Elisa Ferreira Vieira é a única especialista da área na Unidade Local de Saúde (ULS)do Nordeste, que trabalha sozinha há 23 anos com crianças e jovens dos 12 concelhos do distrito de Bragança.
A pedopsiquiatra tem mais de mil utentes, que já começou a encaminhar, pois vai aposentar-se, como explicou hoje, e “a área da saúde mental infantojuvenil vai ficar a descoberto”, vaticinou, apontando “as carências em termos de técnicos diferenciados em todo o interior do país”.
Os especialistas não querem sair dos grandes centros, que conseguem conter os poucos que existem, e para aqueles que necessitam de apoio nesta região avizinham-se dificuldades acrescidas às que já existem, como ficou expresso no seminário sobre “Saúde Mental e interioridade”, em Mirandela.
Elisa Ferreira Vieira lembrou que ao longo dos 23 anos que está em Bragança, nunca teve “uma equipa multidisciplinar”, como manda o Plano Nacional de Saúde Mental que, desde 2004, recomenda uma equipa com 11 profissionais de diferentes valências ligadas à especialidade, mas está funcionar com “uma pedopsiquiatra, uma psicóloga a meio tempo e uma assistente social a muito menos que meio tempo”.
“A equipa que tenho é muito reduzida. Fazemos o que podemos e o que não podemos. Muitas vezes, vamos na nossa viatura própria fazer abordagens familiares a casa dos utentes”, apontou.
O que a médica está já a fazer é a “reencaminhar os utentes que estão a atingir os 18 anos para os colegas de psiquiatria”
Os outros terão de ser encaminhados depois para Vila Real e até para o Porto, os serviços de pedopsiquiatria mais próximos, a centenas de quilómetros para muitos habitantes do Nordeste Transmontano.
“O que complica muito, porque esta crise económica está cada vez pior. Ao nível de transportes, existe a camioneta da manhã e da tarde, se perdem uma já vai acrescer o custo de uma ida à consulta”, concretizou.
Como explicou, “existem aquelas terapias que às vezes são de 15 em 15 dias, ou até mesmo semanais, que se tornam insuportáveis”.
“Há algumas famílias, hoje em dia, que recorrem ao nosso serviço. Posteriormente a já terem sido vistas e feito terapias em Gaia, no Porto, Coimbra, vêm para Bragança porque não dá, porque fica muito dispendioso”, acrescentou.
As alterações de comportamento são o maior número de casos com que esta especialista lida em Bragança, onde se concentra o serviço, com a deslocação uma vez por mês a Mirandela, para atenuar o problema das distâncias aos utentes.
É que, como disse, apesar dos melhoramentos a nível de acesso, “há muitas aldeias, no distrito de Bragança, até mesmo no concelho de Bragança, que só têm transporte público no tempo de aulas e, quando os meninos estão de férias, não têm como ir à consulta”.
As carências na área da Saúde Mental nesta região são também extensíveis a outras faixas etárias, como observou da plateia do seminário Teresa Fernandes, a responsável pelo Núcleo de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica do Distrito de Bragança.
A técnica apontou as “demoras de um mês” para conseguir uma consulta de psiquiatria para as vítimas e o problema de as seguintes serem “demasiado espaçadas”.
O presidente da ULS do Nordeste, Carlos Vaz, não quis falar à Comunicação Social. No discurso na sessão de encerramento do seminário reconheceu que a saúde mental “sempre foi o parente pobre da saúde” e preferiu realçar que, apesar das dificuldades em conseguiu atrair especialistas, acabou de receber a notícia da contratação de mais três médicos de família.
O seminário foi promovido pela MATIZ- Associação para a Promoção da Saúde Mental criada há um ano, em Mirandela, para dar “respostas terapêuticas e outros serviços, que não se substituem aos médicos e respostas públicas, mas são ações complementares”, como explicou a presidente, Sara Araújo.
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