Na habitual conferência dedicada ao ponto de situação da atual pandemia provocada pela Covid-19, Graça Freitas admitiu que perto de um terço dos 567 óbitos ocorridos em Portugal — número atualizado no boletim epidemiológico de hoje — ocorreu em lares destinados à terceira-idade.
No entender da diretora-geral da Saúde, este é um "padrão expectável" pois "os óbitos têm ocorrido principalmente em populações idosas e com múltipla patologia" e nos lares encontra-se normalmente esse grupo demográfico, tendo ainda o fator acrescido desta ser uma doença contagiosa e nestas instituições haver uma elevada concentração de pessoas.
No entanto, Graça Freitas recordou que a elevada mortandade nestes espaços podia ter sido evitada se fossem respeitadas duas regras impostas pelas autoridades de saúde desde o início da pandemia e que "que nem sempre estão a ser cumpridas". A primeira é a proibição de visitas aos lares, que "devia-se ter mantido, porque quem introduz a doença no lar são as pessoas que vêm do exterior” e a segunda é a “condição que qualquer novo utente residente para um lar devia não só ter um teste negativo, como ficar 14 dias em isolamento”.
Para tal, deviam também ter sido implementadas, desde logo, medidas preventivas. "Antes de acontecer um caso de Covid, deviam ter sido criadas nos lares, com a ajuda comunitária de cada local, condições para que a concentração de pessoas não fosse tão intensa, para que lares com uma densidade muito grande de pessoas pudessem ser desdobrados por mais do que uma estrutura para permitir isolamento social", defendeu a diretora-geral da Saúde.
No entanto, apesar desta incidência ser mais aguda nos lares, Graça Freitas voltou a defender que os idosos que vivam nestas instituições devem a elas regressar se não sofrerem de patologias que os obriguem a ficar internados. “Temos de ter a noção que os casos que sejam pouco graves devem permanecer em residência habitual e não ir para os hospitais onde devem ser atendidos doentes agudos, ou doentes mais graves com Covid", defendeu a diretora-geral da Saúde, recordando que tanto os profissionais de saúde nos lares como os centros de saúde locais estão destinados a proporcionar esses cuidados menos urgentes.
Vacinar para evitar males maiores
A conferência foi também marcada por um apelo que não se relaciona diretamente com a doença, mas que se baseou no seu contexto para recordar às pessoas uma responsabilidade que têm para a sua segurança e dos outros, a vacinação.
Graça Freitas recordou a necessidade de todos cumprirem o Programa Nacional de Vacinação, considerando-o "absolutamente essencial" para evitar outros surtos que não o atual da Covid-19. "Já temos uma epidemia, a última coisa que queremos é ter um surto por outra doença infecciosa", disse a diretora-geral da Saúde, recomendando "vivamente a vacinação nas idades mais importantes.”
Estas, disse, são os primeiros 12 meses de vida, onde se dá uma vacina que "confere precocemente proteção contra 11 doenças”, seguindo-se uma vacina "contra uma forma de meningite que pode ser grave" e outra contra "o sarampo, a papeira e a rubéola". Relativamente a esta última vacina, Graça Freitas recordou o retorno dos surtos de sarampo por falta de vacinação, inclusive numa fase já posterior ao aparecimento da pandemia por Covid-19.
Outros grupos prioritários à vacinação, recordou, são os doentes crónicos e as grávidas, sendo que estas "devem vacinar-se contra a tosse convulsa com o objetivo de proteger o seu bebé nos primeiros meses de vida” e esta vacinação "não deve ser adiada para além das 28 a 32 semanas de gestação”.
Recordando que "qualquer pessoa pode consultar o esquema vacinal na página da DGS e o seu boletim de vacinas através do portal do SNS”, a diretora-geral da Saúde concedeu que é preferível contactar a unidade de saúde por telefone e marcar a vacinação“ para evitar aglomerações de pessoas nesta fase.
No entanto, Graça Freitas frisou que, caso não seja possível marcar uma vacina, é imperativo ir na mesma às unidades de saúde, assegurando que "a vacinação e outros cuidados que exigem presença das pessoas se fazem em ambiente seguro para utentes não Covid", existindo circuitos exclusivos para utentes não sintomáticos da doença.
Questionada se este apelo tinha base numa menor taxa de vacinação registada nestes últimos meses, Graça Freitas disse que esses dados não estavam disponíveis, mas que a tendência noutros países onde a Covid-19 surgiu mais cedo foi essa.
Governo tem feito quase 18 mil testes por milhão de habitantes
Na abertura da conferência de imprensa, o secretário de Estado da Saúde revelou que Portugal realizou desde 1 de março “mais de 190 mil testes” à Covid-19 e que média de quase "10 mil testes por dia” faz o país aproximar-se de “uma taxa de quase 18 mil testes por milhão de habitantes”, o que, defendeu, supera "países como a Alemanha e a Áustria”.
No entanto, António Lacerda Sales referiu que "o aumento de testagens não se refletiu num aumento proporcional de testes positivos, o que é, garantidamente, um bom indicador” numa altura em que Portugal entra na "fase decisiva da nossa luta coletiva", pois é quando "as pessoas mais acusam o cansaço e a exaustão do confinamento”.
O secretário de Estado da Saúde, porém, recordou as palavras de António Costa, entrevistado hoje de manhã, defendendo que este "é o momento em que temos de ser mais resilientes”.
O secretário de Estado da Saúde pediu ainda aos portugueses para manterem a sua confiança no Serviço Nacional de Saúde, que "apesar da diminuição da atividade assistencial não urgente devido à pandemia", continua "a dar resposta ao que tem obrigatoriamente de ser respondido".
“Os doentes crónicos, oncológicos, cardíacos ou outros que sintam algum tipo de descompensação, devem recorrer ao seu médico assistente ou à linha Saúde 24. Em caso de necessidade de ida à urgência, a norma da DGS prevê a utilização de máscara cirúrgica em todas instituições de saúde e, portanto, garante a segurança”, afirmou António Lacerda Sales.
Há máscaras que vão ser reutilizáveis e há 200 empresas dispostas a produzi-las
Um exemplo dessa resiliência conjunta foi dado pelo facto de mais de 200 empresas terem manifestarado vontade de produzir “máscaras de utilização comunitária” contra a Covid-19 conforme as especificações do Infarmed — a serem publicadas hoje à tarde —, sendo que “algumas estão em condições de o fazer já esta semana”, apontou Lacerda Sales.
Mais especificamente, o presidente do Infarmed, Rui Ivo, indicou que as especificações vão permitir que saber "quais são as condições de proteção" que as máscaras produzidas asseguram, sendo também possível que algumas sejam "reutilizáveis".
Entre os materiais autorizados pela norma, está o algodão, o poliéster ou a combinação dos dois, podendo muitas das máscaras ser reutilizadas após lavagem.
Para tal, o conjunto de informações vai indicar "o nível de proteção, o nível de respirabilidade, quanto tempo pode ser utilizada, e em que condições pode ser reutilizada”, disse o responsável, apelando, porém, que dado o "esforço" que está a ser feito pela indústria nacional e os responsáveis de saúde, que é preferível que as pessoas utilizem estes equipamentos “com garantias” em vez de os produzirem em casa.
O anúncio da produção de máscaras surge com consequência pelo anúncio feito ontem pela Ministra da Saúde, Marta Temido, de que o uso de máscaras comunitárias em espaços fechados passou a ser recomendado pela DGS, que emitiu uma nota.
Questionado sobre a partir de quando será recomendado o uso generalizado de máscaras comunitários pela população em geral em espaços fechados, o secretário de Estado da Saúde, Lacerda Sales, remeteu para a reavaliação do estado de emergência, que será feito na quarta-feira.
“Quarta-feira vai ser feita uma reavaliação do estado de emergência, ainda não é a altura exata para nos podermos pronunciar sobre um conjunto de medidas que poderão ou não ser reavaliadas. Ao Ministério da Saúde compete, em função das decisões tomadas percorrer um percurso responsáveis e controlado, não fazendo concessões em termos de segurança”, afirmou.
O vírus não afeta o país da mesma forma
Relativamente à razão pela qual o norte do país tem sido a zona mais afetada pela pandemia, Graça Freitas recordou que "a dinâmica de uma doença infeciosa tem muito a ver com a quantidade de casos iniciais", o que aconteceu nessa região porque "desde o primeiro dia que houve uma grande concentração de casos importados" pelas pessoas que voltaram da Lombardia, na altura em que o surto começou nesta região italiana.
É por razões como esta que a diretora-geral da saúde indicou que a incidência do vírus "não é igual em todas as comunidades". "O vírus tem se organizado por focos, não há uma mancha contínua no território nacional. Ele tem transmissão comunitária, mas a comunidade pode ser um foco muito pequeno", disse Graça Freitas.
Tal é o caso de uma cidade como a de Ovar, onde foi aplicado um cordão sanitário no dia 19 de março. Repetindo as palavras da Ministra da Saúde, Graça Freitas recordou que este não será para já levantado, pois "enquanto o risco naquela comunidade for considerado elevado, sobretudo o de transitarem pessoas, as autoridades locais manterão essa medida". "Quando entenderem que está na altura de aliviar essas medidas, pois essa será a tendência natural, voltar o mais depressa possível à vida habitual”, completou a diretora-geral da Saúde.
Discrepância nos números de doentes nos cuidados intensivos e de casos infetados por concelho tem explicação
A aparente discrepância quanto aos números disponibilizados pela DGS nos seus boletins diários tem sido alvo de queixas recorrentes, tanto em relação ao número de doentes hospitalizados em unidades de cuidados intensivos (UCI), como em relação ao número de casos de infeção registados por concelho.
No que toca aos doentes internados, Lacerda Sales admitiu que “possa ter de haver sempre diariamente algum ajuste de números” pois “a capacidade do SNS em termos de UCI é expansível e depende muito do critério clínico" dos profissionais, sendo uma "realidade muito dinâmica” a entrada e saída de doentes nas áreas de ventiladores.
Já quanto aos números apresentados no boletim, Graça Freitas mencionou que a DGS apenas pode "reportar, escrever, e transmitir" os números que lhe são veiculados de fontes distintas. Os casos de infeção a nível nacional são recolhidos a partir das declarações dos "médicos que fazem o diagnóstico e que inscrevem na plataforma SINAVE o caso” e dos laboratórios, que quando "encontram casos positivos ou negativos, também reportam numa base da dados, a SINAVE Laboratório”. Já os óbitos são registados a partir das declarações de óbitos.
Quanto a estes dados, a diretora-geral da Saúde apelou a que o seu registo seja feito "o mais precocemente possível". "Só assim é que nós conseguimos ter os números o mais certos possível”, defendeu.
No entanto, no que toca ao nível concelhio ou distrital, a responsável explicou porque é que os dados às vezes diferem de boletim para boletim. Em causa está o facto de cada cidadão ter um endereço registado no Registo Nacional de Utentes, sendo esta "a sua morada oficinal no âmbito no Serviço Nacional de Saúde.” No entanto, "há um outro fator de correção, porque o médico pode declarar que a ocorrência não se deu naquela morada, mas noutro sítio”, sendo isto depois refletido.
A título de exemplo, Graça Freitas explicou que um doente com morada registada na região Norte, mas que tenha sido infetado no Algarve, vai, "para efeitos das autoridades de saúde, da vigilância epidemiológica, do acompanhamento desta situação", ser contada como um caso no Algarve. No entanto, se essa mesma pessoa morar em Lisboa (apesar da sua morada do registo ser no Norte), então "o delegado de Saúde local vai ser sinalizado que a pessoa lá está e que tem de ficar sob a sua vigilância".
“Como tudo isto acontece ao longo dos dias e nós vamos introduzindo correções no sistema, é normal que a nível local a capacidade de ter informação mais específica seja maior do que a nível nacional, sendo que as diferenças não são assim tão substanciais, porque a maior parte das pessoas tem uma residência que consta do Registo Nacional de Utente, adoece habitualmente no seu local de residência e é registada como tal", defendeu Graça Freitas.
Para salvaguardar situações futuras, a diretora-geral da Saúde disse que vai passar a constar do boletim uma nota metodológica que explica as diferenças, pedindo ainda assim “cuidado com os dados” para não se “criar disfunções nacionais, regionais e locais”.
Portugal regista hoje 567 mortos associados à Covid-19, mais 32 do que na segunda-feira, e 17.448 infetados (mais 514), indica o boletim epidemiológico divulgado pela DGS.
Relativamente a segunda-feira, em que se registavam 535 mortos, hoje observou-se um aumento percentual de 6% (mais 32).
De acordo com os dados, há 17.448 casos confirmados, mais 514, o que representa um aumento de 3% face a segunda-feira.
Novo coronavírus SARS-CoV-2
A Covid-19, causada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, é uma infeção respiratória aguda que pode desencadear uma pneumonia.
A maioria das pessoas infetadas apresentam sintomas de infeção respiratória aguda ligeiros a moderados, sendo eles febre (com temperaturas superiores a 37,5ºC), tosse e dificuldade respiratória (falta de ar).
Em casos mais graves pode causar pneumonia grave com insuficiência respiratória aguda, falência renal e de outros órgãos, e eventual morte. Contudo, a maioria dos casos recupera sem sequelas. A doença pode durar até cinco semanas.
Considera-se atualmente uma pessoa curada quando apresentar dois testes diagnósticos consecutivos negativos. Os testes são realizados com intervalos de 2 a 4 dias, até haver resultados negativos. A duração depende de cada doente, do seu sistema imunitário e de haver ou não doenças crónicas associadas, que alteram o nível de risco.
A covid-19 transmite-se por contacto próximo com pessoas infetadas pelo vírus, ou superfícies e objetos contaminados.
Quando tossimos ou espirramos libertamos gotículas pelo nariz ou boca que podem atingir diretamente a boca, nariz e olhos de quem estiver próximo. Estas gotículas podem depositar-se nos objetos ou superfícies que rodeiam a pessoa infetada. Por sua vez, outras pessoas podem infetar-se ao tocar nestes objetos ou superfícies e depois tocar nos olhos, nariz ou boca com as mãos.
Estima-se que o período de incubação da doença (tempo decorrido desde a exposição ao vírus até ao aparecimento de sintomas) seja entre 2 e 14 dias. A transmissão por pessoas assintomáticas (sem sintomas) ainda está a ser investigada.
Vários laboratórios no mundo procuram atualmente uma vacina ou tratamento para a covid-19, sendo que atualmente o tratamento para a infeção é dirigido aos sinais e sintomas que os doentes apresentam.
Onde posso consultar informação oficial?
A DGS criou para o efeito vários sites onde concentra toda a informação atualizada e onde pode acompanhar a evolução da infeção em Portugal e no mundo. Pode ainda consultar as medidas de segurança recomendadas e esclarecer dúvidas sobre a doença.
- https://covid19.min-saude.pt
- https://covid19.min-saude.pt/ponto-de-situacao-atual-em-portugal
- https://www.dgs.pt/em-destaque.aspx
Quem suspeitar estar infetado ou tiver sintomas em Portugal - que incluem febre, dores no corpo e cansaço - deve contactar a linha SNS24 através do número 808 24 24 24 para ser direcionado pelos profissionais de saúde. Não se dirija aos serviços de urgência, pede a Direção-Geral de Saúde.
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