"Que a Igreja tem um dever ético de responder, isto é, de se responsabilizar e que ontem foi assumido, é assim. Que esse dever ético abrange o apoio psicológico, continua a ser muito importante para muitas as vítimas anos e anos e anos depois, não há dúvidas. Que em vários países houve indemnização, também se sabe, portanto vamos esperar pela posição da Igreja", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, após questionado sobre se deverá haver lugar a indemnizações para as vítimas.

O Presidente da República falava aos jornalistas no Palácio de Belém, em Lisboa, no final de mais uma edição da iniciativa "Músicos no Palácio de Belém" e depois de na segunda-feira ter sido conhecido o relatório da comissão independente que estudou os abusos sexuais na Igreja Católica, e que aponta para quase cinco mil vítimas, no mínimo.

Marcelo Rebelo de Sousa considerou que o número "ultrapassou aquilo que tinha pensado de início e provavelmente ultrapassou aquilo que os portugueses todos pensavam quando se arrancou com a comissão".

“A comissão chamou-me a atenção para o facto de os números terem aumentado”, disse o presidente aos jornalistas. “Chamou-me a atenção para os relatos que são muito intensos. Chamou-me atenção para o fenómeno que não é do passado. Que continuou e continua”, afirmou.

Associações de apoio especializado à vítima de violência sexual:

Quebrar o Silêncio (apoio para homens e rapazes vítimas de abusos sexuais)
910 846 589
apoio@quebrarosilencio.pt

Associação de Mulheres Contra a Violência - AMCV
213 802 165
ca@amcv.org.pt

Emancipação, Igualdade e Recuperação - EIR UMAR
914 736 078
eir.centro@gmail.com

"Este número é bem superior ao número anterior [mais de 400 casos] e, para o tempo em que trabalhou a comissão, como alguns dos membros reconheceram, significa que pode ainda ser uma parte do fenómeno e não todo o fenómeno, que continua presente na sociedade portuguesa", declarou Marcelo.

O chefe de Estado defendeu também que "a Igreja como instituição tem de repensar a sua atuação no futuro, porque em muitos casos não teve a noção, noutros casos teve a noção mas subavaliou, achou que era um fenómeno isolado ou que era um fenómeno que não tinha a gravidade que tinha, noutros fenómenos ainda demorou muito tempo a reagir, noutros fenómenos ainda está a querer compreender aquilo que se passou".

“A igreja tem um dever ético de se responsabilizar e de responder [pelos abusos], é sim”, respondeu o presidente.

"Nos países em que a resposta foi mais clara, mais determinada e mais rápida o efeito foi um, naqueles em que não foi assim o efeito foi outro, e era preferível que fosse o primeiro o caminho em Portugal.

Marcelo apontou que essa é "uma reflexão que a Igreja terá de fazer".

"Tem marcada uma Conferência Episcopal para o começo de março, eu acho que quanto mais rápido for e mais claro for, melhor", salientou.

Sobre o prolongamento do prazo de prescrição, o presidente defende tratar-se de um debate a desencadear pelo governo e pela assembleia. “O presidente está em sintonia com a Comissão Independente, no entanto, cabe à assembleia”, disse.

De acordo com Marcelo Rebelo de Sousa, a comissão entende que deveria haver uma comissão ligada ao Estado, que possa continuar a investigar estes assuntos, como acontece em outros países. “Assim terá mais manobra do que tem esta atual”, declarou.

Questionado sobre o impacto do escândalo na organização da Jornada Mundial da Juventude Portugal, o presidente entende que são situações diferentes, “a Jornada é uma responsabilidade muito específica que nada tem a ver com aquilo que a igreja enfrenta a longo prazo”, disse acrescentando que “por um lado, é evidente que uma instituição que se confronta com este relatório é obrigada a mudar de vida. A instituição deve mudar as estruturas”, salientou o Presidente da República.

*com Lusa