O chefe do gabinete político do Hamas no Líbano, Ahmed Abdul-Hadi, admitiu a abertura de uma segunda frente no conflito com Israel, afirmando que o movimento xiita libanês Hezbollah está “preparado para uma grande guerra”, após a aberta a 07 deste mês com o ataque do Hamas contra Israel.
Abdul-Hadi, contudo, insistiu que o Hamas, movimento considerado terrorista por União Europeia (UE) e Estados Unidos e que governa a Faixa de Gaza desde 2007, não avisou antecipadamente o seu aliado Hezbollah dos ataques a Israel a 07 de outubro, que mataram mais de 1.400 pessoas.
Apesar disso, revelou, há uma “cooperação contínua” entre os dois grupos, em que o Hezbollah está agora “preparado para uma grande guerra” contra Israel no norte, enquanto o Hamas vai rebentar o “sonho” do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, de o expulsar de Gaza.
As declarações aumentam os receios de que o conflito no Médio Oriente possa estar prestes a alastrar-se para duas frentes e engolir o Líbano, sobretudo se Israel lançar uma invasão terrestre em Gaza, onde os bombardeamentos já mataram mais de 2.700 pessoas, e Teerão empenhar os seus aliados xiitas do Hezbollah numa guerra total.
“Temos relações muito fortes com o Hezbollah. Estávamos a cooperar com o Hezbollah antes e depois do ataque a Israel e agora estamos em plena cooperação”, disse Abdul-Hadi numa entrevista no seu gabinete no campo de refugiados de Mar Elias, em Beirute, onde nasceu há 55 anos.
Abdul-Hadi identificou a ofensiva terrestre israelita em Gaza como um dos principais fatores que poderiam levar o Hezbollah a participar plenamente no conflito.
“O Hezbollah não prestará atenção às ameaças de quem quer que seja contra a sua entrada na guerra e ignorará os avisos para não se meter nela. Quando o Hezbollah quiser ou não entrar na guerra estará relacionado com a escalada israelita e com os incidentes no terreno, especialmente se Israel tentar entrar em Gaza”, frisou.
Tal ação é amplamente esperada, numa altura em que Israel está a colocar blindados em posição perto de Gaza. No entanto, o porta-voz militar israelita, Richard Hecht, advertiu para o risco de se fazerem suposições sobre o próximo passo.
“Estamos a preparar-nos para as próximas fases. Ainda não dissemos quais serão. Toda a gente está a falar da ofensiva terrestre. Pode ser algo diferente”, referiu.
Abdul-Hadi sublinhou que o Hezbollah já demonstrou, em escaramuças fronteiriças, que não vai furtar-se ao combate.
“O Hezbollah disse que não vai ficar à margem e a prova disso é que atacou ao longo da fronteira sul por sua iniciativa. Estão a dizer que estão preparados para uma grande guerra. O Hezbollah deixou claro que, se os israelitas atravessarem a linha, lançará um ataque total contra Israel”, acrescentou Abdul-Hadi.
Os confrontos com foguetes e artilharia ao longo da fronteira libanesa, pouco depois de o Hamas ter lançado o seu ataque terrorista contra Israel, tiveram inicialmente um alcance limitado, embora tenham matado várias pessoas, incluindo o repórter de imagem da agência noticiosa britânica Reuters Issam Abdallah.
Nos últimos três dias, porém, os ataques tornaram-se mais intensos, no meio de avisos do Irão e do Hezbollah de uma possível ação “preventiva” contra Israel.
Para agravar as tensões, o líder iraniano, ayatollah Ali Khamenei, avisou terça-feira que, se Israel não parar de bombardear Gaza, “ninguém pode parar os muçulmanos e as forças da resistência”.
Na entrevista ao Politico, Ahmed Abdul-Hadi manteve-se “intransigente” na defesa da sua posição, apesar das abundantes provas documentais em contrário, segundo as quais mulheres, crianças e idosos foram chacinados no ataque a Israel.
Os seus comentários estão em sintonia com os de outros altos responsáveis do Hamas, que controla a Faixa de Gaza desde 2007, que montaram uma ofensiva de relações públicas para distanciar o Hamas das mortes de civis.
Mas, segundo o Politico, tem havido inconsistências nas suas explicações.
O chefe das relações internacionais do Hamas, Basem Naim, disse terça-feira que os combatentes do movimento receberam ordens claras para não atacar civis quando os militantes atacaram o sul de Israel. No entanto, agora negou a existência de mortes, dizendo à televisão australiana ABC que a culpa é de “outros grupos”.
Quanto à questão dos reféns, Abdul-Hadi disse que o Hamas não fechou a porta às negociações sobre os prisioneiros israelitas. “Mas temos de ter algo em troca”, disse.
“Os soldados israelitas capturados não estão na mesa das negociações. Só estarão depois de a guerra terminar e depois de cumprida a exigência a libertação dos 6.000 palestinianos detidos nas prisões israelitas”, acrescentou.
Nesse sentido, Abdul-Hadi disse que o Hamas não tinha outra opção senão atacar.
“Esta operação foi organizada pelas Brigadas al-Qassam [a ala militar do Hamas] e mais tarde outras organizações palestinianas juntaram-se à operação. Tratou-se de uma missão puramente palestiniana, o planeamento e a execução. Nem mesmo os nossos leais aliados sabiam o que estava para vir”, concluiu.
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