“Fartos de escolher - Pagar renda ou comer”, “Requisição de fogos devolutos” ou “Combater a desigualdade social e económica” eram algumas das mensagens que se liam em cartazes e faixas nas mãos dos manifestantes, acompanhados por várias bandeiras vermelhas do movimento Vida Justa, enquanto a chuva começava a mostrar-se no início do arranque do percurso que terminou ao final da tarde em São Bento.
A concentração começou às 15:00, mas a marcha pela baixa de Lisboa só arrancou quase uma hora depois, chegando diante da Assembleia da República pelas 17:30, quando as centenas que inicialmente se juntaram eram já alguns milhares.
Em declarações à Lusa, um dos porta-vozes do movimento Vida Justa, Flávio Almada, salientou que, para uma grande parte da população, “já não é possível viver com estes salários”, perante os atuais níveis de inflação, os preços da habitação e a falta de transportes em torno das grandes cidades.
“Para a grande maioria, [a habitação] é o grande problema. Para nós, das periferias, o problema não vem de agora, mas de há muito tempo”, afirmou, continuando: “As coisas estão cada vez piores e não houve nenhuma mudança substancial. Em termos concretos, não há nada [neste Orçamento do Estado] que tenha impacto nas pessoas”.
Ao longo do protesto, no qual marcaram também presença a coordenadora do BE, Mariana Mortágua, e o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, além de representantes da CGTP, os manifestantes faziam-se ouvir pelas ruas com os cânticos “Costa, escuta: o bairro está em luta”, “Estamos juntos, estamos fortes” ou ainda “Não somos otários – Menos renda e mais salário”.
De Mem Martins, na linha de Sintra, Diogo Carvalho era um dos manifestantes que ilustrava o desejo da periferia por melhores condições de vida e a insatisfação relativamente a um Orçamento do Estado que entendem não chegar para responder aos maiores problemas.
“[O que me traz aqui] é a falta de cumprimento deste Governo - e não só - dos nossos direitos. Estamos aqui hoje juntos, vozes que normalmente não têm espaço e vindas da periferia, para gritar bem alto aqui em Lisboa pelos direitos que nos vêm faltando”, explicou à Lusa o cineasta, de 26 anos, lembrando o anterior protesto, em fevereiro, para considerar que “desde a última manifestação as coisas não melhoraram, só pioraram”.
Já Vânia da Luz, de 30 anos, ainda vive em Lisboa, na zona do Intendente, mas declarou temer que o seu futuro passe pela saída da capital, uma vez que, segundo explicou, encontrar um quarto abaixo dos 400 euros já começa a ser complicado, ainda mais quando os salários são pouco mais do que 700 euros.
“O meu futuro, talvez, é sair daqui, se isto continuar assim”, assumiu a manifestante, que se divide enquanto auxiliar educativa e em trabalhos como atriz, continuando: “Sou mais uma vítima desse sistema onde temos uma desigualdade fora de série. O valor das rendas é elevadíssima, o salário é baixo e o preço de tudo está super-elevado”.
Do Norte para Lisboa, Cátia Pinheiro, 41 anos, aderiu ao movimento Vida Justa desde a primeira hora. “É urgente que toda a gente se junte para reivindicar melhores condições, menos rendas e mais salários, como gritávamos há pouco. Da periferia à cidade, de norte a sul, do interior ao litoral, todos queremos uma vida justa e é por isso que estamos aqui”, notou.
Segundo esta analista de dados, a “falta de vontade política” está na origem da ausência de soluções para os problemas destas pessoas.
“Há imensos bairros aqui representados que foram despejados”, disse, lamentando que, entre as medidas apresentadas até ao momento pelo Governo para a habitação ou o aumento do custo de vida, “não há nenhuma verdadeira medida que vá resolver ou minimizar os problemas”.
O protesto acabou por escapar às previsões de chuva e agregou também manifestantes antirracismo e de apoio à justiça climática, mas sobretudo muitas pessoas numa demonstração de apoio à Palestina.
Pouco depois da chegada a São Bento, a manifestação do movimento Vida Justa acabou por dar lugar a cânticos “Free Palestine”, com críticas à resposta de Israel ao ataque de 07 de outubro do grupo islamita Hamas, encontrando junto da Assembleia da República um dispositivo de segurança com cerca de meia centena de polícias.
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