Em declarações à agência Lusa, Nabil Abuznaid salientou que os palestinianos “acreditam na democracia” e que o Hamas, considerado terrorista pela União Europeia e Estados Unidos, “faz parte desses palestinianos”, mas que, tal como em todos os países, “há uma oposição e uma corrente dominante, uma direita e uma esquerda”.
“Tentámos que a ANP [Autoridade Nacional Palestiniana] avançasse para a paz. Assinámos um acordo de paz com Israel. Reconhecemos Israel e o que aconteceu? [Itzhak] Rabin [o quinto primeiro-ministro de Israel, de 1974 a 1977, e de 1992 até ao seu assassínio em 1995] foi morto, Israel ocupou ou confiscou sete vezes mais terras do que as que tinha antes de [os acordos de paz assinados com a Organização para a Libertação da Palestina, então liderada por Yasser Arafat, em] Oslo”, sustentou Abuznaid.
“O Hamas diz que não somos estúpidos para acreditar nos israelitas. Perderam mais terras, [foram alvo de] maior opressão e não conseguiram nada para os palestinianos no acordo de paz. Por isso, devemos seguir um caminho diferente, que os israelitas talvez compreendam, que é a luta de resistência. De acordo com o direito internacional, as pessoas têm o direito de resistir à ocupação”, justificou o diplomata.
Abuznaid lembrou que, na História, nunca os povos em conflito obtiveram a liberdade através de uma carta no correio.
“Em que país da História as pessoas obtiveram a sua liberdade através de uma carta numa caixa de correio. As pessoas tiveram de lutar pela liberdade. Têm de a merecer. Os israelitas têm um bom apetite pelas terras e não as vão deixar. O que é que podemos oferecer ao nosso povo agora?”, acrescentou.
Questionado pela Lusa sobre qual o futuro de uma governação na Faixa de Gaza após o final de um conflito em que não se perspetiva qualquer solução a curto prazo, Abuznaid afirmou não acreditar que o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, a pare até atingir o objetivo de acabar com a resistência palestiniana.
“Penso que Netanyahu está a tentar marcar mais pontos, a matar mais palestinianos, mas penso que a atitude do mundo mudou, sendo exemplo disso as manifestações de apoio [à causa palestiniana] nos Estados Unidos, que estão a dificultar as coisas a [Joe] Biden”, Presidente norte-americano, avisou.
“Penso que Netanyahu tem de compreender que não pode ir mais longe, que tem de parar. Mas o que está a dizer é que vai intensificar os ataques a Gaza”, acrescentou.
Instado pela Lusa a comentar as críticas que têm como alvo a própria ANP, sobretudo pelo papel pouco ativo que tem demonstrado no conflito na Faixa de Gaza, Abuznaid desdramatizou-as.
“A Autoridade Palestiniana está a tentar fazer o seu melhor para não arrastar a Cisjordânia para as mãos de Netanyahu. Netanyahu está a tentar empurrar as pessoas de Gaza para o Egito ou para o Sinai, está a tentar criar uma zona tampão no norte de Gaza, está a tentar livrar-se dos palestinianos”, afirmou.
“Conhecemos o comportamento dos colonos que se encontram na Cisjordânia, que são apoiados pelo exército israelita e que estão a tentar aumentar a violência na Cisjordânia, para que Netanyahu tenha uma desculpa para matar mais palestinianos ou para nos empurrar para a Jordânia”, país vizinho, acrescentou.
Abuznaid recusou terminantemente a possibilidade de Israel vir a governar a Faixa de Gaza e a própria Cisjordânia, defendendo que a “ocupação” israelita, que data de 1967, tem de acabar, pois não é Telavive que determina quem pode exercer o poder nos dois territórios.
“A Faixa de Gaza e a Cisjordânia são zonas palestinianas. Isso é reconhecido pela comunidade internacional. Este é o nosso país. Está ocupado por Israel. Não é outra pessoa que nos pode dizer quem o vai governar. Esta é uma terra ocupada em 1967 por Israel. O mundo inteiro diz que é uma terra palestiniana. Deveria fazer parte do Estado palestiniano. Portanto, não cabe a Netanyahu dizer isso”, frisou.
Sobre se vê qualquer possibilidade de reconciliação entre o Hamas e a Fatah, divididos desde 2007, Abuznaid admitiu que “tudo é possível”, mas que tem de se contar com o interesse dos palestinianos.
“Tudo é possível com o interesse dos palestinianos. Estamos em tempo de guerra e devemos estar unidos. Mas acreditamos, enquanto ANP, em negociações pacíficas. A questão que se coloca agora aos israelitas é se estão dispostos a reconhecer os palestinianos? Esta é a questão. Quais são as fronteiras de Israel? Israel é o único Estado? Não declara as suas fronteiras? Têm de dizer que aceitam as fronteiras de 1967. Aí, o Hamas estará a bordo”, respondeu.
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