Jimmy Carter, um governador do Sul, foi eleito presidente em 1976 depois de derrotar Gerald Ford. Foi depois rejeitado pelos eleitores após um único mandato em que foi derrotado por Ronald Reagan, em 1980. No currículo conta com uma vida pós-presidencial que incluiu a conquista do Prémio Nobel da Paz em 2002, um reconhecimento pelo seu "esforço incansável para encontrar soluções pacíficas para conflitos internacionais, para avançar a democracia e os direitos humanos e para promover o desenvolvimento económico e social".
Morreu este domingo na sua casa em Plains, Geórgia, segundo o Washington Post, que cita o filho James E. Carter III, conhecido por Chip. Tinha 100 anos e era o presidente dos EUA mais velho de sempre.
“O meu pai foi um herói, não só para mim, mas para todos que acreditam na paz, nos direitos humanos e no amor altruísta”, disse Chip Carter. “Os meus irmãos, a minha irmã e eu partilhamos com ele e com o resto do mundo essas crenças comuns. O mundo é a nossa família devido à maneira como ele uniu as pessoas, e agradecemos por honrarem a sua memória continuando a viver essas crenças compartilhadas”.
Carter é conhecido pelo forte sentindo de responsabilidade e ligação à fé durante a sua presidência, do qual falava abertamente. Procurou também retirar um pouco de pompa de uma presidência cada vez mais imperial e caminhou, em vez de andar de limusine, no desfile da sua tomada de posse em 1977.
O Médio Oriente era o foco da política externa de Carter. O tratado de paz Egito-Israel de 1979, baseado nos acordos de Camp David de 1978, terminou com um estado de guerra entre os dois países vizinhos.
Carter levou o presidente egípcio Anwar Sadat e o primeiro-ministro israelita Menachem Begin ao retiro presidencial de Camp David, em Maryland, para conversas. Mais tarde, quando os acordos pareciam estar a desfazer-se, viajou até ao Cairo e Jerusalém para diplomacia. O tratado previa a retirada israelita da Península do Sinai, no Egito, e o estabelecimento de relações diplomáticas. Begin e Sadat ganharam um Prémio Nobel da Paz em 1978.
Também nas questões diplomáticas alcançou a ratificação dos tratados que concederam aos Estados Unidos o controlo do Canal do Panamá devolvendo-o ao país da América Central, retomou as relações diplomáticas totais com a China e, em 1980, quando a então União Soviética invadiu o Afeganistão, decidiu cancelar a participação dos desportistas norte-americanos nos Jogos Olímpicos de Moscovo.
Ainda com a antiga União Soviética, Jimmy Carter e Leonid Brezhnev assinaram o acordo SALT-II sobre limitações e diretrizes relativas ao uso de armas nucleares. Contudo, o tratado nunca entrou formalmente em vigor e foi considerado um dos acordos EUA-União Soviética mais controversos da Guerra Fria.
Na eleição de 1980, as questões mais importantes eram a inflação, as taxas de juro, que excediam os 20%, e os preços do gás em alta, assim como a crise dos reféns no Irão, que trouxe humilhação para a América. Essas questões mancharam a presidência de Carter e minaram a possibilidade de ganhar um segundo mandato.
O último ano da sua administração foi dominado por uma crise de reféns no Irão, quando 52 americanos foram feitos prisioneiros na embaixada dos EUA em novembro de 1979.
No dia em que deixou o cargo, a 20 de janeiro de 1981, os reféns foram libertados. Carter continuou as negociações nos bastidores, mesmo após a derrota eleitoral.
Quando a esposa, Rosalynn Carter, morreu aos 96 anos, em novembro de 2023, o ex-presidente esteve no memorial realizado em sua homenagem em Atlanta, Geórgia, onde usou um cobertor azul e branco bordado com a cara da mulher.
Os Carter estiveram casados mais de 77 anos, o casamento presidencial mais longo da história dos EUA.
O antigo presidente anunciou em agosto de 2015 que tinha sido diagnosticado com cancro, sob forma de um melanoma que se tinha espalhado para o fígado e cérebro. Embora tenha reduzido as suas atividades, continuou a arrecadar fundos para o Carter Center, instituição que fundou, e também a dar aulas de escola dominical em Plains, uma tradição que começou na adolescência.
Em maio de 2019, sofreu outra reviravolta de saúde depois de uma grande queda. Voltou do hospital para casa para recuperar e regressou para dar aulas na escola dominical. Nesse ano sofreu mais duas quedas em outubro e foi hospitalizado devido a uma fratura na pélvis. Ainda em 2019, foi internado num hospital em Atlanta para um procedimento cirúrgico para aliviar a pressão no cérebro.
Em fevereiro do ano passado, o Carter Center revelou que o antigo governante já estava a receber cuidados paliativos e "passaria o tempo restante de vida em casa com a família".
Os Carter deixam quatro filhos, vários netos e bisnetos.
De vendedor de amendoins a presidente
James Earl Carter Jr. nasceu a 1 de outubro de 1924, em Plains, Geórgia, sendo um de quatro filhos de um fazendeiro e uma lojista. Formado na Academia Naval dos EUA em 1946, serviu no programa de submarinos nucleares e saiu para administrar o negócio de cultivo de amendoim da família.
Casou-se com a sua esposa, Rosalynn, em 1946, uma união a que ele chamou "a coisa mais importante da minha vida" e juntos tiveram quatro filhos.
Carter tornou-se milionário, legislador estadual da Geórgia e governador do estado de 1971 a 1975. Tentou concorrer à nomeação presidencial democrata em 1976 e superou os seus rivais pelo direito de enfrentar Ford na eleição geral.
Com Walter Mondale como companheiro para vice-presidente, Carter recebeu um impulso devido a uma grande gafe de Ford durante um dos debates. Ford disse que "não há domínio soviético na Europa Oriental e nunca haverá sob uma administração Ford", apesar de décadas desse mesmo domínio.
Carter superou Ford na eleição, embora Ford tenha vencido mais estados — 27 contra 23 de Carter.
Nem todo o trabalho pós-presidencial de Carter foi apreciado. O ex-presidente George W. Bush e o seu pai, o ex-presidente George H. W. Bush, ambos republicanos, ficaram descontentes com a diplomacia de Carter no Iraque e em outros lugares.
Em 2004, Carter designou a guerra do Iraque iniciada em 2003 pelo jovem Bush como um dos "erros mais grosseiros e prejudiciais que a nossa nação já cometeu". Chamou também o governo de George W. Bush de "o pior da história" e disse que o vice-presidente Dick Cheney foi "um desastre para nosso país".
Em 2019, Carter questionou a legitimidade do republicano Donald Trump como presidente, afirmando que "foi colocado no cargo porque os russos interferiram no seu nome". Trump respondeu chamando Carter de "um presidente terrível".
Carter também fez viagens à Coreia do Norte comunista. Uma visita em 1994 neutralizou uma crise nuclear, já que o presidente Kim Il Sung concordou em congelar o seu programa nuclear em troca do regresso ao diálogo com os Estados Unidos. Isto levou a um acordo no qual a Coreia do Norte, em troca de ajuda, prometeu não reiniciar o seu reator nuclear.
Porém, Carter irritou o governo do presidente democrata Bill Clinton ao anunciar o acordo com o líder da Coreia do Norte sem primeiro consultar Washington.
Em 2010, Carter conseguiu a libertação de um americano condenado a oito anos de trabalhos forçados por entrar ilegalmente na Coreia do Norte.
Durante a sua vida, Carter escreveu mais de duas dúzias de livros, desde um livro de memórias presidenciais a um livro infantil e poesia, bem como obras sobre religiosas e diplomacia.
*Com agências
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