Ricardo Sá Fernandes, mandatário do arguido Bruno Sousa, insistiu durante as alegações finais que o veredicto do julgamento deveria ser absolvição do trio de inspetores chamados na manhã de 12 de março de 2020 para algemarem Ihor, mas face ao repto dos juízes de converter a acusação de homicídio qualificado (pena até 25 anos de prisão) em ofensa à integridade física grave, agravada pelo resultado (morte), sugeriu ao tribunal uma terceira opção, que não deixa de ser punitiva.

Assim, face às circunstâncias do caso, em que Ihor passou toda madrugada a ser atado com fita adesiva pelos vigilantes das instalações do SEF e sofrendo outros maus tratos – padecendo a vítima da síndrome de abstinência alcoólica, que potencia outras causas de morte, perante a falta de procedimentos válidos na realização da autópsia e face à ausência de provas de que Ihor foi agredido pelos acusados, Ricardo Sá Fernandes considerou, no limite, admissível que o tribunal puna os arguidos, mas por ofensa à integridade física não grave, com pena até 4 anos de prisão.

Nas alegações finais do julgamento que, quer Ricardo Sá Fernandes quer Maria Manuel Candal (defensora de Luís Silva) salientaram que muitas das testemunhas ouvidas em julgamento – vigilantes e outros inspetores do SEF – e que vieram incriminar os acusados, também eles deveriam ter sido constituídos arguidos no processo, sendo que alguns desses inspetores inquiridos como testemunhas em tribunal são alvos de processos disciplinares, pelo que lhes convinha “mentir” e ocultar as suas co-responsabilidades pelo sucedido.

Segundo Ricardo Sá Fernandes só por “manha processual” ou “negligência” tais vigilantes e inspetores arrolados como testemunhas não foram constituídos arguidos no processo, pelo que produziram uma “prova mentirosa” e contaram falsidades sob pena de futuramente virem também a serem incriminados pelo “lamentável” caso ocorrido com o passageiro ucraniano.

De acordo com o advogado, uma das mentiras ditas em julgamento por uma testemunha foi a de que “ouvir gritos agoniantes” de Ihor vindo da sala onde o passageiro ucraniano estava a ser algemado pelos três inspetores sob ordens de superiores hierárquicos, os quais também escaparam a qualquer responsabilidade apesar de exercerem funções de direção e coordenador de turno no SEF.

“Estas testemunhas valem zero”, enfatizou Ricardo Sá Fernandes, que lamentou sobretudo que o tribunal não permitisse a audição de uma perita médico-forense, por forma a avaliar com maior profundidade os erros e os lapsos cometidos na realização da autópsia pelo médico Carlos Duro, que nem sequer tirou fotografias das fraturas nas costelas do cadáver de Ihor.

O advogado insistiu que o trio de inspetores não tinha qualquer motivo para agredir Ihor e que a fratura das costelas do cidadão ucraniano pode ter resultado quer da atuação dos vigilantes, que o ataram de pés e mãos com fita adesiva durante a madrugada, quer das manobras intensivas de reanimação, que duraram cerca de 50 minutos.

Ricardo Sá Fernandes e Maria Candal destacaram também a síndrome de abstinência alcoólica de que Ihor sofria, tendo a advogado concluído as suas alegações dizendo estar convicta de que a morte do ucraniano teve “causa natural” resultante de convulsão e paragem cardiorrespiratória e não de quaisquer agressões dos acusados.

Alegações finais da defesa decorrem com a intervenção final de Ricardo Serrano, advogado do arguido Duarte Laja, que também está a colocar em dúvida o depoimento das testemunhas de acusação e a criticar a atuação dos vigilantes que ataram Ihor de mãos e pernas com fita adesiva durante quase toda a madrugada, antes de qualquer intervenção dos acusados, cerca das 08:00 de dia 12 de março de 2020.

“Não se pode passar uma esponja” sobre isto, alegou o causídico, que também reclama a inocência dos três inspetores.

Durante as suas alegações, Ricardo Serrano deu a entender ter a informação que, à margem deste processo, o Ministério Público já terá aberto inquérito para averiguar o comportamento e a atuação dos vigilantes durante a longa permanência da vítima nas instalações do SEF.

Nas alegações iniciadas hoje de manhã, o advogado da família de Ihor Homeniuk pediu a condenação dos três inspetores desta força de segurança pelo crime de homicídio qualificado que consta da acusação.

José Gaspar Schwalbach discordou da eventual conversão pelo tribunal do crime de homicídio qualificado de que os inspetores estão acusados num crime de ofensa à integridade física qualificada, agravada pelo resultado (morte).

Mais benevolente, o MP aceitou essa alteração da qualificação jurídica dos factos para um crime menos grave, mas mesmo assim pediu a condenação dos inspetores a penas de prisão entre os 8 e os 16 anos, salientando que Ihor Homeniuk morreu por asfixia lenta, na sequência de agressões a pontapé e com bastão dos arguidos que lhe causaram fratura de oito costelas, e pelo facto de ter sido deixado algemado com as mãos atrás das costas e de barriga para baixo, com dificuldade em respirar.

Tendo em conta o grau de culpa de cada um dos inspetores do SEF acusados, a procuradora Leonor Machado pediu, nas alegações finais do julgamento, para os arguidos Duarte Laja e Luís Silva uma condenação dentro de uma moldura penal entre 12 e 16 anos de prisão, mas de preferência não inferior a 13 anos.

Quanto ao arguido Bruno Sousa, a procuradora entendeu que o seu grau de culpa foi menor, por ter sido influenciado pelos restantes arguidos, pedindo uma condenação a uma pena de prisão não inferior a oito anos.

Dois dos arguidos (Duarte Laja e Luís Silva) respondem também pelo crime por posse de arma ilegal (bastão).

Segundo a procuradora, ficou “demonstrado pela autópsia que as agressões foram feitas com pontapés e agressão com bastão”, frisando que um desses pontapés, desferido com “muita energia”, na zona do tronco, provocou a fratura de oito arcos costais.

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