acontece noutras escolas do país, porque as plataformas digitais não estavam preparadas para tantos alunos ligados ao mesmo tempo.

No Colégio Amor de Deus, em Cascais, por exemplo, os trabalhos de casa são colocados na Escola Virtual, mas uma encarregada de educação disse à Lusa que, por vezes, o ‘site’ está em baixo.

A Escola Virtual é uma plataforma paga da Porto Editora, mas, com o aparecimento do novo coronavírus, a editora decidiu torná-la gratuita para ajudar alunos e professores e disparou o número de utilizadores.

Muitos professores optam pelo ‘email’ ou Whatsaap. Sem aulas “ao vivo”, enviam os trabalhos e os prazos de entrega. No caso dos alunos mais novos, invariavelmente, esta tarefa conta com a colaboração dos pais, que são os mensageiros que recebem as fichas vazias e as devolvem depois de preenchidas pelos filhos.

Há quem receba TPC todos os dias, como é o caso de uma turma do 3.º ano da Escola Básica da Areia-Guincho, em Cascais. O pai de um aluno contou à Lusa que a professora manda diariamente um ‘email’ com fichas de trabalho.

Mas em muitas escolas do 1.º ciclo, os alunos foram para casa na passada sexta-feira como se já fossem as férias grandes.

Na EB1 S. Luís, em Faro, os alunos abandonaram a escola com a mochila carregada de manuais e pouco depois receberam um ‘email’ com “trabalhos de casa” para os próximos tempos para todas as disciplinas: Português, Matemática, Estudo do Meio e Inglês.

A mãe de três alunas do colégio do Rosário, no Porto, contou que as mais velhas (do 11.º e 8.º anos) trabalham diretamente com os professores e só os trabalhos da mais nova, do 5.º ano, chegam ao ‘email’ dos encarregados de educação.

A maioria dos alunos com quem a Lusa falou não têm tido aulas de educação física. A Lusa encontrou apenas uma escola onde esta disciplina não foi descartada: No Liceu Francês, em Lisboa, “estão a fazer ensino à distância, inclusivamente educação física”, contou um pai à Lusa.

Desde segunda-feira, o Whatsapp transformou-se no recreio dos alunos e muitas vezes estão lá professores. A sala de aula é agora o Google Classroom.

Nesta adaptação, alguns pais também decidiram criar um horário de trabalho, com aulas de manhã e outras à tarde. Segundo o Ministério da Educação e a Ordem dos Psicólogos, é importante manter rotinas de trabalho assim como horários de sono.

No entanto, as escolas e famílias estão ainda a tentar adaptar-se às mudanças. Nas escolas, os diretores querem manter o contacto com as famílias para o caso de aparecer algum doente com Covid-19.

Também nas creches, as educadoras não têm mãos a medir. Muitas criaram grupos no Whatsapp para saberem se está tudo bem e darem sugestões às famílias do que podem fazer em casa com os mais novos. Isabel tem dois filhos, um ainda anda na “sala dos 4 anos” e o outro já chegou ao 3.º ano. Ambos têm trabalhos diários, contou à Lusa.

À Lusa, alguns pais admitiram que temem que este sistema não funcione. A maioria está em teletrabalho e não tem muita disponibilidade para acompanhar os filhos. Além disso, desabafou um pai, as crianças têm de fazer fichas, mas não há aulas tutoriais, “é o caos”.

Para o presidente da Fenprof, Mário Nogueira, esta experiência poderá ser boa para perceberem o trabalho dos professores: “Se hoje os portugueses vão à janela aplaudir os profissionais de saúde, se calhar daqui a um mês vão estar a aplaudir os professores”, afirma.

Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde (DGS) elevou hoje número de casos confirmados de infeção para 448, mais 117 do que na segunda-feira, dia em que se registou a primeira morte no país.

O coronavírus responsável pela pandemia da Covid-19, que começou na China, em dezembro, e espalhou-se por mais de 145 países, infetou mais de 180 mil pessoas, das quais mais de 7.000 morreram.

Das pessoas infetadas em todo o mundo, mais de 75 mil recuperaram da doença.