O coletivo de juízes responsável pelo julgamento de Ricardo Salgado no âmbito da Operação Marquês não terá aceite o pedido de suspensão do mesmo. A notícia foi confirmada pelo Público e avançada inicialmente esta manhã pela Rádio Renascença.
O requerimento, que deu entrada no tribunal em 14 de outubro, de acordo com a defesa de Salgado, confirma os "sintomas de declínio cognitivo progressivo" já expostos num anterior requerimento submetido em julho e é agora atualizado com exames complementares realizados nos últimos meses e um relatório médico assinado pelo médico neurologista Joaquim Ferreira.
De acordo com o despacho a que a Lusa teve acesso, assinado pelo juiz-presidente Francisco Henriques, o coletivo analisou o atestado médico associado ao requerimento apresentado pelos advogados Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squilacce e concluiu que “não é indubitável que as capacidades de defesa do arguido estejam limitadas de tal forma que o impeçam de se defender de forma plena” em tribunal.
“Não parece decorrer do teor do atestado médico que o arguido esteja mental ou fisicamente ausente”, pode ler-se no despacho, que acrescenta que a “limitação” atribuída a Ricardo Salgado “não é de todo impeditiva do exercício do direito de apresentar pessoalmente em julgamento a versão dos factos passados”.
Simultaneamente, o presidente do coletivo de juízes entende que as afirmações do requerimento que indicam um estado de degradação do antigo presidente do BES, de 77 anos, ao ponto de não ter capacidade para se defender ou não compreender o alcance do julgamento “constituem uma petição de princípio que não têm sustentação no atestado médico” junto aos autos do processo. E nota que o atestado médico não foi sujeito a contraditório.
“Se a restrição ou limitação da sua capacidade advém de anomalia psíquica (p. ex., doença de Alzheimer), então é porque, nestes casos, o processo não pode prosseguir, sob pena de violação do direito de defesa do ora arguido”, referia o requerimento submetido em 14 de outubro, reiterando: “Em face da comprovada anomalia psíquica da Doença de Alzheimer diagnosticada ao ora arguido, (…) requer-se que V. Ex.ª se digne determinar a suspensão do presente processo”.
O despacho do tribunal vai mais longe e considera que “a limitação cognitiva do arguido não é algo que lhe seja coercivamente imposto, mas, apenas, uma limitação da natureza do ser humano, potenciado por uma doença neurológica degenerativa”, enfatizando ainda que “não é o Tribunal que impõe qualquer limite ao direito de defesa do arguido, é o próprio arguido que autolimita as suas capacidades de defesa ao optar por não prestar declarações”.
Por via deste entendimento, e explicitando que a extinção da responsabilidade criminal ocorre - além da prescrição - nos casos de morte, amnistia, perdão genérico e indulto, o juiz-presidente resume que a “situação jurídica processual penal do arguido não se inscreve em nenhum dos casos” previstos no Código Penal.
O julgamento prossegue na sexta-feira, a partir das 09:30, no Juízo Central Criminal de Lisboa, após mais de um mês de interrupção, mas ainda sem as alegações finais que tinham sido marcadas pelo coletivo de juízes.
As alegações finais ficam pendentes, segundo confirmou o Juízo Central Criminal de Lisboa, uma vez que continuará a faltar ouvir Jean-Luc Schneider, uma das três testemunhas que estavam agendadas para este dia, além de Ricardo Gaspar Rosado de Carvalho e Alain Rukavina.
O ex-administrador da ESFIL e colaborador do GES responsável pela operacionalização de transferências da conta bancária da ES Enterprises na Banque Privée Espírito Santo pediu o envio de carta rogatória para a Suíça e a prestação do depoimento por videoconferência, uma situação que levou o juiz a assumir em despacho que “haverá que aguardar pela data designada para continuação da audiência de julgamento”.
Ricardo Salgado responde neste julgamento por três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros no âmbito da Operação Marquês, do qual este processo foi separado.
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