Das quatro escutas distintas que captaram o primeiro-ministro António Costa em conversa telefónica com o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, uma delas tem relevância para a investigação do Ministério Público quanto à investigação do caso do hidrogénio verde.

A notícia, avançada pelo Expresso, dá conta que a 28 de dezembro de 2020, os dois governantes estiveram ao telefone para falar sobre o negócio do lítio e do hidrogénio verde, ambos assentes na estratégia da transição energética do Governo e que pode trazer para o país milhares de euros em fundos europeus e investimento.

De acordo com as informações a que o semanário teve acesso, Costa e Matos Fernandes falaram sobre as negociações ainda a decorrer quanto ao local onde vai ser construído o empreendimento do hidrogénio verde, quais as empresas interessadas e a possibilidade de Espanha poder entrar em parceria.

A conversa, captada porque Matos Fernandes estava sob escuta a mando do Ministério Público, foi considerada de interesse para o processo em curso pelos investigadores. Foi por isso que, apesar do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, António Joaquim Piçarra, ter considerado não haver indícios de crime, esta escuta foi preservada.

Como já tinha sido previamente noticiado, existem outras escutas entre Costa e Matos Fernandes, mas sabe-se agora que nenhuma delas foi considerada de interesse pelo  presidente do Supremo Tribunal de Justiça, tendo António Joaquim Piçarra mandado destruí-las.

Numa delas, o primeiro-ministro e o ministro do Ambiente falaram sobre o apoio a dar às famílias e às empresas no consumo de energia durante o confinamento; noutra, o assunto foi Costa estar em isolamento profilático e Matos Fernandes oferecer-se para emprestar-lhe um livro. O Ministério Público, todavia, recorreu da decisão de mandar destruir e o recurso vai ser agora avaliado.

Estas escutas foram gravadas no âmbito das investigações ao caso do hidrogénio verde, que para além de visar o ministro do Ambiente, também têm em mira o secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, num inquérito que, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), não tem arguidos constituídos.

De acordo com uma investigação publicada em novembro pela revista Sábado, a investigação está a decorrer por “indícios de tráfico de influências e de corrupção, entre outros crimes económico-financeiros”, sendo “suspeitos de favorecimento do consórcio EDP/Galp/REN no milionário projeto do hidrogénio verde para Sines”. A investigação terá sido aberta fruto de uma denúncia que deu entrada no Ministério Público em 2019.

O que está em causa é uma candidatura nacional a um estatuto de interesse comum da Comissão Europeia para obter fundos ao financiamento deste projeto do hidrogénio, construindo-se um empreendimento em conjunto com o consórcio acima mencionado no concelho alentejano. O Expresso adianta que a investigação em curso não atrasou o processo, sendo que o ministro do Ambiente revelou que o Governo já enviou cartas a oito promotores de projetos de hidrogénio.

Depois da notícia da Sábado, a PGR confirmou a existência de uma investigação a vários membros do Governo e tanto Siza Vieira, como Galamba e Matos Fernandes se insurgiram quanto à queixa movida. O secretário de Estado Adjunto e da Energia, inclusive, adiantou estar a ponderar apresentar queixa-crime por eventual denúncia caluniosa.

O próprio primeiro-ministro pronunciou-se quanto à investigação, reforçando que Siza Vieira e João Galamba não são suspeitos no hidrogénio verde.