“Realmente é uma vergonha o estado a que isto chegou. Mas, desta vez, os professores não vão perder a luta. Os professores vão ganhar e não se vão deixar enxovalhar”, disse Marco Gonçalves, docente na capital algarvia, à agência Lusa.
A greve de professores por distritos, promovida por nove estruturas sindicais, arrancou em 16 de janeiro e vai terminar no dia 08 de fevereiro.
Depois de uma manifestação em frente ao Mercado Municipal de Faro, os mil professores e educadores, segundo a estimativa das autoridades policiais no local, deslocaram-se até à Direção Regional de Educação, num percurso de cerca de dois quilómetros.
Com apitos e cartazes com diversas mensagens, foram gritando várias palavras de ordem ao longo da manhã, nomeadamente “Nenhum jovem aguenta, precário até aos 50”, “Horários sobrecarregados, professores arrasados” ou “Diretores a colocar, nem pensar, nem pensar”.
Marco Gonçalves, de 52 anos, professor do quadro, lamentou ter a carreira ‘congelada’ há anos. “Com os anos de serviço que tenho, devia estar no 8.º ou 9.º escalão de 10, mas neste momento estou no 4.º escalão. A questão nem é chegar ao topo, o problema é que a maioria vai ficar a meio da carreira, o que significa uma aposentação muito inferior ao esperado”, frisou.
Depois de ter frequentado “o mesmo curso de José Mourinho” — na Faculdade de Motricidade Humana, em Lisboa –, o docente recordou à Lusa como a expectativa profissional era outra, há três décadas.
“Na altura, optei pelo ensino porque achei que era seguro, numa expectativa de crescendo ao longo da carreira. Se fosse hoje não o tinha feito. Neste momento, face ao atual custo de vida, o meu ordenado, 30 anos depois, é inferior ao do início da carreira”, declarou.
Ao lado, empunhando um ‘caixão’ com as palavras ‘Monodocentes. Aposentação digna (em vida!). Reconhecimento desgaste profissional’, encontrava-se Nuno Fernandes, de 43 anos.
Igualmente professor de Educação Física na capital algarvia, leciona há 17 anos e só conseguiu vínculo em 2022.
“Para isso, estive em Lagos quatro anos, sempre a ir e vir todos os dias. Oitenta quilómetros para lá, 80 quilómetros para cá. E vejo outros colegas a seguir os mesmos passos. Entrar no quadro ao fim de muitos e muitos anos é uma situação insustentável”, declarou à Lusa.
Vindo de Silves, Ricardo Cunha, de 35 anos, natural de Felgueiras, no distrito do Porto, contou à Lusa como o seu percurso profissional conta com passagens por 17 escolas no espaço de 13 anos.
“Vim para o Algarve há dois anos, atrás da regra da norma-travão, para nos vincularmos ao final do terceiro ano. Mas com as regras que estão a ser propostas, só me posso vincular à zona onde estou a lecionar, não posso concorrer a vagas perto da minha residência. É uma injustiça que essa opção tenha uma consequência para toda a minha vida, num sistema cego que não me dá as hipóteses de escolha a que tenho direito”, sustentou.
Sublinhando que “a falta de professores” no Algarve é imensa e “há alunos há imenso tempo sem professores, sem aulas a várias disciplinas”, o docente afirmou que as medidas em cima da mesa “não vão solucionar nada”.
Quando chegou à região, teve de se alojar num ‘hostel’ antes de arranjar casa. “Continuamos a pagar a casa que temos no norte, continuamos a ter família no norte que queremos visitar. São despesas acrescidas, que no Algarve são dificultadas pelas rendas altíssimas ou porque somos despejados em junho para que esse alojamento seja aproveitado para o turismo”, destacou.
A vice-presidente do Sindicato dos Professores da Zona Sul, Ana Simões, disse aos jornalistas que a adesão à greve no distrito de Faro ronda os 95 por cento.
“Há muitas escolas que estão completamente sem aulas, no pré-escolar, 1.º, 2.º e 3.º ciclos e secundárias. A adesão à greve ronda os 93%, 95%”, disse, falando num “grande dia de luta” contra a “intransigência” do governo “em atender às reivindicações de há muitos anos” da classe.
O secretário-geral adjunto da Federação Nacional de Professores (Fenprof), José Feliciano Costa, considerou que os números são “muito idênticos” ao que tem acontecido nos outros distritos “e vai continuar a acontecer” nas próximas semanas.
“É uma resposta que o ministro [da Educação] tem de ouvir. No dia 20 de janeiro, ele estava muito incomodado com os milhares de professores que estavam cá fora, mas, depois, a proposta que apresentou não vai ao encontro de nada”, exigindo que o governante apresente “coisas que mudem” nas negociações com os sindicatos.
A greve nacional por distritos está a ser promovida por nove organizações sindicais: Associação Sindical de Professores Licenciados (ASPL), Federação Nacional dos Professores (FENPROF), Pró-Ordem dos Professores – Associação Sindical/Federação Portuguesa dos Professores, Sindicato dos Educadores e Professores Licenciados (SEPLEU), Sindicato Nacional dos Profissionais de Educação (SINAPE), Sindicato Nacional e Democrático dos Professores (SINDEP), Sindicato Independente de Professores e Educadores (SIPE) e Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades (SPLIU) e Federação Nacional de Educação (FNE).
Os professores exigem melhores condições de trabalho e salariais, o fim da precariedade, a progressão mais rápida na carreira, e protestam contra propostas do Governo para a revisão do regime de recrutamento e colocação, que está a ser negociada com os sindicatos do setor.
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