Por: João Gaspar da agência Lusa
De um momento para o outro tudo mudou no Rebolo, aldeia do concelho de Pombal. As chamas subiram e uma das frentes aproximou-se de Milhariças. No entanto, tal como o vento, que de repente se levantou, também depressa amainou e permitiu controlar o avanço das chamas, com a ajuda rápida de dois meios aéreos.
Numa das encostas, já em Milhariças, Natália ainda estava sobressaltada depois de ter visto as chamas a irem até às “barbas” da sua casa.
“Deus me livre, Deus me livre, Deus me livre”, repetia, como um mantra.
“Estava tudo sossegadinho, mas às três da tarde virou tudo. É sempre às três que o vento toca”, comentava Natália, que agradecia a ajuda de particulares, nomeadamente um camião com um tanque de água, que permitiu uma rápida intervenção.
Desde segunda-feira que o vai e vem do fogo e do vento não lhe tem deixado ter qualquer sossego.
“Há duas noites que não prego o olho”, afirmou Natália.
Do outro lado do monte, no Rebolo, a situação também se complicou com o vento, por volta das 15:00.
De manhã, a agência Lusa tinha falado com Vitória Gonçalves que já tinha visto o fogo passar três vezes pela localidade.
Pouco descansou, quando chegou pela quarta vez à tarde, pelo outro lado da encosta.
Sentada a ver carvalhos e sobreiros ainda a fumegar, lamentava à Lusa o cenário desolador.
“Até haver onde arder, ele não para”, disse Vitória Gonçalves, de 76 anos, a olhar para uma paisagem toda enegrecida, recordando como era “tudo verdinho” à beira do Nabão, rio onde hoje não se avista qualquer água. Corre seco.
“É uma dor. Por mais incêndios que passem aqui, é sempre uma dor. Já não vai dar para mim, já não vai dar para os meus filhos, se calhar para os netos”, lamentou.
“As pessoas dizem que não têm nada. Agora é que não têm mesmo nada. Só terra e pedras”, comentou Maria das Neves, sentada ao lado de Vitória, com o cenário dos montes negros à sua frente.
A mulher de 87 anos conta que antes, “se precisasse de qualquer coisa, vendia uns pinheiros”.
“Agora vendo o quê? Cinza?”, questiona.
Contabiliza “muitos bocadinhos” de terras espalhadas pelo território, alguns se calhar com um metro, mas que “não valem nada”.
Vitória entra na conversa e diz que “só queria ter um terreno em Pombal”.
“Aí ao menos vendia para alguém construir. Aqui não vale nada”, frisou.
Entre Ansião e Pombal, onde ainda não tinha ardido, viam-se populares, sentados em muros ou junto a tratores com pequenos tanques de água, prontos, à espera, a olhar para o horizonte, à procura de avistar alguma das poucas colunas de fumo que hoje se avistaram pelo território.
Na Macieira, já no concelho de Alvaiázere, mas próxima de Rebolo, Joana Neves não descansa desde sexta-feira, sempre com “o coração nas mãos” e os olhos a fitar o horizonte, à procura de sinais do fogo.
“Estive aqui a noite toda, com a minha mãe. Na terça-feira, o incêndio já cá tinha passado, na quarta-feira, também, e depois hoje. De manhã e agora à tarde”, conta a habitante da Macieira, que viu as chamas a subirem à tarde a encosta junto à sua casa num instante.
Sozinha com a sua mãe a vigiar a evolução do fogo, assistiram, impotentes, às chamas a pegar a um barracão de lenha perto da casa, que acabou destruído.
Ligaram a conhecidos e lá apareceu um vizinho, depois um primo, militares da GNR e duas carrinhas com tanques de água de duas juntas de freguesia dos concelhos de Alvaiázere e Ansião, contou a mãe de Joana.
A ação rápida permitiu conter o fogo ao barracão.
“Desde sexta-feira [quando o incêndio deflagrou] que estou nisto. É impossível descansar”, afirma Joana Neves.
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