Em declarações à agência Lusa, o presidente do sindicato, Paulo Lona, recordou que a esmagadora maioria das pessoas que respondeu ao inquérito tinha como fonte principal as notícias da comunicação social, pelo que considerou normal a visão mais crítica, tendo em conta o contexto mediático atual.
Num “momento em que a justiça é bastante criticada, em que o Ministério Público (MP) é bastante criticado pelos comentadores, artigos escritos nos jornais, nas revistas e nos noticiários”, é "natural que tudo aquilo que é transmitido também vai contaminar, de certa forma, a perceção a que os cidadãos têm do funcionamento da justiça e também do Ministério Público", afirmou o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP).
Ressalvando que, em primeiro lugar, é necessário distinguir “a perceção da realidade”, o dirigente admitiu que esta visão também está relacionada com "um claro desinvestimento na justiça, que não é de agora e é de há vários anos, que faz com quem neste momento faltem mais de 400 oficiais de justiça nos serviços do MP e mais de 1200 ao nível global nos tribunais".
"Quando não é possível notificar acusações de violência doméstica há mais de seis meses porque não há funcionários que as possam notificar, quando há magistrados do Ministério Público a selecionar nos papéis os processos mais urgentes para juntar aos inquéritos para depois poderem cumprir, alguma coisa não está bem" no sistema, disse Paulo Lona, considerando que é "preciso mexer nestes aspetos do funcionamento da justiça e do MP para haver maior celeridade e maior eficácia", as maiores críticas feitas no estudo.
Para o dirigente, “esta falta de meios humanos e materiais e recursos tecnológicos afeta profundamente o funcionamento da justiça".
O estudo mostra também que a justiça não consegue comunicar com a sociedade, uma crítica já antiga feita pelos magistrados.
"Esse é um dos grandes problemas que nós, Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, já temos vindo a apontar há muito tempo, que é a comunicação da justiça. A justiça tem que aprender a comunicar mais e melhor com o cidadão até para saber se explicar, porque às vezes é só isso, é mesmo uma questão de explicação", afirmou.
No entanto, o procurador não quer dar um destaque particular a este estudo, considerando que a perceção negativa dos portugueses não é exclusiva em relação à justiça, mas alarga-se a outras esferas públicas, citando um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).
Segundo esse inquérito, realizado entre 25 de outubro e 27 de novembro do ano passado, cerca de 50% dos portugueses disse confiar nos tribunais e no sistema judicial, enquanto a percentagem da população com confiança elevada ou moderadamente elevada no Governo e na Assembleia da República ficava pelos 30%.
"A sensação que eu por vezes fico é que, mais do que uma falta de confiança específica na justiça e no funcionamento da justiça, há uma falta de confiança generalizada dos cidadãos no funcionamento das suas instituições no Estado de direito democrático e acho que isso deveria preocupar a todos", afirmou.
No entanto, lamentou que o discurso esteja “muito centrado exclusivamente na justiça e não nas instituições".
A Justiça é a instituição pública mais mal avaliada pelos portugueses, segundo um inquérito hoje divulgado que aponta erros, lentidão e pressões sobre magistrados como principais problemas de um sistema que penaliza os mais pobres e minorias.
De acordo com o estudo, feito pelo Instituto de Políticas Públicas e Sociais (IPPS) do Iscte - Instituto Universitário de Lisboa, "74% dos inquiridos consideram que a Justiça funciona 'Mal' ou 'Muito Mal'", uma avaliação que é a mais negativa feita pelos inquiridos sobre serviços ou estruturas públicas, abaixo do parlamento, Governo ou Sistema Nacional de Saúde.
O relatório "O Estado da Nação e as Políticas Públicas 2024", totalmente vocacionado para o sistema de Justiça, indica que as considerações "menos positivas concentram-se no desempenho geral do sistema, incluindo rapidez, eficácia e eficiência".
A maioria dos inquiridos considera que os juízes e procuradores são vulneráveis e cedem a pressões com "muita" ou "alguma frequência" por parte da comunicação social (66%), grupos económicos e sociais (64%), do governo (60%), dos partidos da oposição (57%) e dos Presidentes da República (57%).
O inquérito envolveu 1.207 inquiridos, com uma margem de erro de 2,8%.
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