“Se, como é minha convicção e esperança democrática, os partidos, e em especial o PS, não têm essa reserva mental, então nestes dois dias e nos anos seguintes, com certeza que fará a sua oposição e com certeza que constituirá a sua alternativa, mas assumirá em consequência que não será um bloqueio ao normal funcionamento do Governo”, defendeu Luís Montenegro, na abertura do debate do programa do XXIV Governo Constitucional.
O primeiro-ministro assegurou que não será o Governo “a pôr em causa a estabilidade política e governativa”.
“Quando chegar o momento, no final da legislatura, o povo português julgará o nosso trabalho e as alternativas apresentadas pelas oposições, bem como, o sentido de responsabilidade de cada um”, disse.
No entanto, voltou a defender uma tese que já tinha deixado na sua tomada de posse: “a apreciação deste Programa do Governo, sem aprovação de uma moção de rejeição, significa que o parlamento permitirá a sua execução até ao final do mandato ou, naturalmente, até à apresentação e aprovação de uma moção de censura”.
“Não se trata de aderir ao programa, trata-se de não bloquear a sua execução. Os portugueses percebem que a oposição não queira dar um cheque em branco ao Governo. Mas os portugueses não perdoarão se a oposição der um cheque sem cobertura ao país”, avisou.
O líder do PSD disse que o Governo não fará “chantagem nem terá um comportamento de arrogância”, mas será “leal e honesto” quanto ao que significa, no seu entendimento, a não aprovação de uma moção de rejeição.
Num aparente recado ao Chega, no final do seu discurso, Montenegro disse que todos os partidos representados na Assembleia da República “têm legitimidade democrática e merecem esse respeito e essa consideração”.
“Para nós, não há os portugueses do bem e os portugueses do mal. Rejeitaremos sempre o discurso de ódio e a radicalização política”, disse.
Montenegro começou a sua intervenção, de cerca de meia hora, por salientar a vitória eleitoral conseguida pela Aliança Democrática nas legislativas de 10 de março.
“Essa foi, de resto, uma condição que impus a mim próprio e que partilhei como compromisso perante os eleitores. Fi-lo com referência à minha mais profunda convicção de que, para governar e dirigir o país, é imprescindível uma legitimação direta e não provinda de qualquer arranjo de bastidores”, disse, manifestando o seu “respeito democrático” pelos 230 deputados e confiança na “tolerância e isenção” do novo presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco.
O primeiro-ministro salientou que o programa do Governo “se inspira no programa eleitoral mais sufragado”, mas “foi buscar ideias a todos os programas eleitorais que obtiveram representação parlamentar”, referindo-se às cerca de 60 medidas das restantes forças políticas que o Governo decidiu incluir no documento, sem qualquer negociação prévia.
Numa análise da situação nacional, o primeiro-ministro insistiu que “os portugueses querem virar a página do empobrecimento”, que considerou ser a marca da governação socialista dos últimos oito anos, invocando a posição do país na Europa, o aumento do número de pessoas dependentes de prestações sociais ou a degradação dos serviços públicos.
“Salvar o Estado Social e transformar estratégica e estruturalmente o país só é possível com uma economia mais dinâmica e pujante. O projeto de alívio fiscal sobre os rendimentos do trabalho e das empresas não é suficiente para vencer a estagnação económica, mas é absolutamente necessário”, defendeu.
Admitindo que a complexidade da situação internacional tem “potencial de descontrolo ou agravamento no futuro próximo”, até ao nível económico, Montenegro assegurou que o Governo será “realista, mas otimista”.
“Já estamos a tomar decisões e já estamos a lutar por resultados. Impusemos internamente vários objetivos para os primeiros sessenta dias mas, já agora, que estranho soa ouvir aqueles que não resolveram em 3050 dias, reclamar agora decisões para ontem. Apenas se pode concluir que têm em grande conta a capacidade de realização deste Governo”, ironizou, numa passagem muito aplaudida da sua intervenção.
Montenegro terminou a sua intervenção a citar José Saramago, prémio Nobel da Literatura e militante do PCP: “Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo”.
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