Na denúncia do ex-engenheiro chefe a agências internacionais de segurança aérea é indicado um padrão de corrupção por parte da companhia que incluía a falsificação de documentos, a validação de reparações suspeitas e agressões a quem se opunha a estes métodos, segundo a AP.
Yonas Yeshanew, que se demitiu no verão e solicitou asilo nos EUA, disse que, embora não seja claro se algo nos registos foi alterado, a decisão de aceder a estes, quando deveriam ter sido selados, reflete uma política de gestão da companhia aérea com poucos limites e muito a esconder.
"O facto brutal será exposto (...) A Ethiopian Airlines está a seguir uma visão de expansão, crescimento e lucro, comprometendo a segurança", sublinhou Yeshanew num relatório enviado em setembro à Administração Federal de Aviação dos Estados Unidos e outras agências internacionais de segurança aérea, e entregue também à AP.
As críticas de Yeshanew às práticas de manutenção da Ethiopian Airlines, secundadas por outros três ex-funcionários entrevistados pela AP, fazem dele a última voz a pedir aos investigadores que analisem mais profundamente os possíveis fatores humanos na saga dos incidentes com os aviões 737 Max e que não se concentrem apenas no sistema de estabilização da Boeing, responsabilizado por dois acidentes em quatro meses.
Não é por acaso, acrescentou, que a Ethiopian Airlines viu um dos seus aviões Max cair quando muitas outras companhias aéreas não sofreram tal tragédia, apesar de também utilizarem o mesmo modelo.
A Ethiopian Airlines retratou Yeshanew como um ex-funcionário descontente e negou categoricamente as alegações, que representam um contraponto flagrante à perceção da companhia aérea como uma das empresas mais bem-sucedidas da África e uma fonte de orgulho nacional.
Yeshanew alegou no seu relatório e em entrevistas à AP que a companhia está a crescer muito rapidamente e a lutar para manter os aviões no ar, agora que transporta 11 milhões de passageiros por ano, quatro vezes o que acontecia há uma década.
O ex-engenheiro chefe indicou que os mecânicos estão sobrecarregados de trabalho e são pressionados a optarem por 'atalhos' para que os aviões estejam prontos a descolar, enquanto os pilotos estão a voar sem o descanso ou treino suficientes.
O ex-funcionário apresentou ainda uma auditoria de há três anos, na qual se descobriu, entre dezenas de outros problemas, que quase todos os 82 mecânicos, inspetores e supervisores, cujos ficheiros foram analisados, que não possuíam os requisitos mínimos para desempenharem as suas funções.
Yeshanew incluiu e-mails mostrando que insistiu durante anos com os altos executivos para que colocassem fim a uma prática na companhia aérea de aprovar trabalhos de manutenção e reparo que, segundo ele, foram feitos de maneira incompleta, incorreta ou inexistente.
Por outro lado, afirmou ter intensificado esforços após o acidente de 29 de outubro de 2018 com um Boeing 737 Max da Lion Air, na Indonésia, que matou todas as 189 pessoas a bordo.
Num e-mail enviado por Yeshanew ao administrador executivo da Tewolde Gebremariam pedia que "interviesse pessoalmente" para impedir os mecânicos de falsificarem os registos.
Esses pedidos foram ignorados, acrescentou. E, após o acidente de 10 de março de 2019, dia em que caiu um avião Boeing 737 Max etíope nos arredores de Addis Abeba, que matou todas as 157 pessoas a bordo, Yeshanew disse que estava claro que a mentalidade não havia mudado.
Yeshanew denunciou que, no dia seguinte ao acidente, o chefe de operações da Ethiopian Airlines, Mesfin Tasew, expressou abertamente o receio de que a companhia aérea poderia ser responsabilizada por causa dos seus "problemas" e "violações" ao nível da manutenção e ordenou que fossem verificados "erros" nos registos do avião Max que se despenhara.
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