A infraestrutura, conhecida localmente como ‘medroa’ ou ‘pau-de-maré’, construída com três apoios, como se de um tripé se tratasse, e com uma régua em altura com quase cinco metros, foi recolocada em 2016, a várias dezenas de metros da linha de costa, para substituir um equipamento análogo — com cerca de 70 anos e feito com carris de ferrovia — que tinha sido destruído pelo mar.

Depois de uma primeira tentativa, em 2010, rapidamente gorada, a junta de freguesia então presidida por José Esteves, logrou, em 2016, repor a medroa, naquilo que constituiu a satisfação de uma promessa feita aos pescadores pelo autarca.

O então novo marégrafo foi chumbado à rocha, tendo o material necessário sido transportado à mão para os penedos — que ficam fora de água na maré baixa e cobertos pelo mar quando a maré sobe — e os trabalhos, também com a ajuda de uma máquina, ficaram concluídos a 06 de julho daquele ano, há precisamente sete anos.

À Lusa, o antigo presidente da junta, com uma vida ligada ao mar, espanta-se, ainda assim, com a situação atual e não tem dúvidas em culpar as obras de prolongamento do molhe norte do porto da Figueira da Foz. Estas têm provocado o crescimento da praia adjacente (o areal com dois quilómetros de extensão e mais de 700 metros de largura máxima, a maior praia urbana da Europa) e a consequente falta de areia nas praias a sul do rio Mondego.

“O sentimento que eu tenho é de muita mágoa. De revolta não, mas de muita mágoa, por aquilo que estão a fazer à Figueira, aquilo é tudo provocado pela retenção de areias por causa do molhe”, disse José Esteves.

Admitindo que o que diz gera “muita polémica”, o antigo autarca, que esteve três mandatos à frente da junta de freguesia, reafirmou: “Não se faz a uma povoação de eleição o que se tem feito”.

José Esteves explicou aquilo que, na sua opinião, sucede naquela zona dos penedos — a primeira área de rochas, localizada de frente para as muralhas de Buarcos e que se estende para norte, até ao Cabo Mondego.

“Conversei com muitos pescadores e as águas ali vêm sempre um bocado… não é bem norte, é noroeste, nor-noroeste. Correm para ali e depois ficam empatadas. E há solução para aquilo, o homem fez a desgraça na Figueira, agora o homem é que tem de a resolver. Não é partindo, é construindo, e aí talvez se consiga reverter a situação”, observou.

Assim, a solução que preconiza para evitar a acumulação de areia em Buarcos passa, não pela destruição do molhe norte portuário, mas antes pela “retenção de areias a norte”, alegadamente só possível pela edificação de um novo molhe, numa zona “depois da curva do cemitério até ao Cabo Mondego”.

O que José Esteves não tem dúvidas é que em Buarcos e na Figueira da Foz se está a assistir a uma espécie de ‘vingança’ do mar: “No palavreado dos pescadores já é [uma vingança], ‘fizeram-me mal, agora vão levar com o mal que me fizeram”, ilustrou, como que citando o próprio oceano.

O antigo autarca lembrou, por outro lado, que a zona onde o marégrafo está soterrado é conhecida pelas Portas de Buarcos, por ser por ali, ao lado da medroa, que os pequenos barcos de pesca chegavam à praia, onde depois ficavam.

“Está tudo destruído e tudo por culpa dos cargueiros”, lamentou.

A medroa, hoje já fora da rebentação, é apenas banhada pelo mar, a espaços, na maré cheia, e possui uma escala (de 20 em 20 centímetros) que começava nos 1,4 metros (a altura da rocha onde está localizada) até aos 4,6 metros. Na altura, no seu topo, foi colocada uma bandeira nacional, quatro dias antes de Portugal se sagrar campeão europeu de futebol.

Entretanto, a rocha da base desapareceu, ‘engolida’ pela areia, sendo atualmente visível, apenas, a marca dos 3,2 metros, no fundo a altura que a praia subiu em sete anos e uns restos de pano verde da bandeira de Portugal.

Com a acumulação de areia em altura veio o crescimento da praia, estimado por José Esteves, “em mais de 100 metros”, numa faixa aproximada de 300 metros.

Por junto, são cerca de 90 mil metros cúbicos de areia a mais em Buarcos, o equivalente a 6.000 camiões carregados de sedimentos ali depositados.

Luís Rocha, 71 anos, de Alva, concelho de Castro Daire, distrito de Viseu, faz férias em Buarcos há 15 anos. Como habitualmente, chegou à praia logo de manhã cedo, mas, este ano, confessou à Lusa ter notado algo diferente no areal.

“Estou a achar um bocado estranho. O ano passado estive cá e este ano achei uma modificação quase a 100%, aquilo [o marégrafo], o ano passado, estava completamente descoberto, hoje as pessoas até se podem lá sentar”, afirmou.

Mas não se trata só da medroa soterrada pela areia, também o acesso à beira-mar, pela areia fora, segundo Luís Rocha, está “mais difícil” e “complicado” para idosos e pessoas com dificuldades em caminhar, face ao crescimento da praia.