João Duarte, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, disse à agência Lusa que, a confirmar-se, a descoberta muda a perceção sobre o risco sísmico ao largo da costa portuguesa, que vem de uma zona chamada Planície Abissal da Ferradura, situada a 250 quilómetros a sudoeste do cabo de São Vicente.

"É o local de início de um processo de subducção, em que uma placa cai por baixo ou se descasca", conhecida nas margens do Oceano Pacífico e em zonas de grande atividade sísmica, como o Japão, disse o investigador do Departamento de Geologia à agência Lusa.

A investigação, divulgada hoje pela revista National Geographic e ainda por publicar como estudo num boletim científico, começou por querer "localizar a fonte do sismo de 1755, que sempre foi um enigma, porque há 250 anos não havia registos".

O sismo de 1969 já foi registado por sismógrafos, ocorreu numa zona plana do fundo do mar, longe da falha tectónica, a zona instável onde se unem as placas rochosas da crosta terrestre, que fica no meio do Oceano Atlântico.

Com a investigadora Chiara Chiviero, também da Universidade de Lisboa, foram compilados todos os registos sismográficos para a zona da anomalia, incluindo dados recolhidos no fundo do oceano durante 11 meses em 2007, e com o investigador Nicolas Riehl, da Universidade de Mainz, na Alemanha, foi criado um modelo computorizado que confirma a hipótese de subducção.

"Não é possível dizer que vai haver mais sismos porque este é um processo absolutamente lento, demora 10 a 20 milhões de anos", afirmou João Duarte, defendendo que com esta hipótese se percebe melhor como é que uma zona aparentemente calma do leito oceânico é capaz de gerar sismos tão fortes como o de 1755, que devastou Lisboa e parte da costa.

João Duarte frisou que a descoberta, só por si, nada tem a ver com a capacidade de prever sismos de grande dimensão, que são irregulares e cuja ciclicidade é apenas estatística.

A regularidade dos sismos é "um mito urbano", considerou.

Considera-se atualmente que um sismo na costa portuguesa na ordem dos 8,5 a 9 graus na escala de Richter, como o de 1755, se repete "entre mil a dois mil anos", mas este número pode não significar nada se os sismos de grande dimensão se sucederem em períodos mais curtos de tempo, como é comum, "não se sabe bem porquê".

Além disso, um sismo de magnitude 6, estatisticamente mais frequente, mais perto da costa ou debaixo de uma cidade pode ter efeitos ainda devastadores, indicou.

A anomalia da planície da Ferradura pode, ao longo do tempo, vir a significar uma mudança de rumo da deriva dos continentes do planeta, que ciclicamente se afastam e aproximam, criando e fazendo desaparecer oceanos e formando um continente único conhecido como Pangeia, o que se estima já ter acontecido três vezes.

Europa e América têm vindo a afastar-se, mas o início de um processo de subducção indica que a placa oceânica se está a afundar sob a placa continental, o que ao longo de milhões de anos poderá significar que os continentes se estão novamente a aproximar, eventualmente fazendo desaparecer o oceano Atlântico.