O processo de revisão da lei de bases do ordenamento e da gestão do espaço marítimo nacional partiu de numa iniciativa da Assembleia Legislativa Regional dos Açores e foi já aprovado hoje em sede de espacialidade na Assembleia da República.

Este diploma estará em discussão na reunião de quinta-feira de manhã do Grupo Parlamentar do PS, horas antes de ser sujeito a votação final global no último plenário da presente sessão legislativa.

Em declarações à agência Lusa, a deputada socialista e ex-ministra do Mar Ana Paula Vitorino afirmou que tenciona defender que o diploma não seja votado já na quinta-feira em plenário, caso contrário irá opor-se, apresentando com um conjunto de deputados uma declaração de voto sobre a matéria.

Acompanham Ana Paula Vitorino nesta posição de crítica ex-membros do Governo como Marcos Perestrello, Ascenso Simões ou Jorge Lacão, o constitucionalista Pedro Bacelar de Vasconcelos, o presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Sérgio Sousa Pinto, e o ex-presidente da Associação Nacional de Freguesias Pedro Cegonho.

“Na reunião do Grupo Parlamentar do PS, na quinta-feira, vamos solicitar o adiamento desta matéria, e sabemos que o PSD também está aberto a essa questão. No caso de isto ser levado a votação, mantendo-se a intenção do Grupo Parlamentar do PS de votar favoravelmente essa mudança da lei, este grupo de pessoas apresentará uma declaração de voto”, referiu.

A ex-ministra do Mar considerou significativo que este grupo de deputados – onde se incluem especialistas em Constituição da República, ou deputados que já tiveram responsabilidades governamentais em áreas como a Defesa Nacional, os Negócios Estrangeiros ou o Mar – “conclua que o diploma está ferido de vários vícios”.

“Pretende-se transformar o mar português no somatório de três mares: o dos Açores, o da Madeira e o do continente. Desde logo, no plano político, passam a existir dificuldades óbvias de coordenação, prejudicando a existência de um plano estratégico e de ação para todo o mar”, sustentou a ex-ministra.

Ana Paula Vitorino considerou também que o diploma, tal como se encontra, “está ferido de inconstitucionalidade, porque remete o ordenamento e a gestão do espaço marítimo até às 200 milhas para a exclusiva responsabilidade e iniciativa das regiões autónomas”.

“Vou citar o que consta no diploma: ao Governo da República caberá exclusivamente a emissão de um parecer no caso de serem questões de soberania e de integridade territorial – algo que o próprio diploma não define o que é. Portanto, tudo quanto é rendimento económico, relações com o exterior, o Governo da República será arredado de qualquer participação”, apontou a deputada socialista eleita pelo círculo do Porto.

Interrogada pela agência Lusa se terá influenciado neste processo o facto de o atual ministro do Mar, Ricardo Serrão Santos, ser dos Açores, Ana Paula Vitorino recusou-se a fazer considerações de ordem pessoal.

“Esta é uma questão de soberania na sua essência. Estamos a falar daquilo que vamos fazer com o nosso mar. Estamos a falar do núcleo duro do nosso futuro. Por isso, este tipo de questão não se compadece com regionalismos. O mar não é exclusivamente de interesse regional é, sobretudo, uma questão estratégica nacional”, acentuou a ex-ministra.

Na perspetiva de Ana Paula Vitorino, dos pontos de vista político e jurídico “estas alterações podem fazer arredar o Governo da República de qualquer decisão”.

“Estamos perante mudanças na lei com um caráter inconstitucional e inaceitáveis politicamente”, acrescentou.