“Os refugiados aqui são muito bem acolhidos e têm a possibilidade de usar todos os serviços necessários”, afirmou Inna Ohnivets, em entrevista à agência Lusa.
A diplomata, que tem marcado presença nas manifestações de apoio à Ucrânia organizadas em Portugal, participou também, nos últimos meses, em várias iniciativas de acolhimento de cidadãos oriundos da Ucrânia.
“A nossa embaixada está em comunicação constante com estas pessoas e apoiamos muito as diferentes comunicações também com as câmaras municipais”, referiu Inna Ohnivets, dando como exemplo as autarquias de Cascais, Lisboa e Braga, entre outras: “As câmaras municipais apoiam muito os refugiados ucranianos”.
Em Cascais, teve oportunidade de contactar com pessoas que ali encontraram refúgio e gostou do que viu. “Na minha opinião, o acolhimento decorre bem”.
“Há muitas pessoas que têm crianças e as crianças estudam na escola. Sei que existem alguns problemas, mas também posso dizer que as diferentes associações criaram cursos para estudar a língua portuguesa. Os ucranianos que gostariam de estudar a língua portuguesa podem assistir a estes cursos. Durante a minha reunião com refugiados ucranianos em Cascais, tive uma conversa com as meninas ucranianas que disseram que gostam muito de estar aqui e já começaram a estudar a língua portuguesa”, contou.
Inna Ohnivets aconselhou, porém, os refugiados ucranianos a procurem ajuda junto das associações ucranianas e a evitarem contactos com “organizações pró-russas”.
“Aqui temos uma comunicação muito ativa com as associações ucranianas. Catorze associações ucranianas funcionam em Portugal há muitos anos”, disse, sublinhando que todas foram convidadas para a cerimónia solene de quinta-feira no parlamento português, por ocasião do discurso do Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, através de videoconferência.
Portugal aprovou mais de 30.000 pedidos de proteção temporária de residentes na Ucrânia, havendo várias organizações no terreno a mobilizarem apoio.
De acordo com a embaixadora, o sonho de muitas destas pessoas é regressarem ao país e reconstruírem a vida interrompida pela guerra, na madrugada de 24 de fevereiro.
“Os ucranianos que chegaram a Portugal têm os familiares na Ucrânia, porque os homens estão a defender a Ucrânia e participam nas batalhas contra os invasores russos. As famílias têm contactos estreitos e conversas telefónicas com os seus familiares na Ucrânia e muitos deles gostariam de regressar à Ucrânia, porque têm as suas próprias casas, têm o trabalho e por isso têm os sonhos de regressar e restaurar a vida que tinham antes desta guerra”, assumiu Inna Ohnivets, para quem Portugal tem sido “um amigo verdadeiro”.
Reabertura da representação de Portugal em Kiev seria muito importante
A reabertura da Embaixada de Portugal em Kiev seria um passo importante para a segurança na capital ucraniana e para que mais países regressem à Ucrânia, considerou a embaixadora em Lisboa.
“Já muitas outras embaixadas começaram a restaurar o seu trabalho em Kiev”, afirmou a embaixadora da Ucrânia em Portugal, que tem mantido contactos com o Governo português, nomeadamente com o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho.
Ainda sem informação sobre a reabertura da representação diplomática portuguesa, Inna Ohnivets defendeu que seria um passo importante, depois de as forças russas terem aliviado a pressão sobre a capital: “Na minha opinião isso é muito importante, porque também vem demonstrar uma segurança para todos em Kiev”.
Quando se passam dois meses desde a invasão russa, iniciada em 24 de fevereiro, a embaixadora revelou estar a trabalhar com as autoridades portuguesas no sentido de articular uma visita à Ucrânia, depois de o ministro dos Negócios Estrangeiros de lhe ter manifestado esse interesse.
“Vamos trabalhar sobre esta questão, mas eu tive uma videoconferência com o novo ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, e ele já visitou a Ucrânia no ano passado. Participou na conferência internacional dedicada à desocupação da Crimeia por meios pacíficos, por meios diplomáticos, e durante a nossa videoconferência ele disse que gostaria de visitar a Ucrânia”, indicou a diplomata, que está em Portugal desde 2015.
“Portugal ajuda muito para que possamos no futuro continuar a nossa vida pacífica e espero que o Governo português apoie a nossa perspetiva europeia e também apoie a Ucrânia com fornecimento de armas”, afirmou, na sequência do pedido que o Presidente do país, Volodymyr Zelensky, endereçou às autoridades portuguesas ao discursar no parlamento, na quinta-feira.
Da Rússia, Inna Ohnivets não espera mudanças de regime, mas acredita que as sanções da União Europeia vão fazer com que “pouco a pouco” a situação se altere.
“A situação vai piorar na Rússia. E também muitos militares russos morreram na Ucrânia. Durante este período de dois meses, mais de 20.000 soldados russos e generais morreram na Ucrânia. Os militares ucranianos defendem a sua terra natal e os militares russos têm o estatuto de ocupantes, de invasores”, disse ao ser questionada sobre o desfecho do conflito.
Para a embaixadora da Ucrânia, a Rússia atual é “muito parecida com a União Soviética” e com o regime de Estaline: “Putin restaurou este regime e isso significa que na Rússia existe o campo de concentração para os russos. Por isso muitos deles têm medo de realizar manifestações, mas claro que os russos que as realizaram, que se atreveram a demonstrar a sua posição contra Putin, têm uma posição heroica, porque na realidade isso é um perigo na Rússia, mostrar a posição real”.
A Embaixada da Ucrânia não mantém qualquer contacto com a Embaixada da Rússia, "uma tradição" já com oito anos, nas palavras da embaixadora, desde "a anexação ilegal da Crimeia", em 2014.
Inna Ohnivets encara a missão que desempenha como “muito honrosa”, em representação de um Estado que luta pela independência e pela preservação da soberania. “Gostaria de fazer tudo o que for possível para a nossa vitória”, confessou.
“Gostaria de dizer que o povo ucraniano avalia a solidariedade, toda a assistência humanitária prestada à Ucrânia, aos refugiados ucranianos e isso significa que teve um amigo verdadeiro, um povo de coração grande e sincero. Muito obrigada. Força Portugal e Glória à Ucrânia [‘Slava Ukraini’]”, afirmou no único momento em que sorriu abertamente durante uma entrevista a que compareceu vestida de preto e que começou com um aviso.
Precisava de falar de Mariupol, da emergência de retirar milhares de civis e soldados feridos, de um cenário que descreveu como “terrível”.
* Por Ana Mendes Henriques (texto) e António Cotrim (fotos)
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