Nos últimos meses, os bares Nutella ("Nutella Bars"), uma rede de cafeterias que vende crepes e waffles recheados com o bem conhecido creme de avelãs e cacau, multiplicaram-se em Teerão. Teoricamente, o uso de palavras estrangeiras é proibido no comércio, mas a verdade é que é relativamente fácil encontrar no Irão, e sobretudo na capital, Teerão, várias referências ocidentais, sem que isso tenha constituído qualquer problema. A mesma sorte não tiveram os Nutella Bars.

"Infelizmente, lugares chamados Nutella Bar têm se espalhado ultimamente em Teerão", escreveu o presidente da Academia da Língua e Literatura Persa, Golamali Hadad Adel, numa carta enviada à polícia. Estes estabelecimentos servem "pão especial (em referência aos crepes e waffles) com chocolate e gelado", razão pela qual a academia propôs que fossem baptizados como 'nane dagh chocolate dagh' (pão quente, chocolate quente).

Os comerciantes foram obrigados a retirar os letreiros "Nutella Bar", mas não está claro se  vão adotar a proposta da academia. Um deles, por exemplo, preferiu utilizar o nome "Nubella Art", ou seja, as mesmas letras de "Nutella Bar" em ordem diferente.

Há vários anos que a academia propõe com alguma frequência nomes em persa para lutar contra a influência do inglês, mas nem sempre tem sucesso. Em vez da palavra "helicóptero", por exemplo, cada vez mais pessoas utilizam "balgard", que significa "asa giratória" em persa. Mas quase ninguém, além da televisão pública e da Administração, usa "durnegar" (receptor de mensagem distante) em vez de "fax", nem "rayaneh" (máquina de organização) em vez de "computer" - computador em inglês.

Séculos de pressão

Embora legalmente os comerciantes não tenham o direito de usar nomes estrangeiros, esta norma é amplamente violada, e os recém-chegados muitas vezes são surpreendidos com a quantidade de palavras em inglês que aparecem ao lado do persa em espaços públicos - desde placas de rua e outdoors até fachadas de lojas.

Considerando o grande número de lojas sem licença de marcas ocidentais como Levi's, Apple e IKEA em cidades iranianas - que operam na república islâmica isoladas sem permissão das empresas oficiais - não está claro por que os Nutella Bar são o alvo da Academia.

Alguns especialistas sugerem, porém, que a palavra "bar" pode ser parte do problema, num país onde o álcool é ilegal. "O persa tem estado sob pressão contínua de influências estrangeiras, principalmente do árabe, há séculos", afirma à AFP Mohamad Ali Zamani, professor de história da Universidade Kharazmi em Teerão. "Às vezes, as suas decisões não são cuidadosamente consideradas (...), mas a Academia está a procurar preservar a criatividade do nosso idioma", acrescenta.

Com a conquista muçulmana do século VII, os iranianos adotaram o alfabeto árabe, mas preservaram a sua língua indo-europeia, o persa, principalmente graças ao poeta Ferdowsi, do século X, que usou apenas palavras em persa nos 60.000 versos do seu livro "Shahnameh" (Livro dos reis).

A Academia nasceu nos anos 20 do século XX, quando o rei Reza Shah, fundador da dinastia Pahlavi (derrocada em 1979 com a revolução islâmica), ordenou a substituição de muitas palavras árabes e francesas que eram usadas na época.

Depois da revolução islâmica de 1979, as palavras árabes tornaram-se mais aceites oficialmente, com os novos líderes religiosos do país a inserir com orgulho a linguagem do Alcorão nos seus discursos.

"A luta contra a ocidentalização da língua tem raízes históricas profundas", afirma Zamani. "É essencial preservar a língua persa pela sua riqueza histórica e pelo tesouro da sua literatura".

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