“A ameaça maior é para a democracia. Porque quando está em causa o jornalismo está em causa a democracia. E como já vimos, nalguns casos, com algumas eleições, há um risco de manipulação da opinião pública”, afirmou à Lusa.

“Não gosto da expressão ‘fake news’. Prefiro chamar mentiras disfarçadas de notícias, porque é disso que se trata. São mentiras fabricadas com o intuito de passarem por notícias. Não são lapsos, há intencionalidade e, portanto, há uma ameaça, [dado] que as pessoas podem tomar como boa uma informação que é fabricada com o sentido de manipular as pessoas”.

Uma solução, a par de outras, passa pelo regresso aos princípios do jornalismo, disse João Paulo Baltazar à Lusa, num trabalho preparatório sobre “fake news”, tema de uma conferência, a realizar em 21 de fevereiro, em Lisboa, e organizada pelas duas agências noticiosas de Portugal e Espanha, Lusa e Efe, com o título “O Combate às Fake News - Uma questão democrática”.

E para combater o fenómeno, que ganhou relevância nas eleições dos Estados Unidos ou do Brasil, e num momento em que “as redações são curtas, estão mais fragilizadas”, o jornalista e diretor da rádio pública defendeu, precisamente, um reforço de pessoal.

“Não é possível fazer jornalismo de qualidade com equipas sobrecarregadas, que não têm tempo para pensar. Já muita gente diz que o tempo talvez seja o grande luxo do jornalismo nos dias que correm e eu concordo. É preciso tempo para pensar, embora o jornalismo, por definição, seja um ofício feito sob pressão”, disse o jornalista, um dos fundadores da TSF.

Depois de “reforçar equipas”, há ainda que investir em “formação profissional muito adequada”, não apenas ao “nível da ética e deontologia, relembrando permanentemente os fundamentos” da profissão.

Além do mais é preciso integrar a formação com ferramentas para ajudar na “verificação das fontes, da origem das imagens, dos sons”, dado que existem programas que não retocam só as fotografias e podem por pessoas a dizer “coisas que não disseram”.

A “educação para os media é chave”, com o Estado a investir em programas que, desde crianças, incentivem “um espírito crítico no consumo de informação”, além de os media deverem aumentar o envolvimento com as escolas.

E, internamente, nas redações, devem existir provedores, com “alguém credível, que acompanhe, que chama a atenção”, sem a “pressão do dia a dia”

O “fact checking” pode ajudar nesta equação, mas João Paulo Baltazar lembrou que a obrigação dos jornalistas na “verificação de factos” é algo que está na “essência da profissão”, admitindo que, por vezes, pode acontecer faltar tempo, no meio da pressão do dia a dia, para que se faça esse verificação.

“O nascimento de sites e plataformas de ‘fact checking’ devia ser um alerta para os órgãos de comunicação social pensarem se ‘nós não estamos a fazer bem nosso trabalho?’. Se calhar não… Vamos lá fazer mais verificação”, sugeriu.

Porque, segundo disse, “as mentiras disfarçadas de notícias podem ser como as infiltrações de água - quando se dá por elas já está água a pingar e não se sabe de onde ela vem. Primeiro que se descubra de onde vem…”

Partidário da autorregulação, o diretor da Antena 1 discorda de uma maior intervenção do Estado nesta questão das “fake news”.

“Tem de haver um debate, tem de haver as instituições que fiscalizam, a comissão da carteira, o conselho deontológico, devem estar muito ativos e atuantes. E os órgãos entre si podem e devem promover contactos e muitas vezes a colaboração” para ter “as defesas mais elevadas”, concluiu.

E sobre o que mudou na redação da Antena desde que começou a falar das “fake news” com esse nome, João Paulo Baltazar responde com o aumento do debate.

“O que temos que fazer é aumentar o grau de verificação, de tomar um conjunto de cuidados. E estimular uma cultura de redação autocrítica e crítica. Ou seja, permanentemente alertar para o ‘piloto automático’, para tirar o pé do acelerador. E ter como bom o mote de que é preferível dar um pouco mais tarde, mas dar bem. Porque um tiro ao lado, um pé na argola é mais complexo depois de recuperar a credibilidade que se vai perdendo com esses deslizes”, disse.