O que aconteceu hoje?
O primeiro-ministro mudou vários secretários de Estado na tutela do ministro da Economia e das Finanças e escolheu António Mendonça Mendes para seu secretário de Estado Adjunto, depois da saída de Miguel Alves.
Pedro Cilínio substitui João Neves como secretário de Estado da Economia, e Nuno Fazenda é o novo secretário de Estado do Turismo, Comércio e Serviços, cargo até aqui desempenhado por Rita Marques.
Entretanto, houve novidades noutro gabinete. João Nuno Mendes foi escolhido para ser secretário de Estado das Finanças, nova pasta criada para ser o número dois do ministro Fernando Medina, depois de até aqui ter desempenhado as funções de secretário de Estado do Tesouro.
Para o seu lugar foi Alexandra Reis, ocupando agora a secretaria de Estado do Tesouro. Nuno Félix, por sua vez, substitui António Mendonça Mendes na pasta de secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
As tomadas de posse vão ocorrer na próxima sexta-feira, 2 de dezembro, pelas 12h00, no Palácio de Belém.
Mas como é que isto aconteceu?
As primeiras notícias surgiram ao início da tarde, quando se soube que António Costa tinha demitido o secretário de Estado da Economia, João Neves, e a secretária de Estado, Rita Marques, do Turismo.
Mais tarde surgiu a confirmação de que António Mendonça Mendes ia transitar entre pastas — e que, à boleia destas mudanças, haveria uma “dança de cadeiras” nas Finanças.
Mas porquê?
Não foi feita uma comunicação explícita pelo Governo — aliás, as únicas notas oficiais partiram da Presidência da República.
“O Presidente da República aceitou hoje as propostas do primeiro-ministro de exoneração de três secretários de Estado: dos Assuntos Fiscais, da Economia, e do Turismo, Comércio e Serviços, bem com as seguintes propostas de nomeação”, lê-se num primeiro comunicado. Já uma segunda nota registou as mudanças nas Finanças.
No entanto, o Jornal de Negócios avançou que “a opção por afastar João Neves, que tinha estado no anterior elenco governativo do PS, deve-se a divergências de fundo com o atual Ministro da Economia, António Costa Silva”.
Já a Renascença, citando fontes ligadas aos socialistas, escreveu que o pedido de afastamento dos dois secretários de Estado partiu diretamente do ministro Costa Silva.
Costa Silva? Porque é que ele quereria substituir dois secretários de Estado?
Ao que tudo indica, as razões recaem na sua posição quanto a uma descida transversal do IRC (imposto que incide sobre o lucro das empresas) para auxiliar o tecido empresarial, sendo que a redução de cada ponto percentual da taxa teria um impacto na receita de cerca de 100 milhões de euros.
Os secretários de Estado demissionários opuseram-se publicamente à posição de Costa Silva. João Neves disse que “agir em IRC para resolver um problema de curtíssimo prazo é um erro”, ao passo que Rita Marques frisou que o primeiro-ministro tem “a primeira e a última” palavra no que diz respeito à redução do IRC transversal a todas as empresas.
Este desaguisado, apesar de pouco noticiado, foi notado pela oposição, tendo o presidente do PSD, Luís Montenegro, manifestado apoio a Costa Silva, dizendo que o ministro estava a ser "triturado pela máquina socialista" e que foi “desautorizado em público”.
E a mudança de Mendonça Mendes?
Deve-se ao facto de Miguel Alves, que ocupou o cargo de secretário de Estado Adjunto durante apenas dois meses, ter sido demitido fruto da acusação do Ministério Público pelo crime de prevaricação.
O Governo trouxe então Mendonça Mendes — sobrevivente de vários executivos socialistas liderados por Costa — para um círculo interno mais próximo. E, com a posição dos Assuntos Fiscais vagada, fizeram-se mais alterações.
Quantas mudanças já houve neste executivo?
Essa é uma das notas de destaque neste momento. Apesar de estar em posse há apenas oito meses — desde março — o Governo já perdeu sete membros, como recorda o jornal Público:
- Dois meses depois da tomada de posse, Sara Abrantes Guerreiro, secretária de Estado da Igualdade e Migrações, demitiu-se citando motivos de doença, sendo substituída por Isabel Almeida Rodrigues.
- Na Saúde, a ministra Marta Temido e os secretários de Estado António Lacerda Sales e Maria de Fátima Fonseca abandonaram o governo em agosto. Para a pasta de Temido veio Manuel Pizarro, secundado por Ricardo Mestre e Margarida Tavares.
- Miguel Alves abandonou a presidência da Câmara Municipal de Caminha para tornar-se secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro. A posição, existente noutros executivos de Costa mas só em setembro criada para a atual legislatura, perdeu o seu ocupante no início deste mês, já que demitiu-se depois de ser acusado pelo Ministério Público pelo crime de prevaricação.
Feitas as contas, somando-se agora a saída de João Neves e Rita Marques, das sete saídas do Governo, apenas uma, a de Sara Guerreiro, deveu-se a motivos que não potencialmente problemáticos para Costa.
Houve reações?
Sim, principalmente por parte dos partidos à direita.
- Da parte do PSD, o secretário-geral do partido, Hugo Soares, disse que “os três membros do Governo que hoje saem são precisamente os que divergiram do ministro da Economia. Se à data ganharam a discussão no conteúdo, em prejuízo da economia portuguesa, agora são despedidos ao ralenti”. O dirigente social-democrata assinalou que “são oito saídas em oito meses de caos e erosão do Governo”, com “grande perda de autoridade política governativa” do primeiro-ministro, António Costa.
- O Chega falou num “acelerado processo de desagregação” do Governo, pela boca de André Ventura. “Para serem demitidos pelo próprio primeiro-ministro é porque António Costa Silva disse: 'Ou estes secretários de Estado saem ou eu vou-me embora'”, disse o líder do partido de extrema-direita. Ventura destacou ainda o facto de Mendonça Mendes ser irmão da ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes. “Não acho, e o Chega não acha, positivo que o irmão de uma ministra esteja a coordenar o Governo”, explicou o presidente do partido.
- A Iniciativa Liberal destacou que já saíram “em apenas oito meses, uma ministra e seis secretários de Estado, mas os sinais de desagregação absoluta não ficam por aqui, já que as situações de descoordenação são recorrentes”. A posição enviada à agência Lusa destacou ainda outros casos, como os do ministro Pedro Nuno Santos, que foi “humilhado publicamente e não se demitiu nem foi demitido”, ou ainda a ministra Ana Abrunhosa, que “continuou em funções, mesmo depois de o seu marido ter recebido fundos comunitários, que são tutelados pela própria ministra”.
Mais ao centro, Inês de Sousa Real disse que, “para o PAN, é com preocupação que, em menos de um ano do novo Governo, ainda para mais num contexto de maioria absoluta, verificamos estas consequentes demissões”.
A deputada única do PAN defendeu que “é importante que haja transparência” no processo de “nomeação e exoneração” de membros do Governo, e pediu esclarecimentos quanto “aos motivos da demissão” de João Neves e de Rita Marques.
E Marcelo?
Ao contrário do que tem sido hábito, pautou-se pelo silêncio. "Não tenho mais nada a acrescentar, eu recebi três propostas, são três propostas", afirmou o chefe de Estado, em resposta aos jornalistas, à saída de uma iniciativa na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
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