Quase 2h30 depois de chegar a Lisboa, o papa Francisco proferiu as primeiras palavras públicas, confessando a sua felicidade por "estar em Lisboa", salientando que a capital de Portugal é "de certo modo, a capital do mundo" neste momento, devido à realização da Jornada Mundial da Juventude.

"Isto condiz bem com o seu caráter multiétnico e cultural e revela os traços cosmopolitas de Portugal, que afunda as suas raízes no desejo de se abrir ao mundo e explorá-lo, navegando rumo a novos e amplos horizontes. Não muito longe deste lugar, no Cabo da Roca, está gravada a frase de um grande poeta desta cidade: Aqui, onde a terra se acaba e o mar começa. Durante séculos, acreditou-se que lá estivessem os confins do mundo", salientou Francisco no seu discurso, onde, além de invocar Camões, citou também a fadista Amália Rodrigues, "Cheira bem, cheia a Lisboa", e ainda a escritora Sophia de Mello Breyner.

"Faço meu, com muito gosto, aquilo que os portugueses costumam cantar. 'Lisboa tem cheiro de flores e de mar'. Muito mais do que um elemento paisagístico, o mar é um apelo que não cessa de ecoar no ânimo de cada português, podendo uma vossa poetisa celebrá-lo como 'mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim' e outro poeta rezava assim: 'Deus do mar dai-nos mais ondas, Deus da terra dai-nos mais mar'", disse.

"Falta de rotas corajosas de paz"

Sem falar concretamente na guerra na Ucrânia, Francisco não deixou de abordar este tipo de temas, referindo, mais uma vez, que Lisboa pode ser fundamental, nomeadamente ao "sugerir um caminho de paz"

"Lisboa pode sugerir uma mudança de ritmo. Em 2007, foi assinado aqui o Tratado de reforma da União Europeia. Nele se lê que a União tem por objetivo promover a paz, os seus valores e o bem-estar dos seus povos, mas vai mais longe afirmando que, nas suas relações com o resto do mundo, contribui para a paz, segurança, o desenvolvimento sustentável do planeta, a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, o comércio livre e equitativo, a erradicação da pobreza e a proteção dos direitos humanos. Não se trata apenas de palavras, mas de marcos no caminho da comunidade europeia, esculpidos na memória desta cidade", diz, referindo que passamos por um "momento tempestuoso" e que sente "falta de rotas corajosas de paz".

Oceanos, alterações climáticas e jovens

O tema dos oceanos e das alterações climáticas também esteve presente no discurso do papa, assim como o futuro dos jovens. Temas que preocupam o pontífice.

"O oceano lembra-nos que a existência humana é maior do que nós, ele tem de ser guardado com cuidado, tendo em conta as gerações mais novas. Como podemos dizer que acreditamos nos jovens se não lhes dermos um espaço sadio para construir o seu futuro?", disse Francisco, falando depois do jovens e daquilo que os desanima, como a falta de trabalho, o aumento do custo de vida e, "mais preocupante", o medo de constituir família.

"Na Europa e em geral no ocidente assiste-se a uma triste fase descendente na curva demográfica: o progresso parece ser uma questão que diz respeito ao desenvolvimento técnico e ao conforto dos indivíduos, enquanto o futuro pede para se contrariar a queda da natalidade e o declínio da vontade de viver. A boa política pode fazer muito neste sentido; pode gerar esperança. Com efeito, não é chamada a conversar o poder, mas a dar às pessoas a possibilidade de esperar. É chamada hoje, mais do que nunca a corrigir os desequilíbrios económicos dum mercado que produz riquezas mas não as distribui, empobrecendo de recursos e de certezas os ânimos", disse Francisco, criticando depois a eutanásia.

"Para onde ides se, perante o tormento de viver, vos limitais a oferecer remédios rápidos e errados como o fácil acesso à morte, solução cómoda que parece doce, mas na realidade é mais amarga que as águas do mar”.