Em entrevista à Rádio Renascença e ao Público, questionado sobre a falta de reconhecimento de erros de avaliação e de tempos de reação, Eduardo Cabrita argumentou que se tratou de um “tempo muito especial, em pleno estado de emergência”, e que usou a expressão "murro no estômago" e teve uma reação imediata.

Relembrou ainda que houve uma “declaração de morte natural”, com base numa declaração médica, e que depois de ter sido comunicado ao Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) que não teria sido assim, foram verificadas cinco detenções, competência da Polícia Judiciária, e foi aberto o inquérito do Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) e cinco processos imediatos.

"Eu cometo erros, quer de tempo quer de avaliação. Mas no contexto do que era possível fazer face à tragédia com que fomos confrontados, o essencial foi feito a dia 30 [de março]", afirmou.

No dia em questão, depois de a Polícia Judiciária (PJ) ter detido três inspectores por indícios da prática do crime de homicídio, o diretor e o subdiretor da Direção de Fronteiras de Lisboa do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) demitiram-se e o Governo determinou a abertura de um inquérito, dirigido pela Inspeção-Geral da Administração Interna.

Questionado ainda sobre se ponderou demitir-se durante o processo, Eduardo Cabrita referiu que o único dia em que essa questão se poderia ter colocado teria sido em 30 de março, mas que não faria sentido enquanto coordenador da resposta do estado de emergência, abandonar o combate.

No caso da indemnização, reiterou que deve ser conjugado com o “ritmo da evolução do processo criminal” e comparou a situação com a morte ao serviço do Estado de militares dos comandos, referindo que ocorreu há dois anos e que “a indemnização foi agora”.

Sem adiantar mais sobre a demissão da diretora do SEF, o ministro admitiu que poderia ter sido mais cedo, mas “nem o processo-crime nem o processo disciplinar a envolvem”.

“O local onde ocorreu a tragédia foi imediatamente fechado, foi imediatamente reestruturado, quer com a intervenção da Inspeção-geral do Ministério quer da Provedoria de Justiça. Depois, há o que está no programa do Governo sobre a reestruturação do SEF. Manifestamente a diretora nacional não tinha o perfil para acompanhar o tempo da reestruturação”, justificou Eduardo Cabrita.

No que diz respeito ao futuro da ex-diretora, o ministro assumiu que caberá à direção do SEF a decisão, uma vez que ainda é funcionária, e que o cargo de Londres é “rigorosamente uma não questão” e que tal “nunca esteve na mesa”.

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Já visando a reestruturação do SEF, remeteu o programa do Governo –“um clarificador do que se disse antes de novembro de 2019 e claramente antes de março de 2020” – e salientou que nunca se falou em “extinção do SEF” ou fusões, mas sim de uma clara separação orgânica entre as funções policiais e administrativas.

As funções policiais implicam “uma redefinição do quadro do seu exercício, o controle de fronteiras aéreas, terrestre e marítima, investigação criminal como tráfico de seres humanos ou auxílio à imigração ilegal, entre os quatros órgãos de polícia criminal que atuam nesta área, SEF, PSP, GNR e PJ” e na área administrativa “a emissão de vistos, de autorizações de residência, renovações de autorizações de residência”, reforçando a dimensão de intervenção humanista.

“O programa do Governo estabelece duas coisas essenciais: por um lado, um caminho de serviços partilhados de forças de segurança. Isso não significa que vamos fundir a PSP com a GNR, mas vamos pôr em comum tudo o que são funções de suporte: a logística, as tecnologias, a área administrativa, libertando as forças de segurança para a sua dimensão operacional. E uma maior especialização”, explicou.

Detalhando um pouco mais as alterações, referiu que “a PSP será cada vez mais uma polícia das cidades e a GNR será a força operacional da coesão territorial, da vigilância costeira”.

Questionado sobre o motivo pelo qual apenas enviou agora para a Ordem dos Médicos o processo do médico que verificou o óbito do cidadão ucraniano, Eduardo Cabrita considerou que a pergunta deveria ser outra, sugerindo que deveria ser perguntado ao bastonário da Ordem, “uma vez que toda a gente sabe tudo desde abril” e relembrou também que o IGAI não tem competência disciplinar sobre médicos e enfermeiros.

No que concerne aos botões de pânico, considerou a expressão “infeliz” e remeteu a questão para provedora de Justiça para esclarecimento do “quadro em que essa figura é acompanhada”, mas afirmou que a responsabilidade política é sempre do Governo e que o objetivo era ter um quadro que permitisse “um pedido de apoio de alguém que está num espaço confinado e que possa não falar uma das línguas que esteja disponível”.

Na entrevista, Eduardo Cabrita reiterou que as declarações do diretor nacional da PSP, Magina da Silva, aos jornalistas, no final de um encontro com o Presidente da República sobre a reestruturação do SEF “não podem repetir-se”.

“Chamei o diretor nacional no dia seguinte. E presencialmente esclarecemos o que havia a esclarecer. Vale o que vale. O superintendente-chefe Magina da Silva tem uma notável capacidade operacional demonstrada ao longo da sua vida e por isso é hoje diretor nacional da PSP. Naturalmente, tem falta de experiência política. Por experiência própria, sei que há riscos para os quais devo estar mais bem preparado do que o senhor diretor nacional”, afirmou.

“Foi um erro o diretor nacional da PSP pronunciar-se daquela forma, mas ficará no cargo”, salientou.