Ouvido como testemunha em mais uma sessão do julgamento no caso EDP no Juízo Central Criminal de Lisboa, o advogado frisou que ajudou sempre o antigo ministro da Economia “como amigo” e que foi nessa qualidade que em 2005 veio analisar o acordo assinado um ano antes com o ex-presidente do BES Ricardo Salgado e o administrador Mosqueira Amaral, assegurando que o objetivo de Pinho era salvaguardar o cumprimento do acordado apesar de ir para o Governo.
“Em 2005 pediu-me para dar uma olhadela a um documento. Havia a expectativa de vir a ter funções executivas e fui rever um acordo que tinha sido feito uns tempos antes. Ele queria assegurar que uma parte do acordo — reformar-se aos 55 anos — não suscitava quaisquer dúvidas”, explicou, continuando: “Reafirma a ideia de que ele ao aceitar a pasta da Economia não ia afetar os direitos que tinha acordado com o banco”.
José Miguel Júdice contou ainda que depois, em 2009, Manuel Pinho voltou a contactá-lo face ao entendimento do BES de que não seria possível cumprir a reforma aos 55 anos e destacou a tensão que procurou atenuar entre o ex-ministro e o Grupo Espírito Santo (GES).
“Manuel Pinho tinha feito um acordo em 2004 com Ricardo Salgado. Esse acordo nunca tinha sido questionado e em 2005 foi reafirmado por um facto novo — a saída para o Governo. Em 2009, soube que havia uma teoria de que não era possível assegurar aqueles direitos. Lembro-me de que ele estava muito indignado. Manuel Pinho tem o coração perto da boca e reagia por vezes com alguma tensão, o que seria mau se fosse feito diretamente com o banco”, observou.
Questionado se o acordo de cessação de funções executivas de Manuel Pinho no BES assinado em 2004 e a carta de desvinculação em 2005 seriam uma suposta encenação, o advogado afastou esse cenário.
“Se alguém me tivesse dito na altura o que está a referir como hipótese, ficaria muito surpreendido. Se houve uma farsa, então eu também fui enganado. Não me passou pela cabeça, nem houve o mais pequeno indício de que este processo fosse fraudulento”, afirmou, acrescentando que interpretou o regresso de Pinho em 2010 para o BES África como uma forma de compensação de Ricardo Salgado a Pinho por não cumprir o acordo da reforma.
A sessão de hoje contou também com o depoimento do ex-administrador do BES Morais Pires, que substituiu Manuel Pinho na direção da área financeira do banco. Revelou não ter conhecimento do acordo de 2004 entre o ex-governante e Ricardo Salgado, mas indicou que também não teria de saber e que esse desconhecimento também se aplicava em relação aos prémios pagos no estrangeiro, uma vez que eram algo tratado de forma individual.
“Eu declarei os prémios, mas é verdade que eram pagos no exterior por uma empresa do GES, a ES Enterprises”, admitiu Morais Pires, que recebeu cerca de 22 milhões de euros entre 2007 e 2013, garantindo que não tinha conhecimento de que Manuel Pinho tinha recebido pagamentos mensais do GES no estrangeiro durante o período em que esteve no Governo: “A forma, o prazo ou o método era uma decisão do acionista”.
Manuel Pinho, em prisão domiciliária desde dezembro de 2021, é acusado de corrupção passiva para ato ilícito, corrupção passiva, branqueamento e fraude fiscal.
A sua mulher, Alexandra Pinho, está a ser julgada por branqueamento e fraude fiscal – em coautoria material com o marido -, enquanto o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, responde por corrupção ativa para ato ilícito, corrupção ativa e branqueamento de capitais.
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