Nas modernas instalações do INS em Marracuene, a 30 quilómetros da cidade de Moçambique, foram analisadas as primeiras amostras e confirmados os primeiros casos de covid-19 no país. Na terceira onda da doença, no pico da variante delta, a fase “mais terrível” em Moçambique, milhares de amostras eram ali processadas diariamente.
“Nós quase que dormíamos praticamente na instituição. Tivemos que desmontar alguns laboratórios para aumentar a capacidade que nós tínhamos e trazer todos os equipamentos de biologia molecular que utilizávamos para outras técnicas. Juntar e fazer uma autêntica fábrica onde processávamos milhares de amostras por dia. Posso garantir que foi um momento terrível”, recorda Eduardo Samo Gudo, promovido a diretor-geral do INS em março último, mas há vinte anos no instituto, nomeadamente como diretor-geral adjunto desde 2018.
Em entrevista à Lusa nos mesmos laboratórios outrora sob pressão, Samo Gudo, eleito este mês presidente do conselho consultivo do Centro de Controlo de Doenças de África (África-CDC), não tem dúvidas em realçar a “aprendizagem” obtida nesse período. “A covid-19 foi uma autêntica escola para o INS na área de respostas de emergência, de saúde pública e do contexto da patologia”, apontou.
Para o especialista, a covid-19 alertou para a necessidade de os países “investirem em tecnologia na área de saúde pública”, mas no caso de Moçambique o combate à pandemia beneficiou da experiência do país ao nível dos sistemas de vigilância de doenças.
“Porque a covid-19 é uma doença infecciosa e o maior peso de doença no nosso país é a doença infecciosa. Ou seja, nós temos uma experiência vasta em gerir doenças, surtos de epidemia, doenças infecciosas”, sublinhou.
“Nós já tínhamos o conhecimento geral sobre biologia, sobre imunologia, sobre epidemiologia e biologia molecular. Tínhamos as tecnologias disponíveis, não tínhamos era a experiência de trabalhar com este patógeno específico. A adaptação deste potencial todo que foi criado no INS durante muitos anos foi rápida. Foi só adequar o conhecimento geral já acumulado para uma doença específica, mas não foi uma tarefa fácil, obviamente”, explicou Samo Gudo.
Esta experiência permitiu que “rapidamente” o país “montasse capacidade para fazer a confirmação laboratorial” de casos de covid-19.
“E com base nesse conhecimento adquirido, transferimos para as províncias esta capacidade. Então, isso para mim foi uma das lições. No sentido que o país e a instituição têm que continuar a investir na área de ciência, tecnologia e inovação e tecnologia de ponta e continuar a gerar cientistas com conhecimento complexo nas suas várias vertentes”, reconheceu.
A pandemia de covid-19 deixou de ser o tema do dia, também em Moçambique, mas Samo Gudo sublinha que pela sua natureza no INS vive-se “de crise em crise” e “gerindo crises”.
“Saímos, é verdade, da crise da covid-19, mas logo entrámos em outras crises. Como o surto de cólera, que agora está controlado, e em breve vamos voltar a entrar na gestão da época ciclónica. Moçambique é um país que podemos dizer que já tem uma época ciclone definida, é quase uma certeza, hoje. E entre outras ameaças à saúde pública que são de menor dimensão, mas que todos os dias, todas as semanas, é necessário gerir surtos de pequeno médio, de média dimensão”, sublinhou.
“Então, nós estamos permanentemente no processo de gestão das crises de saúde pública. Mas a verdade é que a gestão da covid-19 foi uma situação sem precedentes, não só a nível mundial, a nível nacional, mas também a nível do nosso instituto. Mas também foi uma oportunidade. Foi uma oportunidade ímpar para nós aprendermos. E aprendemos muito e tirámos muitas lições que serão valiosas – já estão a ser valiosas – para a gestão das crises que nós enfrentamos subsequentemente”, concluiu.
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