Ao sétimo dia do fogo, que consumiu milhares de hectares de floresta e de pasto no concelho da serra algarvia e que se estendeu a concelhos limítrofes, as chamas não são visíveis esta tarde em muitas zonas, embora a terra apresente alguns focos fumegantes.

A população, na sua maioria obrigada a abandonar as suas casas e os animais, começa agora a regressar às habitações com a expectativa de que “a casa de uma vida continue de pé, bem como as vacas e os porcos” que foram deixados para trás.

“Saí de casa na segunda-feira. Saí não, fui obrigado pela Guarda [GNR] a abandonar a minha casa e a deixar os meus animais. Tinha possibilidade de os levar daqui, mas a Guarda não deixou que os carregasse na carrinha, quando o fogo ainda estava muito longe. Felizmente que nada lhes aconteceu, nem a eles nem à casa”, diz à Lusa Joaquim Silva, que tem duas vacas e cinco porcos.

À semelhança de outros moradores com que a Lusa falou, o habitante de Monchique, de 72 anos, critica a forma como foram obrigados a sair das casas, sem que lhes fosse permitido colocar os animais e viaturas em segurança.

“Os guardas pareciam sei lá o quê. Estavam possuídos por uma agressividade que nem consigo dizer”, indica, enquanto olha para a sua habitação, com paredes ‘pintadas’ pelo preto deixado pelo fogo.

Joaquim faz uma pausa na conversa e chora. Questiona “o porquê de isto ter acontecido” e teme pelo seu futuro e o dos animais.

“Está tudo queimado, não há pastos. E o que é que agora vou dar de comer aos animais se não tenho dinheiro para comprar ração?”, pergunta, vezes sem conta, sem conseguir encontrar a resposta.

Joaquim Silva espera encontrar no Governo as ajudas necessárias para refazer o seu pequeno sustento, a criação de “meia dúzia de animais”, o mesmo sucedendo com o seu vizinho conhecido como Zé Pastor, que mora ali a menos de cem metros.

Zé Pastor vive o mesmo drama da alimentação dos animais: “Consegui retirar daqui as minhas vacas, levei-as para a casa do Zé Narciso, mas agora não tenho alimento para lhes dar”, lamenta.

“Vou ter que ir falar com o presidente da Câmara para ver se ele me dá uma ajudinha para alimentar as minhas meninas - a Maria, a Acácia e a Flora”, diz.

O incêndio rural, que está a ser combatido por mais de mil operacionais, deflagrou na sexta-feira à tarde em Monchique, no distrito de Faro, e lavra também no concelho vizinho de Silves, depois de ter afetado, com menor impacto, os municípios de Portimão (no mesmo distrito) e de Odemira (distrito de Beja).

Segundo um balanço feito hoje de manhã, há 36 feridos, um dos quais em estado grave (uma idosa internada em Lisboa), e 299 pessoas estão deslocadas e distribuídas por centros de apoio, depois da evacuação de várias localidades.

Outras nove pessoas acamadas estão dispersas por unidades de saúde.

De acordo com o Sistema Europeu de Informação de Incêndios Florestais, as chamas já consumiram 23.478 hectares. Em 2003, um grande incêndio destruiu cerca de 41 mil hectares nos concelhos de Monchique, Portimão, Aljezur e Lagos.

Na terça-feira, ao quinto dia de incêndio, as operações passaram a ter coordenação nacional, na dependência direta do comandante nacional da Proteção Civil, depois de terem estado sob a gestão do comando distrital.