“Gostaria que [Câmara do Porto e Governo] preservassem realmente as “ilhas” e que dessem algum apoio, nomeadamente na melhoria das casas para os moradores que aí vivem”, desafia José Castelo, antigo morador da “ilha” do Doutor, na rua de S. Vítor, onde nasceu e onde diariamente se desloca para visitar a antiga casa da família, promovendo algumas atividades para a comunidade.
Para José Castelo, que nasceu há 65 anos naquele local, também conhecido por “ilha do Castelo”, se os poucos que ainda moram nos típicos bairros da rua de S. Vítor forem embora, o espaço “perde a identidade e perde-se muito das características das ‘ilhas’”, que se espalham por toda a cidade mas têm forte presença naquela artéria. E se estes bairros desaparecerem, “morre a alma do Porto”, lamentou.
“O Porto é a cidade onde há ‘ilhas’, a rua de S. Vítor é a rua do Porto onde há mais ‘ilhas’ e faz parte da nossa identidade, da nossa alma, faz parte de nós”, exclama, afirmando que o seu sonho era reabilitar as casas todas do local onde nasceu e entregar as habitações a quem lá mora.
O antigo morador gostaria que o presidente da câmara, Rui Moreira, olhasse “um bocadinho” para aqueles bairros, porque o que está a acontecer na rua de S. Vítor, contou, é que as suas “ilhas” estão a ser transformadas em alojamentos locais, como é o caso da antiga “ilha do Mourão”, que se transformou em agosto numa espécie de ‘hostel’ de luxo com vista para o rio Douro e foi rebatizada de “Coloured Socks” (Meias coloridas).
Os pedidos ao presidente da Câmara do Porto e ao Governo chegam também pela voz de Conceição Silva, 57 anos, moradora na “ilha do Zé da Bata” e que paga 50 euros de renda, porque toma conta do senhorio, “senão pagava 100 euros”, conta à Lusa.
“Se pertencesse ao Governo, ou se algum presidente viesse aqui, eu dizia logo que era a pior asneira” vender casas para alojamento local, lança à Lusa Conceição Silva.
“Queremos a casa para um filho e não há (…). É só casas para os estrangeiros. E para nós, para os nossos filhos, para os nossos netos, que queremos uma casa e não temos?”, questiona, defendendo que o Governo e a câmara têm de intervir.
Alice Teixeira, 62 anos, nasceu na “ilha do Pataco”, e também “acha muito bem” que seja o Governo e a autarquia, em conjunto com os moradores, a encontrarem uma solução para defenderem a manutenção e recuperação daqueles bairros habitacionais.
“Acho que têm de defender as ilhas, principalmente nesta zona [rua de S. Vítor]”, considerou, relatando que há muitos moradores a serem indemnizados para saírem daqueles históricos bairros operários, que depois dão lugar a alojamento local para turistas ou estudantes.
Para a moradora, “devia haver uma lei que protegesse os moradores das ilhas”.
O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, que esteve numa audição no parlamento na quinta-feira, afirmou que a reabilitação das 957 “ilhas” necessita de um investimento total de 32 milhões de euros e que não existe uma "solução mágica" para recuperar os mais de oito mil alojamentos.
O autarca sugeriu ao Governo que promovesse um “conjunto de medidas” que, para além de isenções de impostos, incluíssem a redução do IVA para operações de reabilitação, “desde que destinadas a arrendamento de habitação a custo controlado”.
O BE defendeu em janeiro que a autarquia do Porto e a secretária de Estado Ana Pinho deviam, em conjunto com associações dos moradores, envolverem-se no processo de reabilitação das “ilhas”.
A CDU do Porto alertou na mesma altura para a urgência de criar um programa de recuperação para salvar as "ilhas" do Porto, que albergam cerca de dez mil pessoas, em condições “precárias”.
As “ilhas” no Porto são um tipo de habitação operária típica daquela cidade do Norte no século XIX, constituída por edifícios unifamiliares no centro da cidade, normalmente com um piso e separadas ou ladeadas por um corredor de acesso à via pública.
Um estudo de 2015, realizado pela empresa municipal Domus Social - Empresa de Habitação e Manutenção do Município do Porto, indica que existem perto de mil “ilhas” na cidade do Porto onde moram mais de dez mil pessoas, muitas vezes em muito más condições, lê-se na página oficial da Câmara do Porto.
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