Em comunicado, a CEP refere que "os bispos portugueses exprimem a sua tristeza e indignação diante da aprovação parlamentar da lei que autoriza a eutanásia e o suicídio assistido".

"Essa tristeza e indignação são acrescidas pelo facto de se legalizar uma forma de morte provocada no momento do maior agravamento de uma pandemia mortífera, em que todos queremos empenhar-nos em salvar o maior número de vidas, para tal aceitando restrições da liberdade e sacrifícios económicos sem paralelo", pode ler-se.

"É um contrassenso legalizar a morte provocada neste contexto, recusando as lições que esta pandemia nos tem dado sobre o valor precioso da vida humana, que a comunidade em geral e nomeadamente os profissionais de saúde tentam salvar de modo sobre-humano", acentuam.

Além disso, os bispos argumentam que "a lei aprovada poderá ainda ser sujeita a fiscalização da constitucionalidade, por ofender o princípio da inviolabilidade da vida humana consagrado na nossa Lei fundamental".

A Conferência Episcopal refere ainda que não pode "aceitar que a morte provocada seja resposta à doença e ao sofrimento".

"Aceitar que o seja é desistir de combater e aliviar o sofrimento e veicular a ideia errada de que a vida marcada pela doença e pelo sofrimento deixa de merecer proteção e se torna um peso para o próprio, para os que o rodeiam, para os serviços de saúde e para a sociedade no seu todo. Não podemos nunca desistir de combater e aliviar o sofrimento, físico, psicológico ou existencial, e aceitar que a morte provocada seja resposta para essas situações. A resposta à doença e ao sofrimento deverá ser, antes, a proteção da vida sobretudo quando ela é mais frágil por todos os meios e, nomeadamente pelo acesso aos cuidados paliativos, de que a maioria da população portuguesa está ainda privada", explicitam.

A rematar o comunicado, os bispos frisam que está em causa uma "política legislativa lesiva da dignidade de toda a vida humana", bem como "um retrocesso cultural sem precedentes, caraterizado pela absolutização da autonomia e autodeterminação da pessoa".

"A ele temos de reagir energicamente. Por isso, agora, mais do que nunca, reforçamos o nosso propósito de acompanhar com solicitude e amor todos os doentes, em todas as etapas da sua vida terrena e, de modo especial, na sua etapa final", afirmam.

O parlamento aprovou hoje a despenalização da morte medicamente assistida, com os votos de grande parte da bancada do PS, do BE, PAN, PEV, Iniciativa Liberal e 14 deputados do PSD e votos contra do CDS, Chega e PCP.

No total, votaram a favor 136 deputados, 78 contra e quatro abstiveram-se.

Na votação, o PSD, que tinha liberdade de voto, dividiu-se: 56 deputados votaram contra e 14 a favor, entre eles o líder do partido, Rui Rio.

No PS, uma larga maioria votou a favor da lei, mas nove deputados votaram contra, entre eles Ascenso Simões, José Luís Carneiro, secretário-geral adjunto.

Entre as abstenções, duas foram do PS e outras tantas do PSD.

A votação da lei durou cerca de 30 minutos, com os 218 deputados presentes a votarem à vez por não poderem estar todos ao mesmo tempo no plenário, devido à situação epidémica.

A lei vai seguir - depois de aguardar três dias por reclamações - para decisão do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que a pode vetar, enviar para o Tribunal Constitucional ou promulgar.

Se o Presidente promulgar e a lei entrar em vigor, Portugal será o quarto país na Europa, e o sétimo no mundo, a legalizar a eutanásia.

A lei hoje aprovada no parlamento prevê que pode pedir a morte medicamente assistida, ou eutanásia, uma pessoa “maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento intolerável, com lesão definitiva de gravidade extrema de acordo com o consenso científico ou doença incurável e fatal”.

Nestes casos, a eutanásia “não é punível” legalmente, “quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde”.