“Não excluímos considerações políticas, e parece que isto não é uma coincidência”, disse hoje à Lusa, Richard Tsoi, histórico membro da Aliança de Hong Kong de Apoio aos Movimentos Democráticos Patrióticos da China, movimento que organiza as habituais vigílias de 04 de junho no território e que está envolvido na gestão do museu.
O Museu 04 de Junho em Hong Kong, dedicado à memória do massacre de Tiananmen em Pequim em 1989, encerrou na terça-feira, três dias após a sua reabertura, devido a alegados problemas com licenças.
O centro recebeu na terça-feira a visita sem precedentes de funcionários do Departamento de Higiene Alimentar e Ambiental, que afirmaram que o museu não possuía a licença adequada para funcionar.
“Estamos agora a enfrentar vários desafios políticos e legais por parte do Governo, pelo que temos de ser muito cuidadosos”, afirmou Richard Tsoi, que é também antigo vice-presidente do Partido Democrata.
A Aliança de Hong Kong tinha anunciado domingo a reabertura do museu, que nos últimos nove anos foi obrigado a fechar as suas portas e a mudar a sua localização várias vezes.
O museu tem uma exposição de fotografias tiradas em 1989, faixas utilizadas nas demonstrações e acessórios usados pelos manifestantes, bem como réplicas em miniatura da Deusa da Democracia, uma estátua de 10 metros de altura erguida por estudantes de Belas Artes em frente ao retrato de Mao Tse Tung em Tiananmen e que mais tarde foi derrubada por tanques.
Segundo o jornal de Hong Kong South China Morning Post, a polícia planeia ter 3.000 polícias de choque em serviço para evitar qualquer concentração ilegal em memória do massacre de Tiananmen, onde, faz sexta-feira 32 anos, o exército chinês avançou com tanques para dispersar protestos pacíficos liderados por estudantes, causando um número de mortos nunca oficialmente assumido.
O Victoria Park, local tradicional de congregação da vigília de Tiananmen em Hong Kong e o Museu 04 de Junho serão os locais onde a vigilância policial será mais apertada.
Na quinta-feira, a polícia de Hong Kong proibiu a vigília, justificando a decisão com a prevenção da pandemia, dois dias após as autoridades de Macau terem feito o mesmo.
A Aliança de Hong Kong de Apoio aos Movimentos Democráticos Patrióticos da China apresentou recurso, mas as autoridades acabaram mesmo por proibir o evento.
“Os comícios e procissões não são atividades recreativas, envolvem os direitos humanos básicos do povo de Hong Kong, mesmo a proteção constitucional, tais como a liberdade de expressão e a liberdade de reunião”, afirmou Richard Tsoi.
“Há de facto um sentimento de que os direitos humanos e a liberdade de expressão estão a sofrer interferências. A Lei de Segurança Nacional está em vigor em Hong Kong há menos de um ano, mas já teve um forte efeito dissuasor, como vimos em alguns casos, tais como detenções, processos judiciais e prisão preventiva, que são todas violações dos direitos humanos”, denunciou.
No ano passado, em Macau e Hong Kong, as autoridades proibiram, pela primeira vez em 30 anos, a realização do evento no espaço público, uma decisão então justificada com os esforços de prevenção da covid-19.
Apesar da proibição do ano passado, cerca de 20.000 pessoas reuniram-se no Victoria Park, no ano passado.
Cerca de 26 ativistas e opositores foram presos e vários deles já foram condenados a penas de prisão, entre os quais o ativista Joshua Wong, que chegou a ser indicado para o prémio Nobel da Paz em 2018.
Por essa razão, Richard Tsoi apela ao público “para avaliar seriamente” qualquer manifestação que possa violar as diretrizes das autoridades de Hong Kong.
Em Macau, os organizadores esperam pela decisão do Tribunal de Última Instância, após a polícia ter também proibido a comemoração, no dia 04 de junho, na Praça do Leal Senado, devido ao risco de violações do Código Penal, mais precisamente o artigo 181.º sobre “ofensa a pessoa coletiva que exerça autoridade pública”, o artigo 177.º referente a “publicidade e calúnia” e, finalmente, o artigo 298.º sobre “incitamento à alteração violenta do sistema estabelecido”.
Esta foi a primeira vez que as autoridades de Macau citaram razões políticas para proibir a comemoração.
“Mostra a progressão da subversão que há em Macau. Estão mais à frente que Hong Kong”, disse à Lusa, na sexta-feira o vice-diretor da organização não-governamental Human Rights Watch (HRW) para a Ásia, Phil Robertson
“Em Hong Kong ainda dizem que é por causa da covid-19. Em Macau já nem jogam este jogo”, denunciou.
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