O Presidente da República vetou, pela segunda vez, na segunda-feira, a lei que despenaliza a morte medicamente assistida, embora com fundamentos diferentes, e que agora só poderá ser alterada depois das eleições de janeiro.
Ao fim do dia, Marcelo Rebelo de Sousa publicou na página da internet da Presidência da República os fundamentos do veto e a mensagem com a devolução do diploma ao parlamento.
"O Presidente da República decidiu, hoje, devolver à Assembleia da República o decreto sobre morte medicamente assistida, envolvendo a eutanásia e o suicídio medicamente assistido, recebido no dia 26 de novembro", lê-se numa nota publicada no site da Presidência da República.
Ao devolvê-lo à AR, Marcelo Rebelo de Sousa apresenta duas questões — que apenas sugiram "nesta segunda versão da lei" —aos deputados.
O Presidente da República solicita que seja clarificado “o que parecem ser contradições no diploma quanto a uma das causas do recurso à morte medicamente assistida”.
“O decreto mantém, numa norma, a exigência de “doença fatal” para a permissão de antecipação da morte, que vinha da primeira versão do diploma. Mas, alarga-a, numa outra norma, a “doença incurável” mesmo se não fatal, e, noutra ainda, a “doença grave”. O Presidente da República pede que a Assembleia da República clarifique se é exigível “doença fatal”, se só “incurável”, se apenas “grave”, escreve.
O chefe de Estado solicita também que se deixe de “ser exigível a ‘doença fatal”.
“O Presidente da República pede que a Assembleia da República repondere a alteração verificada, em cerca de nove meses, entre a primeira versão do diploma e a versão atual, correspondendo a uma mudança considerável de ponderação dos valores da vida e da livre autodeterminação, no contexto da sociedade portuguesa”, refere.
Numa carta enviada ao presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, o chefe de Estado esclarece que ainda considerou, “após detida ponderação, quanto a esta segunda versão do diploma da Assembleia da República, não suscitar a fiscalização prévia da constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional”.
“Por um lado, por haver prévias aparentes incongruências de texto a esclarecer, e, por outro lado, por desse esclarecimento decorrer, largamente, o tipo de juízo jurídico-constitucional formulável”, anota.
O Presidente da República refere que toma “esta decisão três dias depois de ter recebido o decreto da Assembleia da República, e mal chegado de visita oficial ao estrangeiro, assim prescindido de prazos constitucionais mais longos, para ponderar quer o envio ao Tribunal Constitucional, quer a devolução ao Parlamento, por uma questão de respeito institucional por esse central órgão de soberania”.
“Seria constitucional, mas sinal de desrespeito, usar os prazos conferidos pela Constituição e decidir já depois de a Assembleia da República se encontrar dissolvida”, afirma.
Em suma, com os fundamentos expostos, o chefe de Estado solicita “à Assembleia da República que clarifique se é ou não exigível ‘doença fatal’ como requisito de recurso a morte medicamente assistida e se, não o sendo, a exigência de ‘doença grave’ e de ‘doença incurável’ é alternativa ou cumulativa. E, ainda, pondere, no caso de não exigência de ‘doença fatal’, se existem razões substanciais decisivas, relativamente à sociedade portuguesa, para alterar a posição assumida em fevereiro de 2021, no Decreto n.º 109/XIV”.
Há oito meses, em 15 de março deste ano, Marcelo Rebelo de Sousa vetou o anterior decreto do parlamento sobre esta matéria, que o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional por "insuficiente densidade normativa" do artigo 2.º n.º 1, que estabelecia os termos para a morte medicamente assistida deixar de ser punível, em resposta a um pedido seu de fiscalização preventiva.
Na sequência do veto, o parlamento reapreciou o decreto e aprovou uma nova versão em 05 de novembro, com votos a favor da maioria da bancada do PS e de BE, PAN, PEV, Iniciativa Liberal, de 13 deputados do PSD e das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues.
Dois deputados socialistas e três sociais-democratas abstiveram-se. A maioria da bancada do PSD votou contra, assim como PCP, CDS-PP e Chega e sete deputados do PS.
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