“Há pelo menos mais dois bispos que, além de Manuel Clemente, terão tido conhecimento de queixas de abusos por parte de padres e que não comunicaram essas suspeitas quer à Polícia Judiciária quer ao Ministério Público, as autoridades civis com competência para investigar este tipo de crimes”, avança o semanário.
No caso de Manuel Felício, as suspeitas remontam há uma década. Na altura, pais de 17 menores avançaram com uma queixa-crime à PJ contra o padre Luís Mendes, vice-reitor do seminário do Fundão, o que deixou o bispo da Guarda "aborrecido", segundo alguns dos pais contactados pelo semanário.
A polícia terá descoberto entretanto que, um mês antes das queixas, o padre se reuniu com as vítimas no sentido de arranjar uma justificação. No dia em que a PJ foi ao encontro do padre este encontrava-se "acamado", tendo sido detido apenas no dia seguinte.
Já na altura, a equipa da PJ apontava para suspeitas de encobrimento, refere o Expresso, citando o despacho de detenção de Luís Mendes: “De todos os elementos recolhidos, principalmente as inquirições dos menores, dos seus pais e também o resultado da tentativa de notificação e subsequentes diligências em relação ao suspeito, sendo certo que já se encontra agendada uma reunião com os pais dos menores para os próximos dias, resulta claro ou suspeita-se que esteja em curso uma manobra de branqueamento de toda esta situação.”
Luís Mendes foi condenado, tendo visto a sentença confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 2017.
Já o bispo Gilberto Reis recebeu queixas contra um padre que se encontra ainda no ativo, tendo a diocese garantido que “existiu uma averiguação canónica organizada pelo bispo à data, com audição de todas as partes envolvidas, ou seja, o alegado perpetrador e as alegadas vítimas”.
No entanto, “não foi feita uma participação ao Ministério Público, tendo em conta as recomendações canónicas e civis que estavam e vigor à data”, admite a diocese.
Escreve ainda o semanário que, segundo uma fonte judicial, Manuel Felício e Gilberto Reis e o cardeal Manuel Clemente não foram os únicos altos responsáveis a não dar seguimento às queixas que receberam de menores, sendo que alguns destes casos estão atualmente a ser investigados pelo Ministério Público após de ter recebido informação por parte da comissão independente que investiga casos de pedofilia na igreja católica.
Padre denuncia 12 sacerdotes
Há cerca de dois meses, um pároco — cujo nome não foi identificado — testemunhou perante a Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja e identificou 12 sacerdotes sobre os quais terá indícios, mais ou menos fortes, de terem assediado ou abusado menores, avança o Expresso.
Cerca de metade dos padres visados nesta denúncia ainda se encontram no ativo.
O padre que falou ao Expresso disse que expôs as suas suspeitas a altos responsáveis do Patriarcado de Lisboa e a procuradores do Ministério Público.
Há dossiers na sua posse sobre três párocos, dois dos quais identificados como Inácio, entretanto afastado da igreja e Nuno, ainda no ativo.
Nuno foi acusado de abusar de um jovem de 15 anos quando liderava a paróquia da Cruz Quebrada, em Oeiras, tendo o seu processo sido arquivado tanto pela igreja como pelo Ministério Público.
Inácio terá deixado, escreve o semanário, um "rasto de vítimas", mais de uma dezena. O padre que agora testemunhou perante a comissão apresentou uma queixa contra Inácio ao patriarca José Policarpo, em 1997. "Mas que de nada serviu”, conta.
O Patriarcado de Lisboa confirma que recebeu denúncias sobre este padre em 2013 de "crimes de abuso sexual contra menores enquanto pároco de S. Sebastião do Vimeiro de Alcobaça e Santa Beatriz da Silva, em Lisboa”.
Nesse mesmo ano, o patriarca de Lisboa autorizou uma investigação, cujas conclusões foram enviadas para a Congregação para a Doutrina da Fé, no Vaticano. Dois anos depois das denúncias, em 2015, Roma quis saber se o padre tinha intenções de pedir dispensa de funções. Se não, autorizava o cardeal Manuel Clemente a promover o seu processo de expulsão.
O padre pediu a dispensa apenas em 2020, saiu da igreja católica e é hoje padre de uma igreja evangélica.
O terceiro caso citado na peça do semanário é de um padre que faleceu há dois anos. Os pais do menor, em vez de recorrerem à justiça, terão extorquido o pároco.
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