Mário Pardo tinha cinco anos quando a Ponte Salazar foi inaugurada, a 6 de agosto de 1966. Estaria longe de imaginar em tenra idade que viria a saltar, não uma mas duas vezes, deste ícone alfacinha, rebatizado depois da Revolução dos Cravos.

Quando olha para a ponte lembra-se dos saltos que ali deu. “Foram bem-sucedidos, dá-me vontade de voltar a saltar. Não pensei [num terceiro salto da ponte], mas estou disposto a tentar, é uma questão de oportunidade”, assegura em entrevista ao SAPO24.

O primeiro salto na Ponte 25 de Abril acontece em 2005. “[Escolhi a ponte] porque sou de Lisboa, depois porque é um ícone da cidade, e porque cada vez que passava por lá olha e pensava: ‘um dia tenho de me atirar daqui a baixo. Não sei bem como, mas…’”. Mas lá encontrou uma solução: um camião TIR.

“Eu gosto de acrescentar elementos de inovação, diferenciadores e dai o camião. Achei uma ideia gira porque: ok, se não posso andar a pé na ponte, então vou-me atirar de cima de um camião e já não infrinjo lei nenhuma”, conta. Dito e feito.

Quando lhe perguntamos se a façanha não lhe arranjou problemas, ri e diz que, contrariamente ao esperado, foi na segunda iniciativa, em que “estava tudo mais do que autorizado e planeado, e com helicópteros da comunicação social a filmar, e por aí fora”, que acabou detido. Estávamos em março de 2009 e Mário saltou de um dos pilares da ponte.

“Curiosamente fui detido no segundo [salto]. Pedi autorização à Lusoponte e às Estradas de Portugal, e tudo ok. Também estava envolvida a entidade organizadora da Meia Maratona de Lisboa. Não pensei que tivesse pedir autorização à policia marítima”, relata. “Em boa verdade, o barco [da polícia marítima] esteve lá o tempo. Nunca tiveram intenção de me travar ou alertar para o facto de que não podia fazer aquilo, depois vieram ter comigo. Até paguei uma multa, mas não tive para me chatear. Foram duzentos e tal euros”, recorda.

Aterrou no rio em ambos os saltos, mas quando lhe perguntamos se a água é fria assegura que “não sentiu”. “A adrenalina também ajuda a que isso não aconteça”, adianta.

Mas saltar não é para todos, uma façanha deste género pode obrigar a um investimento de aproximadamente sete mil euros. Além do equipamento, é necessária uma “equipa de filmagem, porque é preciso registar estes momentos. Mas, normalmente, conto com uma boa parte de amigos que graciosamente participam porque também vão curtir”, diz.

O tempo de preparação depende da complexidade do salto. Dando como exemplo o que fez de cima de um camião TIR no tabuleiro da Ponte 25 de Abril, adianta que “houve um período de avaliação prévia, depois um estudo para saber como se iria viabilizar, seguido um período de treinos para saber como tinha de se fixar ao camião, como iria de saltar, e em que sítio, dadas as preocupações por causa dos cabos”.

“Contrariamente ao que se pode pensar, não é um ato de inconsciência, porque prezo imenso a vida, gosto é de me divertir e desfrutar. Portanto, é uma coisa que procuro fazer com o máximo de rigor e critério possível para poder continuar a fazer”, assegura ao SAPO24.

Um hobby que se tornou um caso sério

Os saltos chegaram à sua vida através do paraquedismo. Até chegar ao Base Jump (saltos a partir de objetos estáticos) foi uma “evolução natural”, conta. Aos 20 anos cumpriu o serviço militar nas tropas paraquedistas e foi premiado por isso pelo CEMFA - Chefe do Estado Maior da Força Aérea. Mais tarde, lançou-se na na queda livre e conquistou o título de Campeão Nacional, por três vezes, tendo depois representado Portugal em várias competições mundiais. Em 2000 torna-se no primeiro base jumper português.

O paraquedismo começou por ser um hobby, daqueles que eventualmente se tornam sérios. “Eu fazia psicoterapia e aconselhamento, tenho uma especialização em comportamentos aditivos, e essa era a minha atividade principal. Depois fazia paraquedismo como hobby. Nada disto foi planeado, foi acontecendo naturalmente".

Em 1998 decide fundar a escola Queda Livre com um colega. “Fizemos o curso de instrutores e comprámos quatro paraquedas, mas a escola era para conseguir algum dinheiro para nos auto financiar, para financiar os saltos que amávamos fazer”. Mário Pardo acabou por assumir a totalidade da empresa e passou a dedicar a sua vida a esta atividade. “Agora vivo do ar, mas dá uma trabalheira do caraças”, graceja.

Depois da Queda Livre surge a Get High, uma empresa de organização de eventos, especificamente dedicada a atividades na área do paraquedismo. “Continuo a saltar, mas não tanto como antes. Houve uma altura em que fazia quase mil saltos por ano, agora estou menos ativo, mas ainda faço uns duzentos por ano”, conta ao SAPO24.

O filho, Mário André Pardo, conhecido no meio por “Marinho” seguiu-lhe as pisadas. “É um excelente paraquedista, mesmo. Não é por ser meu filho, é verdade”, assegura com visível orgulho.

Os saltos da mente

Quando lhe perguntamos onde é que a psicoterapia e o paraquedismo se tocam, responde que “o crescimento pessoal é outro tipo de salto”. “Há desafios na vida por vezes mais assustadores do que saltar de paraquedas, tenho a certeza”, diz.

“Contrariamente ao que se possa pensar, eu era desde miúdo uma criança muito assustada e o paraquedismo começou como uma tentativa de, por um lado, fazer algo que me dava prazer, mas também  para exorcizar o medo, provar a mim mesmo que era capaz de o ultrapassar”, confessa.

“Acho que a nossas vidas são altamente condicionadas pelo medo que temos de fazer algumas coisas, de dar o salto, seja para um novo projeto profissional, seja de uma relação que está desgastada. Por vezes, ficamos agarrados à ilusão de segurança que temos daquilo que conhecemos, mas, como dizia Einstein, os domínios do desconhecido prometem as mais belas experiências”.

Agora com 55 anos, perguntamos-lhe que saltos ainda tem por fazer. Muitos, assegura. Há um especial, na Amazónia. No entanto, “existiu uma altura em que estava dedicado exclusivamente aos saltos, hoje não é assim. Gosto imenso de saltar, mas gosto imenso de fazer outras coisas também. Está tudo em aberto, o resto da história está por escrever, é deixar a vida fluir”.

Ponte 25 de Abril: 50 anos de história

Foram necessários 90 anos para conseguir que a Ponte 25 de Abril se tornasse realidade. O sonho começou com engenheiro português Miguel Pais, em 1876, contou à Lusa o arquiteto e autor do livro “A Ponte Inevitável – A História da Ponte 25 de Abril”, Luís F. Rodrigues.

“Salazar não tinha a intenção de financiar com receitas do Estado a Ponte 25 de Abril, portanto, Marcello Caetano, através do Segundo Plano de Fomento, propôs que esta obra fosse financiada por crédito externo norte-americano e foi isso que aconteceu”, contou o arquiteto.

A obra envolveu aproximadamente três mil trabalhadores e custou “cerca de dois milhões de contos”, tendo sido financiada pela banca estrangeira, especificamente a norte-americana. A empreitada foi adjudicada à empresa norte-americana United States Steel Export Company em 1959, após concurso público internacional.

Da construção da ponte, “oficialmente contabilizaram-se quatro mortes, mas na realidade houve mais”, adiantou o autor, afirmando que houve cerca de uma dezena de mortos.

As obras da ponte portuguesa, inspirada na Ponte Golden Gate norte-americana, começaram a 5 de novembro de 1962, tendo sido inaugurada a 6 de agosto de 1966, com o nome Ponte de Salazar. A estrutura ganha o nome Ponte 25 de Abril depois da revolução de 1974.

A ponte tem mais de dois mil metros de comprimento, entre as margens de Lisboa e de Almada, e o tabuleiro fica a 70 metros de altura acima do nível da água do rio.

Inês F. Alves