Tudo começou esta quarta-feira, quando a ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, fez uma visita a uma unidade de produção de citrinos no Morgado da Torre, em Portimão.
Perante a situação de crise a afetar a agricultura nacional — seja pela seca ou pela inflação impulsionada pela guerra na Ucrânia e pela pandemia — , a titular da pasta assegurou que o Governo “está a fazer tudo” para apoiar o setor, através de apoios extraordinários.
No entanto, instada pelos jornalistas a responder a críticas dirigidas à tutela pelo secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), que disse ser “inexistente” a resposta do Governo para mitigar o impacto da seca no setor da produção e alimentação animal, devolveu a pergunta.
“É melhor perguntar porque é que durante a campanha eleitoral a própria CAP aconselhou os eleitores a não votar no Partido Socialista”, retorquiu. A resposta dos agricultores não demorou muito — nem a dos partidos da oposição.
Num comunicado divulgado esta quinta-feira, a CAP defendeu que estas declarações são “perplexizantes” e que carecem de explicação. “Apelamos ao escrutínio do verdadeiro sentido destas declarações. Não cederemos um milímetro a este ‘bullying’ político e continuaremos a ser a voz de defesa dos agricultores sempre e em todas as ocasiões […]. São declarações que parecem-nos ser pouco saudáveis no Estado de direito democrático e que têm que ser explicadas”, vincou a confederação.
A CAP notou ainda que a campanha eleitoral terminou há mais de seis meses, questionando o que é que esta tem a ver com a “falta de pagamentos” aos agricultores. “A ministra não paga aos agricultores e adia decisões por retaliação política à CAP?”, inquiriu.
No mesmo documento, a confederação dos agricultores esclareceu ainda que, em 17 de janeiro, no decurso da campanha eleitoral, apelou à “rejeição do voto” no PS e em todos os partidos “que tivessem intenção de coligar-se com o PAN ou com todos os partidos anti-agricultura e anti-mundo rural”.
Após as eleições legislativas, a CAP disse ter felicitado o PS, referindo que o resultado eleitoral implicaria uma “grande responsabilidade” política. “Estará Maria do Céu Antunes, com este ataque gratuito e extemporâneo, à altura dessa responsabilidade?”, concluiu.
PSD lamenta "autoritarismo", IL quer ministra no parlamento, CDS-PP pede a demissão
O primeiro partido a reagir publicamente às declarações de Maria do Céu Antunes foi a Iniciativa Liberal, que apresentou um requerimento para ouvir no parlamento a ministra da Agricultura sobre a resposta da tutela à situação de seca no país.
No requerimento, a IL faz referência às declarações de Maria do Céu Antunes esta quarta-feira, considerando que “uma resposta com este teor é francamente inaceitável, dando a entender que a gestão do Ministério e as políticas definidas, as quais impactam de forma decisiva o setor e os produtores, é decidida em função dos estados de alma da responsável pela pasta e que estes dependem do apoio que as suas associações representativas testemunham, ou não, ao partido socialista”.
“A existência de uma maioria absoluta deve ser entendida como uma circunstância que traz, sobretudo, mais responsabilidade ao governo e aos seus ministros e não como veículo de coação para alinhamento das vontades e dos apoios em função dos interesses do partido maioritário. A democracia não se coaduna com a promoção da ideia de que quem não apoia o PS não merece resposta ou acaba mesmo por ser prejudicado e quem apoia é recompensado”, criticam.
A bancada liberal sustenta ainda que, “na ausência de respostas concretas” da ministra, “e tendo em conta a persistência da situação de seca, considera-se ser fundamental promover a sua audição para esclarecimento integral de todas as medidas, conjunturais ou estruturais, adotadas até à data ou ainda a adotar pelo Ministério da Agricultura e da Alimentação para combater ou mitigar as suas consequências, bem como dos resultados já obtidos e esperados”.
Seguiu-se o CDS-PP, que quer uma solução mais simples e mais radical: a demissão da ministra. “As declarações da ministra da Agricultura configuram a absoluta instrumentalização do Estado em favor do PS, ou de quem é próximo ou apaniguado do PS, sendo o contrário motivo de perseguição, ou discriminação pela tutela”, defendeu o presidente centrista, Nuno Melo, em comunicado.
Para o CDS-PP, “independentemente da manifesta falta de capacidade para a função, o que é facto é que com estas declarações, a ministra da Agricultura deixou de ter quaisquer condições de isenção, distanciamento e dimensão de Estado, para poder continuar a ocupar o cargo”.
“Em consequência, o CDS reclama a imediata demissão da ministra Maria do Céu Antunes”, declarou Nuno Melo. O líder centrista e eurodeputado sublinhou que “um ministro do governo de Portugal é um ministro da República, não é um representante de qualquer partido político, menos pode decidir em função da filiação ou simpatia partidária”.
O dia não terminou sem antes o PSD também se pronunciar sobre o caso, pela voz do secretário-geral do partido. De visita à Expotur – Festa de Verão, nas Caldas da Rainha, Hugo Soares considerou ter ficado “demonstrado mais uma vez esta semana que há um padrão de tiques de autoritarismo por parte do Governo do Partido Socialista”, que na sua opinião já tinha sido evidenciado aquando do despacho do primeiro-ministro, António Costa, relativamente ao caso da Endesa.
"A reação da ministra da Agricultura [Maria do Céu Antunes] em relação à CAP é uma reação descabelada e que demonstra, mais uma vez, um total desrespeito por parte do Governo relativamente a instituições”, desta vez “relativamente a parceiros sociais, a associações que são fundamentais para a construção de políticas públicas”.
Em nome do PSD Hugo Soares fez questão “de denunciar que este Governo demonstra todos os dias tiques de autoritarismo, confundindo aquilo que é uma maioria absoluta com o poder absoluto”. O PSD, acrescentou o secretário-geral, “não vai deixar de denunciar estes casos”, que considerou “absolutamente lapidares”.
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