"A votação na generalidade não é a votação final, mas é a votação da clarificação política. A votação sobre qual o caminho a seguir", declarou António Costa na parte final da sua intervenção na abertura de dois dias de debate na generalidade da proposta de Orçamento do Estado para 2021.

De acordo com o líder do executivo, perante esta proposta de Orçamento, "a posição da direita é clara" face às razões que invoca para o voto contra.

"A posição do PS é clara e totalmente coerente com as opções assumidas nestes cinco anos de governação. As posições do PCP, do PAN, do PEV, das deputadas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues são também muito claras e mostram que há quem não desista de encontrar soluções para a crise que enfrentamos. Iremos continuar a trabalhar com humildade democrática, seriedade e espírito de compromisso para em sede de especialidade melhorarmos, com os seus contributos, a proposta que apresentamos", declarou o primeiro-ministro.

Neste ponto referente aos trabalhos na especialidade, António Costa não fez qualquer referência ao Bloco de Esquerda - força política que já anunciou o seu voto contra a proposta orçamental do Governo na generalidade.

Na parte mais política da sua intervenção, o primeiro-ministro procurou traçar uma linha de demarcação ideológica face ao PSD, CDS, Iniciativa Liberal e Chega, mas também visou indiretamente o Bloco de Esquerda "por se juntar à direita" na votação desta quarta-feira.

Na perspetiva de António Costa, "as propostas de Orçamento não são anódinos exercícios tecnocráticos, inodoros e incolores", sobretudo, porque "assentam em opções políticas, determinadas por valores e distintas visões da sociedade".

Por isso, para o líder do executivo, o presidente do PSD, Rui Rio, "tem, razão quando diz que este é um Orçamento de distribuição solidária".

"Esta proposta não é exceção e dá naturalmente continuidade, sem qualquer recuo ou interrupção, à mudança que iniciámos há cinco anos, ao virar a página da austeridade para permitir mais crescimento, melhor emprego, maior igualdade, com contas certas. Agora, como então, a crise não se enfrenta com austeridade. Agora, como então, é necessário valorizar os rendimentos, aumentar o investimento, reforçar os serviços públicos", defendeu.

Por isso, para o primeiro-ministro, "não surpreende a oposição da direita, encabeçada pelo PPD-PSD, a um Orçamento que valoriza os rendimentos das famílias e o investimento público como motores da recuperação económica e que elege o reforço do SNS (Serviço Nacional de Saúde) como a prioridade no combate à pandemia".

"Em democracia, há sempre alternativas e a sua vitalidade reforça-se com a clareza da sua afirmação", sustentou.

Depois, deixou uma mensagem crítica dirigida ao Bloco de Esquerda, mas sem citar esta força política: "É claro que é possível defender que devemos ser mais ousados a avançar no caminho que este Orçamento traça, procurando superar limitações ou insuficiências".

"O que não é possível é pretender querer ir mais longe ou mais rápido por este caminho, juntando-se agora à direita que marcha em sentido oposto", acrescentou, recebendo uma prolongada salva de palmas dos deputados da bancada socialista.

Costa volta a afastar demissão e afirma que Governo enfrentará “tormenta” da crise

"Vivemos desafios únicos que estou certo nunca nenhum de nós imaginou ter de enfrentar", declarou António Costa no final da sua intervenção na abertura do debate na generalidade da proposta de Orçamento do Estado para 2021.

Neste contexto, António Costa decidiu reafirmar o que disse há um ano quando tomou posse do XXII Governo Constitucional.

"O compromisso que selámos com os portugueses não está dependente de ciclos económicos. Este é um Governo para os bons e para os maus momentos. Não viraremos as costas às dificuldades. E quanto maior for a tormenta, maior será a nossa determinação em ultrapassá-la", declarou o líder do executivo

Antes, o primeiro-ministro tinha defendido que a proposta de Orçamento "não corta rendimentos, protege os rendimentos das famílias e protege mais as famílias de menores rendimentos".

"Não reduz o investimento público, aumenta-o para responder em contraciclo à contração da economia. Não se conforma com a quebra da procura e apoia as empresas para vencerem a crise. Não se rende à fatalidade da destruição de postos de trabalho e protege o emprego", acrescentou.

Só com orçamento aprovado não haverá "um cêntimo" público no Novo Banco

No arranque do debate na generalidade da proposta orçamental no parlamento, o presidente do PSD, Rui Rio, optou por questionar Costa sobre dois temas não abordados pelo primeiro-ministro na sua intervenção inicial, a TAP e o Novo Banco, que considerou “nevrálgicos” para os próximos anos.

“Segundo o contrato de compra e venda do Novo Banco, este pode pedir ainda 900 milhões de euros ao Estado para o compensar as perdas. Este orçamento prevê apenas 477 milhões de euros”, afirmou.

Rui Rio questionou então o primeiro-ministro como agirá se o Novo Banco chegar a meio do ano e vier a pedir os 900 milhões de euros ainda previstos no contrato.

“Paga, mesmo antes de se concluir a auditoria do Tribunal de Contas que nos vai dizer se as perdas que pagámos eram justas ou fabricadas? E se sim como faz, já que já não tem dinheiro no Orçamento do Estado?”, perguntou.

António Costa remeteu a resposta para a decisão do parlamento sobre a proposta do Orçamento do Estado para 2021.

“Se o OE para 2021 for aprovado, há duas garantias: o Estado não emprestará um cêntimo ao Fundo de Resolução. Segundo, o Fundo de Resolução não pode injetar mais do que esses 400 e tal milhões de euros no Novo Banco”, defendeu Costa.

Por outro lado, acrescentou, se o documento for rejeitado manter-se-á um regime de duodécimos do Orçamento do Estado de 2020, “quer permite que o Estado empreste ao fundo de resolução 800 milhões de euros”.

 SNS vai dispor de mais de 12 mil milhões de euros, afirma António Costa

A saúde foi o primeiro tema do discurso proferido por António Costa na abertura do debate na generalidade do Orçamento do Estado para 2021 - área que, no plano político, constituiu um dos principais focos de divergência entre o Governo e o Bloco de Esquerda nas negociações para a viabilização da proposta orçamental do executivo.

Apesar de os bloquistas já terem anunciado o voto contra na generalidade, o líder do executivo falou de avanços alcançados nestas negociações com o PCP, PAN, PEV e também com o Bloco de Esquerda.

"Após um crescimento faseado de 1,4 mil milhões de euros do Orçamento do SNS entre 2015 e 2019, depois de um aumento histórico de 850 milhões de euros da dotação inicial de 2020, logo seguido de um reforço extraordinário de mais 400 milhões no Orçamento Suplementar aprovado em julho, propomos agora um novo aumento de mais de 805 milhões de euros do orçamento do SNS para 2021, que assim disporá de um total de 12,1 mil milhões de euros", referiu.

António Costa disse que haverá "um reforço, em termos líquidos, de mais 4.200 profissionais para o SNS e a contratação de 260 para o INEM, mas também a possibilidade de se dispor dos recursos necessários para continuar a aumentar a capacidade de testagem e adquirir as ansiadas doses de vacina, que se espera poderem estar disponíveis no próximo ano".

"O Governo vai criar um subsídio extraordinário de 20% do salário, até ao limite de 219 euros, para todos os médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico, assistentes técnicos e operacionais e outros profissionais de saúde que estão em contacto direto com os doentes covid-19. Por outro lado, temos de reforçar a proteção social de todos os que, como efeito direto da pandemia ou das medidas de combate à sua propagação, perderam o emprego, sofrem quebras abruptas da sua atividade ou são vítimas das múltiplas formas de desregulação das relações de trabalho que minam a nossa coesão social, de modo a garantir que não deixamos ninguém para trás", disse, aqui numa alusão ao novo apoio social - outra medida que está na base das divergências entre Governo e Bloco de Esquerda..

O primeiro-ministro defendeu mesmo que a proposta de Orçamento "prevê um conjunto de medidas de proteção social que o diálogo que o executivo tem mantido com o BE, o PCP, o PAN e o PEV permitiu aprofundar", dando como exemplos "a dignificação estrutural da proteção no desemprego para quem ao longo da vida descontou sobre o seu salário, com o aumento do limite mínimo do subsídio de desemprego para um montante que será sempre superior ao limiar da pobreza, ou seja, 504 euros".

Neste ponto, o líder do executivo, apontou também "a majoração do subsídio social de desemprego para o valor do limiar de pobreza, por forma a mitigar os efeitos da pobreza entre os desempregados", assim como a "criação de uma nova prestação social extraordinária que protege do risco de pobreza os trabalhadores por conta de outrem - não cobertos pelo subsídio de desemprego ou pelo subsídio social de desemprego - trabalhadores independentes, trabalhadores do serviço doméstico, trabalhadores informais e sócios gerentes de micro empresas".

Já em resposta às críticas do PSD, o primeiro-ministro contrapôs que o Governo prossegue "a estratégia de apoio às empresas, desde logo, na manutenção dos postos de trabalho, através das medidas de apoio ao emprego e à retoma, com um custo estimado superior a 900 milhões de euros no próximo ano".

"Apoio às empresas, também, na eliminação do agravamento das tributações autónomas para as pequenos e médias empresas que em 2020 tenham prejuízos, bem como no prolongamento do crédito fiscal ao investimento, para que as empresas não tenham de adiar os seus projetos de modernização ou expansão. E ainda na extensão da moratória sobre os créditos bancários e na promoção de novas linhas de crédito com garantias de Estado até ao montante de seis mil milhões de euros", acrescentou.

*Artigo atualizado às 16h05